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Luiz Felipe Panelli

Redes sociais são a nova esfera pública

Causou espanto Facebook retirar páginas ligadas ao MBL

Entrada da sede do Facebook, na Califórnia
Entrada da sede do Facebook, na Califórnia - Josh Edelson - 21.mar.18/AFP

Causou certo espanto o fato de o Facebook ter retirado do ar, nesta quarta-feira (25), algumas páginas que veiculavam conteúdo político. As páginas têm alinhamento às pautas da chamada “nova direita”, ou seja, são majoritariamente liberais (algumas conservadoras), combatem a retórica dos partidos de esquerda e pretendem introduzir no Brasil uma mentalidade de direita liberal que, segundo os seus organizadores, quase inexiste no debate político.

A maioria das páginas retiradas, aliás, era vinculada de alguma forma ao Movimento Brasil Livre (MBL), grupo que se notabilizou pela campanha que levou ao impedimento da então presidente Dilma Rousseff.

A justificativa dada para a exclusão sumária —sem nenhuma chance de contraditório— é que as páginas veiculavam notícias falsas, com objetivo de gerar desinformação. Tratar-se-ia, então, do famoso “fake news”. É certo que o Facebook já havia se comprometido a combater a prática de espalhar notícias falsas, mormente após o escândalo envolvendo a rede social e o uso de tal expediente por Donald Trump para influenciar a eleição americana.

O que chama a atenção, porém, são três fatos. O primeiro é a forma sumária de exclusão, sem direito ao contraditório. O segundo é o alinhamento das páginas à “nova direita”, o que nos leva a perguntar o porquê de o Facebook não ser tão rigoroso com páginas alinhadas à esquerda. O terceiro é a exclusão completa da página, em detrimento da exclusão apenas do conteúdo que foi classificado como “fake news”.

Pode-se dizer que o Facebook, como empresa privada que é, tem direito de controlar o seu conteúdo. A rede social nunca aceitou, por exemplo, conteúdo pornográfico, e tal restrição não causou indignação de ninguém. Portanto, se o Facebook mudou os seus padrões para se tornar mais rígido com as “fake news”, cabe aos seus usuários acatar tais decisões ou deixar a rede social.

O problema dessa argumentação é que um fato importante é ignorado: as redes sociais pretendem ser a “ágora” do século 21. Elas transferiram para si o debate público, que por muito tempo era mediado pela imprensa tradicional. O resultado dessa transferência ainda é desconhecido —Umberto Eco disse, por exemplo, que a possibilidade de todos se manifestarem diretamente, sem o filtro da imprensa, empobrece o debate público.

Há os que dizem que essa manifestação sem filtro torna mais radicalizado o campo político, pois grupos extremistas, outrora relegados à obscuridade, podem aparecer da mesma forma que partidos políticos tradicionais.

Para o bem ou para o mal, porém, as redes sociais se tornaram o principal campo de debate público. E, se pretendem ser veículo de discussão de ideias —se pretendem ser os mediadores da esfera pública, por assim dizer—, devem aderir às regras constitucionais que garantem o equilíbrio de forças, em especial a possibilidade de defesa e contraditório, bem como o tratamento igual para forças políticas diferentes.

A rede é privada, mas o espaço que ela (propositalmente) construiu é acessível ao público. Não é possível banir, sumariamente, dezenas de páginas sem aviso prévio, assim como um shopping center ou um restaurante (ambos espaços privados) não podem banir indiscriminadamente pessoas dos seus recintos.

Há regras, e é bom que elas existam. A proibição da pornografia, por exemplo, é regra salutar. Porém, quando falamos de discurso político, estamos falando de um bem constitucionalmente protegido pela liberdade de expressão —que, por sinal, é aplicável às redes sociais por conta do Marco Civil da Internet.

Luiz Felipe Panelli

Advogado, doutorando em direito constitucional pela PUC-SP e assessor do coordenador do Movimento Brasil Livre e vereador em São Paulo Fernando Holiday (DEM)

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