Descrição de chapéu Mundo leu Guerra do Iraque

Podcast investiga tudo que mudou no Iraque desde a invasão americana

Produção ouve autor de monografia lida pelos EUA como prova de que Saddam Hussein tinha armas de destruição em massa

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São Paulo

É provável que nenhum outro país tenha sofrido nos últimos 40 anos tantos petardos políticos e militares quanto o Iraque —que sobreviveu apenas porque sua implosão não interessava aos países vizinhos.

É o que disse em conferência em agosto na Universidade de Oxford o cientista político e historiador Ibrahim Al-Marashi, professor na Universidade Estadual da Califórnia em San Marcos.

Nos anos 1980, diz o acadêmico, abrindo uma longa sequência de misérias, e com o país sob a ditadura de Saddam Hussein, ocorreu por quase oito anos a guerra com o Irã, que matou dos dois lados no mínimo 300 mil militares e 100 mil civis. Os dois países disputavam a hegemonia na região do Golfo.

Militar americano vê estátua de Saddam Hussein ser derrubada em praça no centro de Bagdá, em abril de 2003
Militar americano vê estátua de Saddam Hussein ser derrubada em praça no centro de Bagdá, em abril de 2003 - Goran Tomasevic - 9.abr.2003/Reuters

Depois, nova sequência de tragédias. Em 1991, Saddam invadiu o Kuwait para se apoderar das reservas locais de petróleo. Os ocidentais o tiraram de lá. Mas seguiu-se uma década de embargo comercial em que os iraquianos comeram o pão que o diabo amassou.

O então presidente americano, George W. Bush, e o premiê britânico à época, Tony Blair, diziam acreditar que Saddam estava produzindo escondido armas de destruição em massa. Não estava. Mas, para conferir, invadiram o Iraque em 2003, derrubaram a ditadura e permitiram o enforcamento do ditador. Criaram com isso um novo ciclo de conflitos.

Americanos e britânicos não tinham provas de que Saddam estivesse fabricando armas proibidas, fossem químicas ou atômicas. O serviço secreto britânico entregou a Blair um documento de 19 páginas com as "provas" sobre esse arsenal. O então secretário de Estado americano, Collin Powell, leu um resumo no Conselho de Segurança da ONU.

Mas eis que se descobre que o documento secreto era em verdade um exercício de um doutorando de Oxford que elaborava sua monografia. O nome desse doutorando: Ibrahim Al-Marashi, autor da conferência de agosto sobre o Iraque.

Depois da invasão militar americana, há 20 anos, o país não experimentou um só momento de paz. Suas Forças Armadas entraram em colapso. O Iraque passou a dispor de forças curdas e contingentes árabes treinados pelos EUA, mas tais uniformizados não demonstraram a mesma eficiência militar que os militares da ditadura de Saddam.

Dois outros parceiros entraram em cena. De um lado, os defensores de um Curdistão independente que não conseguem chegar a uma proposta unificada, cuja "coerência", diz Al-Marashi, poderia pôr em xeque o princípio da indivisibilidade do território iraquiano.

Do outro lado surgiu o Estado Islâmico, que descende dos extremistas criminosos da Al Qaeda, responsável pelos atentados do 11 de Setembro de 2001. O EI tem um projeto de conquista territorial que ameaça diretamente a integridade do Iraque, mas como se trata de um grupo politicamente fraco, não o levam a sério quando ele se propõe a unir partes de Iraque à Síria sob seu autoproclamado califado.

Uma das originalidades de Al-Marashi consiste em negar que a invasão do Iraque em 2003 tenha sido para obter acesso ao petróleo. A tese, então propagada por setores da esquerda, até fazia sentido. A ideia não seria depor Saddam, mas, como bons imperialistas, ter acesso às jazidas ao sul do país.

Mas dez anos depois da invasão, as forças americanas se retiraram sem ao menos reivindicar terreno para a construção de uma base militar. A inapetência americana tem alguns motivos, como o fato de o Iraque ter se tornado um desgaste de baixíssimo rendimento político.

O conferencista apresenta, por fim, dois tópicos que pareceriam concessões ao politicamente correto, mas não são. O primeiro diz respeito ao aquecimento global. Os iraquianos estão se engajando, mas não em nome de padrões ambientais. É porque na região xiita, ao sul, a temperatura chegou com frequência no verão aos 40°C. A vida se torna impossível.

O segundo tópico diz respeito às mulheres. Mas não por feminismo, e sim pela quantidade enorme de mães que encabeçam famílias. Os maridos morreram em combate ou ainda estão combatendo. A mulher então passou a ter uma responsabilidade que desconhecia há poucas gerações. Suas reivindicações junto ao governo não dependem de uma pauta feminista próxima à ocidental.

The Transformation of Iraq Since the 2003 Invasion

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