Descrição de chapéu

Ordem e folia

Sucesso do Carnaval de São Paulo demanda aprendizado

 Bloco Pinga Ni Min atrai multidão na 23 de Maio, uma das principais vias de São Paulo
Bloco Pinga Ni Min atrai multidão na 23 de Maio, uma das principais vias de São Paulo - Joel Silva/Folhapress

As imagens falam por si mesmas. Apesar de seguida —e previsível— militância nas redes sociais, não prevaleceu a tentativa de agourar um fracasso no Carnaval paulistano, supostamente tributário do viés "antipopular" (leia-se não petista) da prefeitura.

Habitualmente tomada por fileiras quilométricas de automóveis, a avenida 23 de Maio deu lugar a cortejos de milhares de pessoas. Em intensidade que cresce ano a ano, os blocos de rua fazem com que o Carnaval de São Paulo rivalize hoje com os de cidades proverbialmente identificadas com a data, como Rio, Salvador ou Recife.

De alguma forma, é como se a capital paulista se integrasse mais à imagem que, para bem ou para mal, está associada ao Brasil.

Para bem, naturalmente, fica a ideia de uma população descontraída, dionisíaca, fusional. Do lado oposto, parece estar o clássico esquecimento dos próprios problemas, que exigem compenetração e empenho público.

Esse aspecto contraditório da realidade brasileira, de que São Paulo na verdade nunca escapou, reflete-se no próprio fenômeno do Carnaval. Ninguém ignora o quanto de planejamento se exige para o êxito de um grande desfile.

Conciliar ordem e folia, disciplina e transgressão; eis algo que poderia soar como a quadratura do círculo. É possível e necessário, porém —por parte dos carnavalescos e do poder público.

Nem tudo, na festa paulistana, concilia-se com o sucesso.

Reportagem publicada por esta Folha mostrou, por exemplo, que em hospitais próximos à 23 de Maio as vidraças de UTIs chegaram a estremecer com o som dos trios elétricos. Contam-se os foliões, mas não há cálculo dos muitos que tiveram problemas para chegar ao trabalho ou à própria casa.

As restrições de áreas e horários impostas pela gestão João Doria (PSDB) lograram êxito parcial. Em diversos pontos da cidade, o barulho prolongou-se por horas além da passagem dos blocos.

As tentativas de controle não se dão sem tensões. Em particular na Vila Madalena, onde há anos os moradores reclamam do som alto e da sujeira, houve quem se ressentisse do cerceamento à liberdade de ir e vir —atrás de grades montadas no local, seguranças exigiam comprovante de residência de quem quisesse passar.

De todo modo, o aprendizado parece promissor. A escala de horários e locais dos blocos pode ser aperfeiçoada, para o bem dos que não participam da festa. Apolo e Dionísio podem aliar-se; se quisermos uma tradução para as figuras arquetípicas da ordem e da orgia, digamos que mesmo o samba admite seus momentos de breque.

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