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Túlio Vianna

'Stalking' agora é crime, mas é preciso mais

Conter a perseguição obsessiva exige medidas protetivas de urgência

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Túlio Vianna

Advogado criminalista e professor de direito penal da Faculdade de Direito da UFMG

O "stalking" passou a ser crime no Brasil desde 1º de abril deste ano, com a publicação da lei nº 14.132/21. A pena prevista é de 6 meses a 2 anos de reclusão e multa.

O novo crime, que recebeu o nome de “perseguição", pune quem persegue uma pessoa, com ameaças físicas ou psicológicas e perturbação de sua privacidade. A prática tem se tornado cada dia mais comum no Brasil, principalmente por meio das redes sociais.

Perseguição pode ser por meio virtual - Saul Loeb/AFP

Infelizmente, muita gente só considera graves os crimes que provocam lesões físicas, subestimando o dano causado por agressões psicológicas. Trata-se de um grande equívoco. A agressão psicológica causada pelo "stalking" pode persistir por meses ou mesmo anos. Muitas vezes provoca danos permanentes à saúde mental das vítimas. Se comparado com agressões físicas leves, o "stalking", em muitos casos, acaba sendo uma agressão até mais relevante.

O "stalker" normalmente persegue sua vítima de forma obsessiva, acompanhando sua rotina em redes sociais ou mesmo presencialmente. A vítima passa então a receber mensagens com ameaças de todo tipo. Textos difamatórios são postados em redes sociais ou enviados para seus parentes e amigos. A vítima perde o sossego e muitas vezes tem sua saúde psicológica bastante afetada.

São famosos casos de ex-companheiros que se tornam "stalkers" por não aceitarem bem a separação. Alguns destes casos, quando não combatidos rapidamente, acabam de forma trágica em feminicídio.

Mas o "stalking" não é uma prática exclusiva de homens frustrados. Mulheres também praticam "stalking" contra seus ex-companheiros e frequentemente contra as novas companheiras deles. A diferença, porém, é que o "stalking" praticado por mulheres normalmente resulta em menos agressões físicas, pois é mais focado em tortura psicológica. Por conta disso, acaba sendo mais invisível.

Com o crescimento das redes sociais na última década, tornou-se bastante corriqueiro também o "stalking" praticado por desconhecidos que tiveram contato com suas vítimas exclusivamente pela internet. As motivações podem ser de cunho sexual, político ou qualquer desavença na rede.

Essa perseguição obsessiva até então não era punida pela lei brasileira, e os fatos eram enquadrados como ameaça, difamação ou outros crimes relacionados. A criminalização do "stalking" foi um avanço necessário e muito bem-vindo, especialmente em tempos de quarentena, em que o isolamento social cria um terreno fértil para esse tipo de prática.

A nova lei, porém, está longe de ser uma solução efetiva para o problema, pois suas punições só poderão ser aplicadas após um longo processo criminal. A vítima de "stalking" tem pressa. E a lei promulgada não prevê solução rápida para interromper as agressões.

É necessário que se crie uma nova lei acrescentando medidas protetivas de urgência para tutelar todas as vítimas do crime de "stalking", independentemente de gênero ou motivação. Proibir a aproximação do autor e seu contato com a vítima, seus familiares e amigos é uma medida protetiva bastante usada nos casos de violência doméstica e que pode perfeitamente ser estendida aos casos de "stalking". Faltou ao legislador pensar nisso e acrescentar esta simples previsão na lei.

Infelizmente, a lei aprovada com sua atual redação não será suficiente para dar uma resposta rápida às vítimas que continuarão sujeitas às agressões até o julgamento definitivo da causa. Foi um primeiro passo importante, mas é preciso que o Congresso Nacional avance e acrescente as necessárias medidas protetivas de urgência para proteger as vítimas deste crime.

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