Descrição de chapéu BBC News Brasil mudança climática

Havaí: 'Fiquei 4 horas com meu filho de 5 anos no mar para escapar do fogo'

Após onda de incêndios que varreu parte do Havaí, vítimas tentam se recuperar do trauma do contato com o fogo

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Max Matza Madeline Halpert Gabriela Pomeroy
Maui | BBC News Brasil

Enquanto o número de mortos chega a 55 e o de desaparecidos pode superar mil, sobreviventes da onda de incêndios que varre parte do Havaí tentam se recuperar do trauma do contato próximo com o fogo.

Tee Dang estava dentro de um carro alugado com os três filhos e o marido na rua principal de Lahaina, na ilha de Maui, quando viu as chamas se aproximando. Quando veículos próximos começaram a pegar fogo, eles decidiram pegar comida, água e telefones e correr em direção ao mar. Eles já haviam visto outras pessoas fazendo o mesmo, incluindo uma idosa que precisou de ajuda para entrar no oceano.

Tee Dang e sua família sofreram queimaduras enquanto tentavam escapar do incêndio em Lahaina - Instagram/Reuters/via BBC News Brasil

"Não havia alternativa, estávamos encurralados", disse Danga, que vive no Kansas. Ela, o marido e os filhos, de 5, 13 e 20 anos, inicialmente ficaram perto da costa. Conforme a tarde avançava e a maré subia, a água começou a jogá-la contra o paredão rochoso, cortando gravemente sua perna.

Quando a fila de carros na rua principal —"pelo menos 50", segundo ela— começou a explodir, a família foi forçada a se mover para águas mais profundas em busca de abrigo dos destroços.

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Tee Dang e sua família sofreram queimaduras enquanto tentavam escapar do incêndio em Lahaina - via BBC News Brasil

'Se eu disser pule, pulem. Se eu disser corra, corram'

Eles ficaram na água por quase quatro horas. Era uma tarde de terça-feira, mas o céu estava escuro devido à fumaça do incêndio. À BBC ela narrou a angústia da família, que se perguntava se conseguiria sobreviver —a certa altura, um dos filhos de Dang desmaiou na água.

Eles acabaram sendo resgatados por um bombeiro que os conduziu pelas ruas em chamas. À frente de um grupo de cerca de 15 sobreviventes, ele dizia: "Nem sei se vamos conseguir. Apenas façam tudo o que eu disser. Se eu disser pule, pulem. Se eu disser corra, corram." A família inteira sofreu queimaduras.

Depois de chegarem a um abrigo numa escola, a família foi forçada a se mudar mais duas vezes —uma delas porque as chamas ameaçavam o local. Mais 19 pessoas foram declaradas mortas na quinta e na sexta, levando a cifra de mortos para 55 na ilha de Maui. Milhares foram deslocados devido às chamas.

A parte mais atingida é a cidade histórica de Lahaina, um destino popular entre turistas e onde vivem 12 mil pessoas. Em entrevista coletiva nesta quinta, o governador do Havaí, Josh Green, disse que este é "o maior desastre natural da história do estado". "Continuaremos a ver notícias sobre mortos", disse ele.

Autoridades disseram que não sabem ao certo quantas pessoas estão desaparecidas neste momento, enquanto nenhum dos incêndios está 100% contido.

O governador acrescentou que o estado enfrenta dificuldades para abrigar milhares de pessoas desalojadas. Ele pediu a havaianos em outras partes do estado que ofereçam abrigo para os atingidos.

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Bryce Baraoidan achava que sua casa ainda estaria de pé quando voltasse - via BBC News Brasil

Destruição

Muitos perderam suas casas —caso de Bryce Baraoidan, que foi forçado a fugir com sua família. Ele disse que eles deixaram quase todos os seus pertences para trás, achando que a casa ainda estaria de pé quando voltassem. Mas a construção não resistiu. "Quando descobrimos, minha mãe começou a chorar", contou Baraoidan à BBC. "Não só a rua inteira, mas todo o bairro se foi."

"O que me deixa mais triste foi ter deixado para trás meus cinco camaleões de estimação", disse o jovem de 26 anos. "Eu era muito apegado a eles e lamento não tê-los trazido quando partimos."

Steve Kemper, um fotógrafo, perdeu a galeria que administrava na Front Street, rua principal de Lahaina, disse sua irmã, Susanne Kemper, à BBC. Ele levou três horas para escapar e dirigir para o leste até a cidade de Haiku, em Maui, onde vive seu filho. "Foi por pouco", disse ela. "Ele estava absolutamente exausto quando chegou à casa do meu sobrinho. Ele estava arrasado."

'Palitos de fósforo'

Kemper, que viveu por um tempo em Maui e em outras ilhas havaianas, explicou que muitos dos prédios na cidade histórica de Lahaina são feitos de madeira, um legado de quando a cidade funcionou como um importante porto baleeiro. Isso provavelmente facilitou a propagação do fogo, segundo ela. "Acendeu como uma tocha", afirma. "As construções eram como palitos de fósforo no chão."

Ela e outras pessoas tentam entrar em contato com amigos e familiares que moram na área, já que o incêndio cortou a energia de milhares na ilha. Uma mulher disse à BBC que não conseguiu entrar em contato com seus pais, que estavam hospedados em um hotel em Lahaina. Ela registrou seus nomes na Cruz Vermelha, mas não teve notícias deles em 24 horas.

Depois de escapar e passar de abrigo em abrigo, Dang e sua família, cuja história abre esta reportagem, conseguiram chegar ao aeroporto de Maui, onde planejavam embarcar em um voo de volta para Kansas, onde vivem. Cerca de 14 mil turistas foram transferidos de Maui na quarta-feira (9), disseram as autoridades, com outros 14,5 mil programados para serem transferidos na quinta.

Já Baraoidan, que perdeu a residência e pertences, foi com os pais para a casa de familiares do outro lado de Maui. Tudo o que conseguiram levar foram alguns documentos importantes, uma sacola com roupas e seus dois cachorros. "Estamos todos em choque", disse ele. Mas acrescentou: "Meu pai me disse que tudo na casa é substituível e que temos a sorte de ter um ao outro."

Este texto foi publicado originalmente aqui.

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