Clamor por intervenção militar é semelhante ao de 1964, diz general da reserva

General Heleno, ex-comandante no Haiti, porém, afirma que Forças Armadas repudiam a ideia

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Isabel Fleck
São Paulo

O general da reserva Augusto Heleno, 70, que foi o primeiro comandante das tropas da ONU no Haiti, diz ver semelhanças entre os atuais pedidos de intervenção militar e o período anterior ao golpe de 1964.

O militar, que já declarou apoio ao pré-candidato Jair Bolsonaro (PSL), contudo, afirma que as Forças Armadas estão “vacinadas” e não pretendem tomar o poder. 

"É lógico que as Forças Armadas se sentem 'lisonjeadas' pela credibilidade que essas faixas demonstram, mas têm plena consciência de que esse não é o caminho. O caminho são as eleições que vão acontecer", disse o general, em entrevista à Folha

O general Augusto Heleno (à esq.), durante cerimônia de transmissão de comando, em 2011
O general Augusto Heleno (à esq.), durante cerimônia de transmissão de comando, em 2011 - Sergio Lima - 9.mai.2011/Folhapress

 

Como o sr. vê os pedidos de intervenção militar presentes nos protestos dos caminhoneiros?  

Não são só os caminhoneiros. Há um crescimento exponencial desse tipo de manifestação. Não é igual a 64, mas é semelhante, guardadas as enormes diferenças e devidas proporções.

A semelhança é esse clamor popular pela intervenção militar. É um sentimento que vai crescendo na população que enxerga nos militares a solução para o problema nacional. Mas as Forças Armadas estão vacinadas, não pretendem isso, não buscam isso e de maneira nenhuma trabalham para isso.

Quais são as diferenças? 

Há uma outra formação. Os valores das Forças Armadas são os mesmos, mas há uma outra geração de militares, formada pela geração que viveu o período militar e colocou na cabeça dos atuais generais que esse não era o caminho. Que esse é um caminho esdrúxulo. Até tem previsto na Constituição uma intervenção no caso do caos, mas não é o pensamento nem o desejo dessa geração de militares. 

Por que o sr. considera que esses pedidos ganharam tanta força? 

Ainda que se faça uma força danada para denegrir tudo o que foi feito, a imagem que ficou daquela época [ditadura] é que era um país mais organizado, que a população tinha uma vida melhor. Não estou dizendo que fosse assim, mas essa é a imagem que muita gente tem.

Há uma espécie de conscientização de que os militares são capazes de colocar ordem na casa. Nós sabemos que isso é fruto de uma crise que o país está vivendo, depois de 13 anos de uma gestão desastrosa do dinheiro público. Mas é claro que não vai se repetir. A história dá muitos ensinamentos, mas dificilmente se repete. 

Como os militares devem responder a esse clamor? 

Eu não quero dar palpite, isso compete ao comandante. O general Villas Boas é um comandante com uma liderança extraordinária, tem enorme sensibilidade e eu tenho certeza que, se for necessário, ele vai colocar a posição do Exército em relação a isso.

Nas Forças Armadas, há quem defenda intervenção? 

Posso lhe garantir que os oficiais e generais da ativa afastam essa possibilidade, repudiam esse tipo de manifestação. É lógico que as Forças Armadas se sentem “lisonjeadas” pela credibilidade que essas faixas demonstram, mas têm plena consciência de que esse não é o caminho. O caminho são as eleições que vão acontecer.

O sr. considera que a paralisação dos caminhoneiros ainda tem legitimidade, mesmo após acordo com Temer? 

Eles procuraram fazer as reivindicações deles e também não causar maiores possibilidades de confronto.

É natural que o país se ressinta porque o prazo foi relativamente largo para esse tipo de abstenção de combustível, comida. E na situação que o país está vivendo, em crise há muito tempo e se encaminhando para uma eleição, é lógico que existe gente que está torcendo para que tudo dê errado. 

Há quem defenda que o Bolsonaro seria um dos interessados no caos.

Tenho certeza que não. Ele já fez alguns pronunciamentos convidando a ter prudência e comedimento, a acatar as ordens, a apoiar a atuação das forças legais. 

Erramos: o texto foi alterado

Diferentemente do informado em versão anterior deste texto, o partido do pré-candidato Jair Bolsonaro é o PSL, e não o PFL.

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