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Copa, drama e corrupção

Modelo do torneio aumenta patrocínios e receitas, mas também abre brechas para propinas

Estádio Luzhniki, em Moscou, receberá a final da Copa do Mundo
Estádio Luzhniki, em Moscou, receberá a final da Copa do Mundo - Mladen Antonov/AFP

É sabido que o regulamento da Copa do Mundo não se presta a premiar, necessariamente, a melhor ou a mais bem gerida seleção.

Para tanto seria mais adequado um campeonato em que todas as equipes jogassem entre si, como se procede nos principais certames nacionais de clubes. Tal formato, porém, demandaria tempo e recursos excessivos.

Em vez disso, a Copa foi desenhada como um torneio de curta duração —apenas um mês— e de poucos e decisivos jogos. Assim se reduz rapidamente o número de competidores até a definição da dupla que disputará o título.

Desnecessário mencionar que esse mecanismo abre grande margem para o imponderável e o injusto. Como todo torcedor ansioso pode testemunhar, basta um golpe de azar ou um lance fortuito, como uma falha individual, para dar fim a um trabalho de anos.

Para o público, o apelo mais evidente é a expectativa criada em torno das partidas mortais. O espetáculo ganha, inegavelmente, em drama e júbilo.

Mas há outras vantagens, de cunho mais pragmático. O modelo permite a participação de mais equipes, o que abre oportunidades políticas e econômicas.

Em 1982, o número de seleções na competição foi elevado de 16 para 24; desde 1998, são 32; a partir de 2026, haverá 48. Essa expansão, certamente danosa à qualidade média das partidas disputadas, atende às conveniências da Fifa, a entidade máxima do futebol.

Globaliza-se o esporte, já amplamente praticado e apreciado em todos os continentes, ainda que a hegemonia de Europa e América do Sul se mantenha desde a primeira Copa, em 1930.

Países em busca de prestígio no cenário geopolítico internacional se interessam em abrigar a competição. São os casos recentes de Brasil, Rússia —sede da edição deste ano, a começar em menos de um mês— e Qatar, o próximo anfitrião.

Tudo isso também significa crescimento de patrocínios, receitas e, como mostrou caderno especial publicado por esta Folha, das brechas para a corrupção.

Só no Mundial de 2014, a Fifa arrecadou US$ 5,1 bilhões (R$ 19,1 bilhões, com a recente escalada das cotações do dólar), mais de 60% dos quais com a venda de direitos de transmissão pela TV.

Segundo investigações conduzidas nos EUA, tais contratos motivaram propinas a dirigentes futebolísticos globais e nacionais. Os brasileiros não seriam exceção.

Há, decerto, perda de credibilidade, que se soma a velhas suspeitas, muitas delas meras teorias conspiratórias, em torno de tabelas manipuladas e resultados comprados. 

Nada que pareça capaz de impedir, de todo modo, o sucesso dessa grande mostra quadrienal —que, num esporte já consagrado como negócio, ainda se vale dos sentimentos patrióticos de seu público.

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