Após críticas de setores conservadores da Igreja Católica à aprovação da bênção a casais do mesmo sexo, o escritório doutrinário do Vaticano divulgou comunicado nesta quinta-feira (4) no qual enfatiza que a medida não representa "endosso" ou "absolvição" de atos homossexuais —que a igreja considera pecados.
Em declaração de cinco páginas, o Vaticano afirmou ainda que as bênçãos podem ser "imprudentes" em países onde as pessoas LGBTQIA+ correm risco de se tornarem alvos de violência ou sofrer represálias, incluindo penas de prisão ou morte, devido à orientação sexual.
Bispos católicos de vários países, incluindo Estados Unidos e nações da África, expressaram perplexidade e discordância em relação à decisão de 18 de dezembro, quando o Vaticano autorizou a bênção a casais do mesmo sexo e a aqueles considerados "em situação irregular", termo usado para se referir aos que estão em sua segunda união após um divórcio.
Várias conferências episcopais emitiram declarações sublinhando que as bênçãos não equivaliam a uma aprovação oficial do "sexo gay" ou de um sacramento do matrimônio para casais do mesmo sexo.
A divulgação do comunicado pelo Vaticano pouco mais de duas semanas após a autorização da bênção, portanto, indica uma tentativa de atenuar a insatisfação em muitos países.
O escritório doutrinário da instituição, conhecido como Dicastério para a Doutrina da Fé, afirmou também que as bênçãos não devem ser consideradas "justificativas de todas as ações [das pessoas LGBTQIA+], nem um endosso da vida que eles levam".
O comunicado reforça que o Vaticano quer "esclarecer a recepção da Fiducia Supplicans [como a declaração de dezembro é chamada] enquanto recomenda, ao mesmo tempo, uma leitura completa e calma". "Evidentemente, não há espaço para nos distanciarmos doutrinariamente dessa declaração ou para considerá-la herética, contrária à tradição da Igreja Católica ou blasfema", disse a instituição.
No fim de dezembro, o papa Francisco, 87, alertou contra o que chamou de posições ideológicas inflexíveis e que, segundo ele, podem impedir a Igreja Católica de enxergar a realidade e avançar. Ele ainda mencionou o debate contínuo entre progressistas e conservadores, 60 anos após o Concílio Vaticano 2, que levou a igreja ao mundo moderno.
"Permaneçamos vigilantes contra posições ideológicas rígidas que, muitas vezes, sob o pretexto de boas intenções, separam-nos da realidade", disse ele aos membros da Cúria, a administração central do Vaticano.
Embora a abertura do papa às bênçãos para casais do mesmo sexo tenha sido bem recebida por muitos, conservadores disseram que isso poderia abalar os fundamentos da fé e até levar a um cisma na igreja.
Desde que foi eleito pelos cardeais há dez anos, Francisco tem tentado tornar a doutrina católica mais acolhedora para pessoas que se sentem excluídas, como membros da comunidade LGBTQIA+, mas sem mudar nenhuma parte do ensinamento da igreja sobre questões morais.
A autorização para a bênção foi anunciada seis semanas após a conclusão do Sínodo dos Bispos, uma reunião episcopal de especialistas que serve de mecanismo de consulta do papa e que tem como escopo o futuro da igreja. Também participaram dessa edição mulheres e leigos que, entre outros temas, debateram como se aproximar de grupos marginalizados pela Igreja, como divorciados em segundo casamento e pessoas LGBTQIA+.
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