Jornalistas se rebelam ao vivo, e emissora dos EUA desiste de contratar líder republicana

NBCUniversal foi acusada de dar espaço para ex-dirigente do partido reabilitar reputação após aliança com Trump

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Washington

A NBCUniversal, dona dos canais NBC e MSNBC, afirmou nesta terça (26) que a ex-dirigente do Partido Republicano dos EUA Ronna McDaniel não será mais colaboradora da rede. Desde o anúncio da contratação, feito na última sexta-feira (22), o grupo enfrenta uma rebelião de seus jornalistas.

O imbróglio ilustra as dificuldades das emissoras americanas de equilibrar a cobertura em ano eleitoral, dando espaço para nomes associados ao trumpismo –por vezes, os mesmos que as atacaram sistematicamente nos últimos anos e reproduziram mentiras sobre fraudes eleitorais.

Em um comunicado, o presidente da NBCUniversal, Cesar Conde, classificou como legítimas as preocupações manifestadas e pediu desculpas aos funcionários que se sentiram decepcionados com a contratação. "Nenhuma organização, particularmente uma Redação, pode ser bem-sucedida a não ser que seja coesa e alinhada", escreveu.

Ronna McDaniel, ex-presidente do Partido Republicano, durante abertura de debate entre pré-candidatos à Presidência em setembro do ano passado - Getty Images via AFP

Diversos âncoras usaram seus programas nos últimos dias para criticar publicamente a própria rede que os veicula. No tradicional Meet the Press, que vai ao ar aos domingos, Chuck Todd surpreendeu os espectadores ao criticar a contratação, dizendo que McDaniel possui "problemas de credibilidade" e a acusando de "assassinar reputações" por anos.

Os comentários aconteceram após a republicana participar de um segmento do programa, no qual sua presença já havia sido acertada pela moderadora, Kristen Welker, antes da notícia de sua contratação.

McDaniel foi pressionada por Welker a responder se acreditava que Joe Biden venceu a eleição de 2020 –fato que o candidato derrotado, Donald Trump, questiona sem provas até hoje com base em alegações de fraude respaldadas pela liderança do partido.

"De forma justa e honesta, ele [Biden] venceu", disse McDaniel, mas acrescentou que acha justo dizer que "houve problemas" no pleito.

"Eu acho que nossos chefes lhe devem um pedido de desculpas por colocá-la nessa situação", disse Todd a Welker no bloco seguinte.

Ao longo de segunda-feira (25), mais nomes renomados se juntaram aos protestos, como Joe Scarborough e Mika Brzezinski (Morning Joe), Nicolle Wallace (Deadline White House), Joy Reid (The ReidOut), Jen Psaki (Inside with Jen Psaki) e Lawrence O'Donnell (The Last Word with Lawrence O'Donnell).

As manifestações chegaram ao ápice à noite, quando a maior estrela da MSNBC, Rachel Maddow, abriu seu programa com um monólogo de 29 minutos criticando a decisão de seu empregador como "inexplicável".

"Quero me juntar a todos os meus colegas tanto na MSNBC quanto na NBC News que expressaram objeções importantes e fundamentadas à nossa empresa colocar na folha de pagamento alguém que não apenas nos atacou como jornalistas, mas alguém que faz parte de um projeto em execução para se livrar do nosso sistema de governo", disse.

O NBC Guild, sindicato dos jornalistas do canal, associou a contratação de McDaniel à demissão de 13 pessoas há duas semanas. Segundo o site Axios, o acordo prevê o pagamento de US$ 300 mil anuais à ex-dirigente.

"Cesar Conde nunca ofereceu uma explicação para os desligamentos, mas suas ações deixam claro –a NBC priorizou uma negacionista eleitoral sobre seus próprios repórteres", escreveu na rede social X.

Ao anunciar a contratação, a NBCUniversal afirmou que McDaniel iria "contribuir com sua expertise e análise sobre a política americana e as eleições de 2024 em todas as plataformas da NBC News".

A contratação de nomes de projeção do mundo da política para participar da programação como comentadores e até apresentadores é comum na TV americana –a própria Jen Psaki foi secretária de imprensa do presidente Joe Biden em 2021 e 2022 e, antes, diretora de comunicações da Casa Branca durante o governo Obama entre 2015 e 2017.

Em suas críticas, os jornalistas da rede –especialmente da MSNBC, que se situa à esquerda no espectro político americano– afirmam que suas objeções não dizem respeito ao fato de McDaniel ser republicana ou de direita, mas sim a ela ter compactuado com as alegações de fraude eleitoral feitas por Trump e atacado a imprensa ao longo dos últimos anos.

"Para ser claro, acreditamos que a NBC News deveria buscar vozes conservadoras republicanas para fornecer equilíbrio em sua cobertura eleitoral", disse, por exemplo, Brzezinski no Morning Joe.

McDaniel foi recentemente derrubada do cargo por pressão de Donald Trump, que colocou na liderança do partido Michael Whatley e sua nora, Lara Trump. Os jornalistas acusam a rede de dar uma plataforma para McDaniel reabilitar sua imagem depois dos anos à frente dos republicanos.

Desde 2000, 16 dos 31 secretários de imprensa e diretores de comunicação da Casa Branca se tornaram colaboradores, comentadores ou apresentadores de programas de notícias, de acordo com levantamento do Axios.

Essa relação se estreitou especialmente durante a Presidência de Trump: a Business Insider contou ao menos 21 nomes que serviram tanto ao governo quanto ao canal conservador Fox News.

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