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Pária na calçada

Bolsonaro usa assembleia da ONU para delírios voltados à minoria que o apoia

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Jair Bolsonaro fala na Assembleia da ONU - Timothy A. Clary/AFP

Jair Bolsonaro deu novamente as costas para o mundo ao se apresentar no púlpito da Organização das Nações Unidas para discursar na abertura da sua assembleia anual, nesta terça-feira (21).

Como em ocasiões anteriores, sua fala foi dirigida especialmente para a minoria que ainda apoia seu desacreditado governo, de cuja fidelidade o mandatário depende para sustentar sua campanha à reeleição no ano que vem.

Algo mais moderado, Bolsonaro mostrou preocupação em abordar temas que, em seu governo, geram desgaste para a imagem do país. Em que pese a tentativa, tudo o que tinha a oferecer eram fantasias que só seduzem os mais radicais de seus adeptos.

Ao discorrer sobre a política ambiental, distorceu números, minimizou receios e enalteceu a legislação brasileira —a mesma que ele busca enfraquecer sem descanso desde que tomou posse.

Numa tentativa covarde e canhestra de se eximir de responsabilidade pelo fracasso no enfrentamento da pandemia e na recuperação da atividade econômica, culpou governadores e prefeitos pela fome, pelo desemprego e até pelo descontrole da inflação.

Destacou a vacinação no país, como se o mundo ignorasse as medidas que tomou para sabotar os esforços dos governos locais e sua negligência na crise sanitária. Teve ainda a desfaçatez de oferecer lições a outros governantes.

Voltou a defender o uso de remédios que se provaram ineficazes contra a Covid e criticou os países que passaram a exigir comprovantes de vacinação em suas fronteiras.

Com a economia andando de lado, disse que não há no mundo porto mais seguro para os investidores do que o Brasil e apontou como prova da confiança em seu governo o apoio das multidões sectárias que foram às ruas atender a seus apelos golpistas no 7 de Setembro.

Para frustração dos diplomatas ingênuos que sonhavam com a aparição de um estadista magnânimo no palco da ONU, sugestões de moderação do discurso foram ignoradas, e Bolsonaro pôde se apresentar mais uma vez como o radical que seus seguidores idolatram.

Se o contraste entre as palavras e a realidade é gritante, as imagens produzidas pelo mandatário em sua passagem por Nova York deixaram claras suas intenções.

Com entrada restrita nos restaurantes da cidade por não ter se vacinado, o chefe do Executivo fez questão de divulgar imagens em que comia pizza com assessores na calçada. Em outra ocasião, seu ministro da Saúde permitiu-se fazer, de dentro de um carro, um gesto obsceno para manifestantes.

Ao ostentar o negacionismo, Bolsonaro acena para o eleitor que ainda vê nele o rebelde transgressor que prometia enfrentar as elites e consertar o país. Para o resto do mundo, fica apenas mais um retrato do isolamento do presidente que não governa e não se importa em ser visto como pária.

editoriais@grupofolha.com.br

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