Descrição de chapéu The New York Times África

Presidente eleito do Senegal se torna mais jovem líder de um país da África

Opositor Bassirou Diomaye Faye, 44, estava preso dez dias antes do pleito, mas ganhou disputa com 54% dos votos

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Ruth Maclean
Ndiaganiao (Senegal) | The New York Times

O candidato da oposição Bassirou Diomaye Faye venceu as eleições presidenciais no Senegal com mais de 54% dos votos, afirmou a Justiça do país na quarta-feira (27). Com 100% das seções apuradas, o político terminou a corrida 19 pontos percentuais acima do candidato da coalizão governista, Amadou Ba, que angariou 35% dos votos.

Os resultados devem ser confirmados pelo Conselho Constitucional nos próximos dias, mas o atual líder senegalês, Macky Sall, já parabenizou o presidente eleito e afirmou que seu êxito é "uma vitória para a democracia". Apesar do tom ameno, Faye estava preso e foi libertado apenas dez dias antes das eleições.

Apoiadores do candidato anti-establishment Bassirou Diomaye Faye, no cartaz à esquerda, se reúnem em frente à sede de sua campanha em Dakar - Carmen Abd Ali - 24.mar.2024/AFP

A votação que levou Faye à Presidência desse país da África Ocidental foi também a sua primeira vitória nas urnas. Antes das eleições do último domingo, o único pleito do qual havia participado era para a Prefeitura de sua cidade natal, Ndiaganiao —um pequeno povoado no meio de uma estrada de areia repleto de carroças que levam mulheres e suas mercadorias para o mercado. Ele perdeu essa eleição, em 2022, para o candidato do partido governante.

Apesar da vitória, poucos no Senegal conhecem a jornada notável desse inspetor fiscal de 44 anos que surfou em uma onda de descontentamento da juventude para se tornar o presidente eleito mais jovem da África.

Entrevistas com familiares e amigos em Ndiaganiao e na vila onde ele foi criado, porém, revelaram um homem estudioso, leal, curioso e às vezes teimoso, enraizado nas tradições senegalesas e em sua fé islâmica e com um profundo entendimento do dilema enfrentado pela legião de jovens frustrados de seu país.

"Ele não veio do nada", diz Diomaye Faye, tio cujo nome inspirou o do novo presidente, em uma entrevista na casa da família —uma construção arrumada e modesta que sediou uma enorme festa improvisada no domingo à noite. "Esta família não é nova no governo."

Um ascendente de Faye foi o fundador dessa vila séculos atrás, e seu avô foi o chefe do povoado e um dos soldados africanos recrutados pela França para lutar na Primeira Guerra Mundial antes de ser gravemente ferido no campo de batalha. Ao retornar para casa, ele lutou pela criação da primeira escola secundária em Ndiaganiao —algo que representava uma ameaça tão grande para as autoridades da era colonial que ele acabou na prisão.

"Bassirou cresceu em um ambiente onde as pessoas lutam pelos direitos dos outros", diz Diomaye sobre seu sobrinho.

Foi defendendo seu aliado político que Faye foi preso. Sua detenção, em abril do ano passado, aconteceu devido a uma publicação no Facebook criticando o que considerava uma perseguição do governo contra Ousmane Sonko, o principal político de oposição do Senegal.

Sonko nomeou Faye seu sucessor após ser impedido de concorrer à Presidência devido a uma acusação por difamação e corrupção de menores (ele era suspeito em um caso de estupro, mas foi absolvido). O agora presidente eleito ficou dez meses preso. Na cela minúscula onde dormia, comia, tomava banho e se exercitava com outros três prisioneiros, iniciou sua candidatura à Presidência.

Há duas semanas, quando a dupla foi libertada dez dias antes de uma eleição presidencial que Sall, o atual presidente, tentou cancelar, quase todos os senegaleses conheciam Sonko —mas poucos conheciam Faye.

Os dois, então, iniciaram a campanha imediatamente para mudar esse cenário. O objetivo era tornar seus nomes sinônimos, o que pode ter funcionado —no dia da eleição, muitos jovens disseram estar "votando em Sonko".

Faye se descreve como alguém que normalmente não fala muito, mas quando saiu da prisão e percebeu o quanto ele e seu aliado eram apoiados, quis agradecer a todos pessoalmente.

"Quando vi a quantidade de pessoas saindo, só queria abraçar todo mundo", disse em uma longa entrevista ao Senepeople, um veículo de mídia local, na semana passada, "e pedir desculpas por todo o problema que tiveram que enfrentar."

De muitas maneiras, Faye se apresenta como um típico jovem senegalês —apaixonado pelo Facebook, sempre com seus fones de ouvido sem fio e mais à vontade em um caftã tradicional do que nos ternos ocidentais sob medida preferidos de seu antecessor.

Antes de todo o seu tempo ser consumido pela política, ele era um ávido jogador de futebol, de acordo com seu amigo de infância Mor —recentemente, ele jogou em um time de inspetores fiscais na capital senegalesa, Dacar. Como muitos jovens do país obcecados por futebol, Faye é fã do time espanhol Real Madrid, diz Sarr.

O novo líder cresceu em uma casa onde moravam dez adultos e um bando de crianças com quem ele corria, de acordo com seu tio. Mas Faye era frequentemente visto lendo —um de seus autores favoritos, segundo Sarr, era Dale Carnegie, o autor americano de "Como Fazer Amigos e Influenciar Pessoas".

"Ele é jovem na idade, mas não em sua inteligência e comportamento", afirma seu pai, Samba Ndiagne, 92, outro ex-chefe de vila, sentado na sua sala de estar ao lado de alguns dos anciãos do povoado.

Faye tem duas esposas —a poligamia é comum no Senegal, inclusive entre seu grupo étnico, os Serer. "Ser casado com duas esposas é um sinal de responsabilidade", afirma seu irmão mais velho, Ibrahima. "Ele tem muito orgulho de ser poligâmico e não esconde isso."

O novo presidente tem quatro filhos com sua primeira esposa —um, inclusive, que se chama Ousmane, em homenagem a Sonko— e se casou com sua segunda esposa, que vive e trabalha na França, no início do ano passado. O casal se viu apenas uma vez entre o matrimônio e a prisão. A vez seguinte em que estiveram juntos foi na campanha, segundo Sarr.

Durante a corrida eleitoral, Faye e Sonko enfatizaram a soberania do Senegal em relação à França, seu antigo colonizador, e a necessidade de substituir a moeda apoiada pelo país europeu.

Seu tio compara a agenda política de seu sobrinho à luta dos líderes federalistas americanos pela independência do Reino Unido. "As batalhas que estão travando agora são as mesmas batalhas que Madison, John Jay e Hamilton travaram", disse ele.

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