Descrição de chapéu Governo Milei Argentina

Senado argentino debate pacote de Milei com forte confronto do lado de fora

Análise da Lei de Bases é acompanhada de confusão entre polícia e manifestantes, que destroem carro da imprensa

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Buenos Aires

Em uma disputa de voto por voto no Senado da Argentina, o governo de Javier Milei aceitou retirar a empresa Aerolíneas Argentinas da lista de empresas privatizáveis reunidas no pacote liberal que busca aprovar, a Lei de Bases —antes comumente chamada de Lei Ônibus.

O anúncio foi feito ainda durante as horas iniciais do debate entre os senadores, nesta quarta-feira (12), por Bartolomé Abdala, que lidera a Liberdade Avança, a coalizão do presidente, no Senado. Também saem desta lista os Correios e a Rádio e Televisão Argentina.

Carro de rádio argentina incendiado durante ato ao lado de fora do Congresso, em Buenos Aires, enquanto senadores debatem Lei de Bases
Carro de rádio argentina incendiado durante ato ao lado de fora do Congresso, em Buenos Aires, enquanto senadores debatem Lei de Bases - Mariana Nedelcu/Reuters

É um esforço final da Casa Rosada diante de um cenário complicado no Legislativo. O governo Milei já viu seu pacote, prioridade legislativa, ser desidratado desde o início deste ano. Até aqui, em mais de seis meses de governo, não logrou aprovar suas medidas no Congresso.

Mas a baixa de guarda do governo não afrouxou a forte oposição nas ruas chamada por centrais sindicais, movimentos políticos e partidos.

Do lado de fora do Congresso em Buenos Aires, houve confronto entre polícia e manifestantes. Ao menos cinco deputados da oposição que se somaram às fileiras desses atos foram encaminhados ao hospital após receberem gás lacrimogêneo nos olhos.

Em resposta à repressão policial, manifestantes lançaram pedras e coquetéis molotov contra os agentes de segurança. Eles também atearam fogo em um veículo da rádio Cadena 3, que estava identificado como da imprensa. Um jornalista da rede relatou ter sido agredido. A imprensa local relata que há ao menos 30 detidos e mais de 20 policiais feridos.

O enfrentamento ocorre em um momento de recrudescimento das ações policiais sob as ordens da ministra de Segurança Patricia Bullrich, ex-presidenciável e um dos principais nomes deste governo. No X, o gabinete de Milei parabenizou os agentes de segurança.

"Parabéns por essa excelente atuação na repressão contra grupos terroristas que com paus, pedras e granadas tentaram perpetrar um golpe de Estado, atentando contra o funcionamento protocolar do Congresso", escreveu a equipe do presidente.

Já faz mais de dois meses que a Câmara dos Deputados aprovou com maioria confortável a Lei de Bases. Então, o debate foi ao Senado, mas seguiu travado e sob intensas negociações até ser levado a plenário nesta quarta, com uma verdadeira maratona prevista para a sessão.

Os votos já anunciados a favor e contra estão tão parelhos que há uma grande aposta na possibilidade de empate. Com o bloco kirchnerista e alguns poucos membros da União Cívica Radical, ao menos 36 senadores já disseram que votarão contra a proposta governista.

Por outro lado, ao menos 35 disseram que a apoiarão. Há um voto a definir. A Casa tem 72 membros, e aprovar a medida exige maioria de ao menos 37. Caso haja um empate, a decisão poderia ficar a cargo da vice-presidente Victoria Villarruel, que no país preside o Senado.

Em mais um fator para adicionar emoção ao dia, a expectativa é de que ao final desta quarta ela esteja fora do posto, substituindo Milei na Presidência. O ultraliberal tem viagem marcada à Europa para a cúpula do G7, que participa como convidado pela primeira-ministra italiana, Giorgia Meloni.

Neste cenário, quem a substituiria na presidência dos debates no Senado seria justamente o libertário Bartolomé Abdala, cujo voto (a favor da proposta do governo) passaria a valer por dois.

Criada nos anos 1950 por Juan Domingo Perón, a Aerolíneas foi posteriormente privatizada na década de 1990 durante o governo de Carlos Menem, de quem Milei é admirador. Posteriormente, em 2008, no governo de Cristina Kirchner, a companhia aérea foi estatizada.

Além desse, vários outros pontos são sensíveis. A oposição se coloca contra, entre outras coisas, a concessão ao Executivo da capacidade de governar sem o Congresso em quatro áreas por um ano. A saber: administrativa, econômica, financeira e energética.

"Vou dar esse poder a um presidente que diz ser o exterminador?", ironizou em sua fala a senadora opositora Lucía Corpacci.

Há também grande oposição ao chamado Rigi, o Regime de Incentivos a Grandes Investimentos, uma proposta da Casa Rosada adendada à Lei de Bases para distribuir incentivos, como anulação de impostos, a empresas que invistam ao menos US$ 200 milhões no país em áreas como petróleo, gás e mineração. O objetivo é levar dólares à Argentina.

Opositores dizem que esse projeto deixará de lado pequenas e médias empresas; apostará em áreas na contramão do combate à mudança climática; retirará autonomia das províncias nestas decisões e, em certa medida, ferirá a soberania nacional.

"Todos queremos desburocratizar o país, mas não a custa de entregar a Argentina de bandeja", disse o senador Martín Lousteau, presidente da União Cívica Radical. Ocorre que o Rigi, agora que o governo abriu mão de outras demandas, virou uma prioridade da Casa Rosada.

Era também contestada uma minirreforma no regime de aposentadorias que derrubaria uma moratória previdenciária que permitia a mulheres se aposentar a partir dos 60 anos mesmo sem ter cumprido os 30 anos exigidos de participação no mercado formal, podendo pagar os aportes que faltavam em pequenas parcelas.

Mas o governo nos últimos minutos aceitou deixar de lado a medida que, na prática, dada a alta informalidade feminina no mercado de trabalho argentino e global, levaria a idade mínima de aposentadoria para as mulheres de 60 a 65 anos.

A Casa Rosada também recuou em sua posição de cortar por completo o financiamento de obras públicas no país. Após ampla pressão o governo aceitou terminar de subsidiar as obras que já estejam ao menos 80% concluídas ou aquelas que tenham alguma participação de crédito de organismos internacionais.

Mesmo se aprovada no Senado, a Lei de Bases retornaria para análise final da Câmara, já que sofreu modificações. Por último, Javier Milei ainda poderia eventualmente vetar alterações que a oposição tenha logrado inserir em seu pacote.

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