Descrição de chapéu G20

Índia destrói favelas de sua capital em preparativo para receber cúpula do G20

Moradores e ativistas acusam governo de tentar 'embelezar' Nova Déli enquanto negligencia população vulnerável

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Sunil Kataria Adnan Abidi
Nova Déli | Reuters

Quando moradores de uma favela no bairro de Janta Camp, em Nova Déli, souberam que a cúpula do G20 seria realizada na capital indiana, a 500 metros de suas casas, eles esperavam que isso também os beneficiasse. Em vez disso, ficaram sem ter onde morar.

O casal Dharmender Kumar e Khushboo Devi e seus três filhos estavam entre dezenas de pessoas cujas casas foram demolidas nos últimos meses —ação que moradores e ativistas afirmam fazer parte de um projeto de "embelezamento" para a cúpula dos próximos dias 9 e 10.

Família carrega pertences após ser expulsa de favela em Nova Déli, capital da Índia
Família carrega pertences após ser expulsa de favela em Nova Déli, capital da Índia - Adnan Abidi - 1º.jun.23/Reuters

Alguns dos moradores da favela recorreram ao Tribunal Superior de Justiça da capital para impedir as desocupações. A corte, porém, considerou seus assentamentos ilegais. E, em seguida, autoridades locais ordenaram que eles desocupassem o espaço até 31 de maio.

Funcionários do governo do premiê Narendra Modi afirmam que as casas foram construídas de maneira ilegal em terras do governo e que sua remoção era uma atividade contínua. As casas em favelas como a de Janta Camp são construídas ao longo de anos, e a maioria dos moradores trabalha nas proximidades e vive há décadas ali.

As demolições começaram há quatro meses, numa manhã de maio. Vídeos mostram moradias improvisadas feitas de chapas de metal sendo derrubadas por tratores enquanto moradores assistem, alguns chorando.

A favela próxima ao centro de convenções Pragati Maidan, principal local da cúpula do G20, é um marco do cenário urbano de Nova Déli, onde muitos dos 20 milhões de habitantes vivem em áreas não planejadas. Em 2021, o ministro da Habitação informou ao Parlamento que 13,5 milhões de pessoas viviam em locais não autorizados da cidade.

"O governo está demolindo casas e removendo pessoas vulneráveis em nome do embelezamento, sem se preocupar com o que acontecerá com elas", diz Sunil Kumar Aledia, do Centro de Desenvolvimento Holístico, organização que trabalha com pessoas em situação de rua. "Moradores deveriam ter sido avisados com antecedência, e locais deveriam ter sido destinados para que eles fossem realocados."

No último mês, a Suprema Corte decidiu que os ocupantes não têm direito de permanecer nas terras públicas e que, no máximo, podem solicitar mais tempo para desocupá-las.

De abril a julho, ao menos 49 operações de demolição resultaram na recuperação de quase 93 hectares de terras, segundo o Ministério da Habitação. A pasta nega que casas tenham sido demolidas com a finalidade de embelezamento ou, então, de gentrificação.

Mohammed Shamee, outro morador de Janta Camp, diz que pensava que "as pessoas importantes que participam da cúpula do G20 dariam algo aos mais pobres". "Mas o que está acontecendo é o contrário. As pessoas importantes vão vir, sentar onde a gente vivia e celebrar."

Para Kumar, que trabalha como funcionário em um escritório de Pragati Maidan, a demolição de sua casa e a desocupação de sua família vão impactar a vida dos filhos. "A educação deles também será prejudicada; aqui eles conseguem estudar porque a escola fica perto."

Dois de seus filhos —Srishti, 5, e Eshant, 10— frequentam uma escola pública nos arredores. Sua caçula, Anokhee, tem nove meses. A família, que também inclui o pai de Kumar, morava em sua barraca havia 13 anos até ser informada que deveria desocupá-la porque "a área precisava ser limpa", disse ele.

Enquanto os tratores deixavam o local após reduzir suas casas a escombros, Kumar e sua esposa começaram a recolher pertences espalhados pela estrada. Depois, empilharam tudo em um triciclo para ir para sua nova acomodação —um único cômodo a 10 quilômetros de distância, pelo qual pagam um aluguel mensal de 2.500 rúpias (R$ 150).

Dois meses depois, em agosto, a família voltou para uma parte da área que escapou dos tratores, pagando um aluguel mais caro, de 3.500 rúpias, por um quarto.

"Foi difícil para meus filhos irem à escola todos os dias do lugar onde estávamos morando antes", disse Kumar. "Quero que eles estudem. Voltamos por causa deles."

Com 1,4 bilhão de habitantes, a Índia é, hoje, o país mais populoso do mundo após ultrapassar a China no primeiro semestre, segundo estimativas das Nações Unidas.

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