51ª fase da Operação Lava Jato aponta pagamento de R$ 200 milhões em propina

Dinheiro teria sido pago para direcionar contrato da Petrobras à Odebrecht

Géssica Brandino Ana Luiza Albuquerque
São Paulo e Curitiba

A Polícia Federal deflagrou na manhã desta terça-feira (8) a 51ª fase da Operação Lava Jato, denominada Operação Dejà Vu, que apura crimes de corrupção e lavagem de dinheiro no contrato PAC-SMS, firmado em 2010 entre a área internacional da Petrobras e a Odebrecht para prestação de serviços de segurança, meio ambiente e saúde em nove países, além do Brasil. O valor do contrato foi de mais de 825 milhões de dólares (cerca de R$ 2,7 bilhões).

Segundo a Procuradoria, o repasse de propina superou 56,5 milhões de dólares, equivalentes a R$ 200 milhões, e se estendeu de 2010 a 2012. A propina, de acordo com a acusação, foi recebida por executivos da estatal e agentes que se apresentavam como intermediários do MDB.

O contrato investigado na nova fase é o mesmo que a Odebrecht disse ter negociado com o presidente Michel Temer (MDB) em 2010 em troca de propina, conforme revelou a Folha

Os pagamentos teriam sido realizados por meio do Setor de Operações Estruturadas da Odebrecht (conhecido como o setor de propinas), de operadores financeiros e de doleiros, especialistas em lavagem de dinheiro. Além do pagamento em espécie, foram utilizadas offshores para o recebimento dos valores.

As investigações identificaram repasses de cerca de 25 milhões de dólares para os ex-executivos da Petrobras e de cerca de 31 milhões de dólares para os agentes intermediários do MDB. 

 

Em delação, o ex-diretor da Odebrecht Rogério Santos Araújo disse que também foi procurado pelo operador João Augusto Henriques, já condenado, com solicitações de pagamento de vantagens indevida ao PT e MDB. Segundo ele, foram pagos 8 milhões de dólares (cerca de R$ 28,4 milhões) ao PT por meio do ex-tesoureiro João Vaccari Neto. 

"Há provas, em cognição sumária, de que vantagens indevidas foram também pagas pela Odebrecht a agentes ou partidos políticos do PMDB e do PT, especificamente Eduardo Cosentino da Cunha, Henrique Eduardo Alves e João Vaccari Neto, com intermediação de João Augusto Rezende Henriques e Ângelo Tadeu Lauria", escreveu Moro em despacho que autorizou os mandados cumpridos pela PF. 

Movimentação na porta da Polícia Federal de Curitiba
Movimentação na porta da Polícia Federal de Curitiba - Eduardo Anizelli - 6.abr.2018/Folhapress

MANDADOS

A operação desta terça buscou cumprir 17 mandados de busca e apreensão, quatro mandados de prisão preventiva e dois mandados de prisão temporária nos estados do Rio de Janeiro, Espírito Santo e São Paulo.

Todos os mandados foram cumpridos, com exceção da prisão preventiva do operador Mario Miranda, que está em Portugal.

Os outros alvos da prisão preventiva foram Aluísio Teles e Ulisses Sobral, ex-executivos da área Internacional da Petrobras, e Rodrigo Pinaud, contratado pela estatal para auxiliar no processo de licitação do PAC-SMS.

Os alvos dos mandados de prisão temporária foram os operadores Sérgio Boccaletti e Angelo Lauria, que se identificava como intermediário do MDB. 

ESQUEMA

Segundo a Procuradoria, executivos da Odebrecht foram procurados por Aluisio Teles, da área internacional da Petrobras, que perguntou se a empreiteira teria interesse no contrato SMS. Nesse momento, já teria sido prometida propina de 3% do contrato para a "casa", representada por Teles, Ulisses Sobral e Rodrigo Pinaud, todos funcionários da estatal. 

De acordo com o MPF (Ministério Público Federal), os ex-executivos funcionaram como um pequeno comitê, direcionando e inflando o preço do contrato, amparados pelo ex-diretor da área internacional, Jorge Zelada.

O pagamento de 24 milhões de dólares ocorreu por meio de transferências em contas no exterior e sua distribuição foi feita em camadas, de forma a dificultar o rastreamento. 

O operador Mario Miranda, segundo o MPF, recepcionou os 24 milhões de dólares em sua offshore, repassando 11,5 milhões para Teles. Teles, por sua vez, distribuiu 3,9 milhões para Ulisses que, por fim, repassou 750 mil dólares para Pinaud. 

O operador Boccaletti, de acordo com a Procuradoria, também repassou valores para Teles. Ele teria distribuído 1,2 milhão de dólares, sob a justificativa de que estaria comprando três obras de arte. 

Já os mais de 30 milhões de dólares repassados aos políticos foram entregues tanto em espécie, no Brasil, quanto em contas no exterior. De acordo com a Procuradoria, os repasses foram confirmados por planilhas do setor de propina da Odebrecht e mensagens trocadas entre os envolvidos. 

De acordo com o MPF, um doleiro fiel da empreiteira repassava os valores para Lauria, que teria como função entregar a quantia a políticos do MDB. Para dificultar o rastreamento, a empresa teria colocado mais um agente no fluxo de repasses: o advogado Rodrigo Tacla Duran, já denunciado pela Procuradoria e foragido na Espanha. 

No sistema de contabilidade da Odebrecht, Teles era identificado como o "Acelerado", enquanto Lauria aparecia como "Meia branca" e "Voz". 

Miranda, Teles, Sobral e Boccaletti tiveram, juntos, cerca de 20 milhões de dólares bloqueados em contas na Suíça. 

INÍCIO

A 51ª fase da Lava Jato teve início a partir de três eixos. Teles, Sobral e Pinaud já haviam sido condenados pela Justiça Estadual do Rio de Janeiro por fraude à licitação, relacionada ao contrato PAC-SMS. As provas destes autos foram remetidas para a Procuradoria-Geral da República, que encaminhou o conteúdo para a força-tarefa em Curitiba.

O segundo eixo foi a cooperação internacional, com envio de investigações das autoridades suíças. O terceiro partiu do acordo de leniência firmado pela Odebrecht, que entregou informações sobre os pagamentos. 

A Procuradoria afirma que as investigações continuam e que o objetivo é recuperar integralmente os valores. O contexto em que foram oferecidas as vantagens, em 2010, colocam a hipótese de que o direcionamento do contrato esteve relacionado à busca de dinheiro para o financiamento de campanhas.

O MPF também diz que Miranda e Boccaletti foram sócios em duas empresas e receberam quantias milionárias de empreiteiras e outras empresas investigadas na Lava Jato, o que pode gerar novos desdobramentos. 

OUTRO LADO

Procurada, a defesa de Mario Miranda disse que não vai se manifestar sobre a operação desta terça. Já a defesa de Eduardo Cunha contestou as informações do delator. "Trata-se de uma afirmação absurda, um verdadeiro embuste. A defesa desafia que esse delator prove suas levianas afirmações", disse.

A reportagem ainda não conseguiu contato com os demais citados. 

 

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