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Maria Inês Fini

Em razão da pandemia de Covid-19, o Enem deveria ser adiado já? SIM

Numa tentativa de politizar o processo, milhões poderão ser prejudicados

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Maria Inês Fini

Numa injusta agressão aos jovens brasileiros que mais precisam do apoio das políticas públicas de educação, o Ministério da Educação insiste em manter o calendário do Enem 2020. Todos assistimos, mais perplexos a cada dia, à falta de uma política de educação coordenada com estados e municípios, que promova mais equidade nos esforços da nação em busca de mais e melhor aprendizagem aos alunos brasileiros.

O Enem é uma conquista, e são os dados desse exame, que é do Brasil e não do governo, que se contrapõem à visão e aos argumentos apresentados pelo Ministério da Educação.

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A professora e ex-presidente do Inep Maria Inês Fini - Walterson Rosa - 7.maio.18/Folhapress

Entretanto, não bastam dados que sustentam que o Enem contribui para a democratização do acesso ao ensino superior, que ajuda a diminuir a desigualdade social entre os estudantes e que seus resultados associados ao Sisu (Sistema de Seleção Unificada), Prouni (programa que oferta bolsas a estudantes em instituições privadas do ensino superior) e Fies (fundo de financiamento estudantil) ampliaram significativamente o acesso ao ensino superior do grupo social que era, e ainda é, excluído dessas oportunidades.

Os resultados obtidos nas diversas edições do exame revelam as enormes diferenças de desempenho existentes entre alunos das escolas privadas e os da escola pública, mas todos serão igualmente prejudicados pela ausência do trabalho escolar, nessa época de colégios fechados em decorrência do necessário distanciamento social.

Certamente uns mais do que outros, pois mesmo os alunos das escolas particulares ressentem-se da falta da sala de aula e do ambiente estruturado de ensino para potencializar aprendizagens. Pois, embora para eles estejam sendo disponibilizados diferentes recursos para o ensino remoto, a maioria não corresponde ainda a um projeto estruturado de ensino a distância com todos os insumos de suporte aos alunos que um projeto de EAD exige minimamente, com tutoria, material adaptado, interatividade e avaliação.

O sucesso no Enem requisita estruturas de pensamento que vão além da memorização de conteúdos. Pressupõe leitura e interpretação de textos e competências lógico-matemáticas envolvidas na solução dos problemas propostos nas provas objetivas. São requisitados domínios dos conteúdos da ciência, da arte e da filosofia, mas contextualizados nas situações problema das questões.

O desenvolvimento dessas estruturas de raciocínio precisam da mediação do professor e do ambiente de desafios e trocas na sala de aula para consolidar aprendizagens no ambiente propício para o desenvolvimento integral dos alunos.

Inúmeras iniciativas já foram apresentadas ao MEC para o adiamento do exame: CNE (Conselho Nacional de Educação), Consed (Conselho Nacional de Secretários de Educação), TCU, projetos na Câmara e UNE, entre outros tanto —mas o MEC permanece irredutível e se opõe à alteração do cronograma, criticando os gestores estaduais e municipais pelo que chama de atitude “precipitada” de fechar escolas, numa tentativa de politizar o processo.

Por todo o cenário de pandemia, o certo seria iniciar logo uma repactuação do calendário do Enem em uma concertação nacional entre MEC, Inep, secretarias de Educação e universidades, pois é certa a alteração do calendário escolar de 2021.

As matrículas no 3º ano do ensino médio regular em 2019 somaram 2,1 milhões, sendo 1,8 milhão nas escolas públicas e cerca de 285 mil nas privadas. Se somarmos aos 2,7 milhões de alunos do EJA (Educação de Jovens e Adultos) com mais de 18 anos, além das famílias envolvidas, podemos estimar quantos sonhos serão dificultados e quantas vidas o MEC vai prejudicar.

Gestores, professores e famílias: vamos todos ao #semaulassemenem!

Maria Inês Fini

Professora aposentada da Unicamp, é criadora do Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) e foi presidente do Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira) entre 2016 e 2018

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