Operação que derrubou António Costa em Portugal pode ter trocado nomes de premiê e ministro

Escutas telefônicas captaram homônimo, mas não deixaram clara referência ao primeiro-ministro ou ao titular da Economia

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Lisboa

O Ministério Público de Portugal pode ter errado na interpretação de uma das escutas telefônicas que embasaram a operação Influencer, que levou à renúncia do primeiro-ministro do país.

A transcrição de uma das ligações teria confundido o ministro da Economia, António Costa Silva, com o premiê, António Costa.

A informação é do advogado dos alvos da operação. Ele afirma que o erro foi identificado por seu cliente —o consultor Diogo Lacerda Machado, descrito pela imprensa lusa como "melhor amigo" do chefe de governo— durante uma audiência. Em declarações a jornalistas, ele afirmou que MP já "reconheceu expressamente" a troca.

O Ministério Público, contudo, não se pronunciou para confirmar ou negar a informação, amplamente noticiada pela imprensa lusa.

O premiê de Portugal, António costa, durante discurso no Palácio de São Bento, sua residência oficial em Lisboa - Patricia de Melo Moreira - 7.nov.23/AFP

"Os lapsos, quando são involuntários, não têm, obviamente, gravidade nenhuma sob o ponto de vista subjetivo, têm apenas gravidade sob o ponto de vista objetivo. Se foi intencional ou não, eu não faço essa injúria ao Ministério Público", afirmou o advogado Manuel Magalhães e Silva.

A escuta em questão era um diálogo entre o consultor Machado e outro alvo da operação, Afonso Salema. Este era o então administrador do Start Campus, um grande centro de tecnologia no município de Sines, ainda em implantação, sobre o qual também pairam denúncias no âmbito das investigações.

Na ligação, ocorrida em agosto de 2022, Salema teria pedido que Machado abordasse o governo para conseguir uma alteração de classificação de atividade econômica para o complexo de dados construído pela empresa.

O consultor teria respondido: "Tá bem. Eu vou decifrar se é [o Ministério da] Economia ou [das] Finanças. Se for Finanças, falo logo com o [ministro Fernando] Medina ou com o António Mendes, que é o secretário de Estado. Se for Economia, arranjo maneira depois de chegar ao próprio António Costa."

O "António Costa", nesse caso, seria António Costa Silva, titular do Ministério da Economia, não o premiê.

Até agora, a Procuradoria-Geral da República deu poucas informações sobre a situação do primeiro-ministro. A PGR havia afirmado, contudo, que o nome de António Costa foi invocado por suspeitos, que teriam mencionado "sua intervenção para desbloquear procedimentos".

Segundo a emissora lusa SIC, que teve acesso a um dos despachos do processo, o nome de António Costa teria sido mencionado em mais de 50 escutas telefônicas. Uma reportagem do jornal Público afirma, porém, que o conteúdo apresentado não convenceu o juiz de instrução criminal do caso. Nuno Dias Costa teria afastado, por enquanto, a suspeita de pressão sobre o premiê para favorecer a construção do centro de dados em Sines.

A decisão final não cabe a ele. Devido ao foro especial do cargo, a investigação de Costa ficará com um procurador do Supremo Tribunal de Justiça. Embora negue ter cometido qualquer ato ilícito, Costa apresentou sua demissão horas após o início da operação, em 7 de novembro.

"A dignidade das funções de primeiro-ministro não é compatível com qualquer suspeição da sua boa conduta e menos ainda com a suspeita de qualquer ato criminoso", afirmou.

A implosão do governo do Partido Socialista levou o presidente português, Marcelo Rebelo de Sousa, a anunciar a dissolução do Parlamento e a convocação de eleições antecipadas para 10 de março de 2024.

A operação Influencer atingiu em cheio o núcleo do governo e o entorno de Costa. No centro das investigações estão negócios relacionados ao lítio e ao chamado hidrogênio verde, essenciais para os projetos de transição energética da União Europeia.

Com cerca de 150 agentes nas ruas, a operação cumpriu mandados de busca em diversos locais, incluindo a residência oficial do primeiro-ministro, onde, no escritório de Vitor Escária, chefe de gabinete do premiê, foram encontrados quase € 76 mil (R$ 400 mil) em dinheiro.

Outro nome forte do governo, o agora ex-ministro das Infraestruturas, João Galamba, foi formalmente declarado suspeito no caso. O ministro do Meio Ambiente, Duarte Cordeiro, e o ex-titular da pasta João Matos Fernandes também estão sob investigação.

Apesar das grandes repercussões políticas, todos os cinco detidos já foram liberados, após determinação do juiz Nuno Dias Costa na segunda-feira (13). O grupo continua sob investigação, mas poderá aguardar o desenrolar do caso em liberdade. O magistrado retirou ainda as acusações de corrupção e prevaricação contra os cinco detidos. As suspeitas de tráfico de influência foram mantidas.

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