Sumiço de material sobre suposta interferência da Rússia nos EUA preocupa autoridades

Pasta com informações confidenciais teria desaparecido nos últimos dias da Presidência de Donald Trump

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The New York Times

Um material com informações confidenciais relacionadas à investigação sobre esforços russos para interferir nas eleições presidenciais dos Estados Unidos de 2016 desapareceu nos últimos dias da Presidência de Donald Trump, disseram duas pessoas familiarizadas com o assunto.

O desaparecimento do material, conhecido como pasta "Crossfire Hurricane" (Furacão Fogo Cruzado, em português), devido ao nome dado à investigação pelo FBI, irritou os responsáveis pela segurança nacional e suscitou preocupações de que informações sensíveis pudessem ser partilhadas de forma inadequada.

O ex-presidente dos EUA Donald Trump durante evento de campanha no estado de Iowa
O ex-presidente dos EUA Donald Trump durante evento de campanha no estado de Iowa - Vincent Alban - 13.dez.23/Reuters

O desaparecimento foi noticiado nesta sexta-feira (15) pela rede CNN. O assunto era tão preocupante para os funcionários que a Comissão de Inteligência do Senado foi informada sobre o acontecimento no ano passado, segundo um funcionário do governo americano.

O fichário consiste em uma miscelânea de materiais relacionados às origens e estágios iniciais da investigação que foram coletados por autoridades da administração Trump. Eles incluíam cópias de solicitações do FBI para mandados de vigilância com o objetivo de interceptar comunicações de um ex-assessor de campanha do republicano, bem como mensagens de texto entre dois funcionários do FBI envolvidos na investigação, Peter Strzok e Lisa Page, expressando animosidade em relação a Trump.

O conteúdo do material —uma versão censurada do qual foi tornada pública sob a Lei de Liberdade de Informação e está disponível no site do FBI— não é considerado particularmente sensível.

Mas a versão bruta na pasta que desapareceu continha detalhes que as agências de inteligência acreditam que poderiam revelar fontes e métodos secretos. (A versão disponível publicamente contém várias partes que foram apagadas por serem consideradas confidenciais.)

Não está claro se o material que desapareceu compreende toda pasta fornecida à Casa Branca para revisão e desclassificação pela equipe de Trump antes de deixar o cargo.

Entre outros detalhes obscuros, não se sabe quantas cópias foram feitas na Casa Branca ou como o governo sabe que um conjunto está faltando.

A pasta tem sido motivo de atenção recorrente desde janeiro de 2021, pouco antes de Trump deixar o cargo. Na época, os assessores de Trump prepararam censuras para parte do material contido nele porque o presidente —que estava obcecado com a investigação sobre a suposta interferência russa e acreditava que seus inimigos políticos a usaram para prejudicar sua Presidência— planejava desclassificá-lo e torná-lo público.

Autoridades fizeram várias cópias da versão com as censuras, que alguns assessores de Trump planejavam divulgar publicamente.

O chefe de gabinete da Casa Branca de Trump, Mark Meadows, tinha uma cópia do material da pasta entregue a pelo menos um escritor conservador, de acordo com depoimentos e documentos judiciais.

Mas quando autoridades do Departamento de Justiça expressaram preocupações de que compartilhar parte do material violaria a Lei de Privacidade em um momento em que o departamento já estava sendo processado por Strzok e Page por ter divulgado publicamente algumas de suas mensagens, as cópias foram rapidamente recuperadas, de acordo com duas pessoas familiarizadas com o assunto.

Trump estava profundamente focado no material que estava na pasta, disse uma pessoa próxima a ele. Mesmo depois de deixar a Casa Branca, Trump ainda queria divulgar informações ao público. Ele sugeriu, durante uma entrevista em abril de 2021 para um livro sobre sua Presidência, que Meadows ainda tinha o material. "Eu deixaria você dar uma olhada neles se quisesse", disse Trump na entrevista. "É um tesouro."

Trump não respondeu a uma pergunta sobre se ele tinha parte do material. Mas quando um assessor do republicano presente na entrevista perguntou a ele: "Meadows tem isso?", Trump respondeu: "Meadows tem".

"Nós praticamente vencemos aquela batalha", acrescentou Trump, referindo-se a perguntas sobre se sua campanha de 2016 havia trabalhado com a Rússia. "Não houve conluio. Não houve nada. E acho que já passou do seu auge. Seria um livro legal para você dar uma olhada."

George Terwilliger, advogado de Meadows, disse que o ex-chefe de gabinete não era responsável por qualquer material desaparecido. "Mark nunca levou nenhuma cópia daquele fichário para casa em nenhum momento", disse ele.

Uma pessoa familiarizada com o assunto disse, logo após a busca autorizada por um tribunal em Mar-a-Lago, o resort do ex-presidente na Flórida, em agosto de 2022, que os agentes do FBI em busca de documentos confidenciais não encontraram nenhum material da pasta "Crossfire Hurricane".

Foto em denúncia contra o ex-presidente dos EUA Donald Trump mostra caixas de documentos armazenadas em banheiro em Mar-a-Lago - Departamento de Justiça dos EUA

Para aumentar a confusão sobre o material e quem o possuía, um conjunto de documentos da investigação sobre a suposta interferência russa que Trump acreditava ter desclassificado não teve suas marcações de classificação alteradas quando foram entregues aos Arquivos Nacionais, de acordo com uma pessoa com conhecimento do assunto.

Na época, Trump estava em um impasse sobre as pilhas de material presidencial que ele havia levado consigo ao deixar a Casa Branca em 20 de janeiro de 2021 e estava resistindo a devolvê-los. Então Trump disse aos assessores que devolveria aquelas caixas em troca dos documentos relacionados à Rússia.

Os assessores nunca seguiram sua sugestão. Na preparação para as eleições de 2020, John Ratcliffe, então diretor de inteligência nacional de Trump, desclassificou cerca de mil páginas de materiais de inteligência relacionados à investigação da Rússia, que aliados de Trump usaram para tentar desacreditar a investigação.

Em 2022, Trump nomeou John Solomon, um escritor conservador que havia recebido brevemente o arquivo antes de ser recuperado, como um de seus representantes nos Arquivos Nacionais. Isso permitiu que Solomon visse os registros da Casa Branca de Trump depositados na agência. Mais tarde, ele entrou com um processo contra o governo pedindo que um tribunal ordenasse ao Departamento de Justiça que enviasse o documento para os arquivos, para que ele pudesse ter acesso a ele.

Um documento judicial que ele apresentou em agosto descreveu o arquivo como tendo cerca de dez polegadas de espessura e contendo cerca de 2.700 páginas. A versão divulgada publicamente inclui menos de 600 páginas, muitas delas fortemente censuradas; não está claro o que explica a discrepância.

Maggie Haberman , Julian E. Barnes , Charlie Savage e Jonathan Swan
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