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Gatilho ideológico

Bolsonaro logra difundir armas com decretos duvidosos e motivações delirantes

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Jair Bolsonaro (PL) na manifestação do 7 de Setembro na avenida Paulista, em São Paulo - Danilo Verpa - 7.set.21/Folhapress

A agenda ideológica de Bolsonaro (PL) se faz notar mais à base de inação, aparelhamento e desorganização administrativa do que na forma da novas leis e políticas de governo. Assim se produziram desastres em áreas como educação, saúde e meio ambiente.

No mais, até aqui frustraram-se, por falta de sustentação política, social ou jurídica, tentativas de coibir a punição de abusos policiais (excludente de ilicitude), cercear conteúdos em salas de aula (Escola sem Partido), restringir as possibilidades de demarcação de terras indígenas (marco temporal).

Um caso à parte é o da ampliação do acesso a armas de fogo, em que o bolsonarismo, ainda que por meios tortuosos, conseguiu avançar. Nesta terça (28), o anuário publicado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública trouxe novos e preocupantes dados nesse sentido.

É particularmente espantoso o aumento do número de registros ativos de armas no sistema da Polícia Federal (Sinarm), que passou de 1,06 milhão em 2019, no início do governo, para 1,49 milhão no ano passado, numa alta de 41%.

Considerando também outras fontes de informação, chega-se a um total de 2,8 milhões de artefatos —revólveres, pistolas, espingardas e outros— particulares no país. Como comparação, os órgãos públicos, como as polícias militares e civis, dispõem de não mais que 384 mil artigos do gênero.

São conhecidos os riscos da liberalização do acesso a armamentos, que tendem a agravar conflitos pessoais, provocar acidentes e facilitar suicídios. Ademais, produtos legalmente adquiridos não raro vão parar nas mãos de criminosos.

Bolsonaro tem estimulado a posse e o porte por meio de decretos presidenciais, que por sua natureza não deveriam contrariar o espírito da lei —no caso, o Estatuto do Desarmamento, aprovado em 2003. Assim, sem debate e escrutínio do Legislativo, normas de controle e restrição são eliminadas.

Além da forma questionável, as motivações de tal política, importada da pauta conservadora americana, variam do equívoco ao delírio paranoico. No discurso bolsonarista, as armas particulares seriam proteção tanto contra bandidos, o que já faz pouco sentido, quanto contra alguma ofensiva ditatorial, presumivelmente comunista.

Como já mostraram pesquisas do Datafolha, tais ideias contam com apoio minoritário na sociedade brasileira. Em maio, 71% dos entrevistaram disseram discordar da ampliação do acesso a armas, com a qual concordaram 28%.

O mínimo que se espera é que a discussão seja travada às claras, na arena legislativa, com dados e argumentos. A providência mais imediata, a cargo do Supremo Tribunal Federal, é deliberar sobre a legalidade de decretos de Bolsonaro.

O julgamento está suspenso desde setembro de 2021 por um pedido de vista do ministro Kassio Nunes Marques —indicado à corte pelo atual ocupante do Planalto.

editoriais@grupofolha.com.br

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