Descrição de chapéu Eleições 2018

Quase-vice de Bolsonaro, príncipe diz que 1889 foi o verdadeiro golpe militar

Luiz Philippe de Orleans e Bragança era um dos cotados para a chapa do PSL

Anna Virginia Balloussier
São Paulo

Golpe mesmo não foi 1964 ou 2016, como a esquerda gosta de dizer. Em 1889, aí sim, cabe usar o termo sem medo de cometer incorreções históricas, diz Luiz Philippe de Orleans e Bragança, trineto da Princesa Isabel, tetraneto do Pedro 2º, pentaneto do 1º e hexaneto de dom João 6º.

“É quando você tem o golpe da República. Foi um retrocesso, aí você tem a ditadura militar”, afirma sobre os primeiros anos do Brasil pós-regime monárquico, sob tutela primeiro do generalíssimo Deodoro da Fonseca, depois do marechal Floriano Peixoto.

O príncipe Luiz Philippe de Orleans e Bragança no hall de seu prédio, em São Paulo
O príncipe Luiz Philippe de Orleans e Bragança no hall de seu prédio, em São Paulo - Gabriel Cabral/Folhapress

Por uns dias, Luiz Philippe virou o “plano b” de outro egresso da carreira militar, Jair Bolsonaro —ou o “plano p”, de “príncipe”, como brincou um aliado do candidato à presidência da República, essa instituição vista com ressalvas pelo membro da família real.

O presidenciável precisava escolher um vice, e outros nomes cogitados não foram para a frente. Caso do pastor Magno Malta, do astronauta Marcos Pontes, do general Augusto Heleno e da jurista Janaina Paschoal.

O príncipe começou a crescer na bolsa de apostas, mas Bolsonaro acabou optando por um militar tal qual ele, o general Antonio Hamilton Mourão. Uma escolha natural, pois os colegas de farda se conheciam há mais tempo, enquanto eles tiveram poucas oportunidades de trocar ideias, diz o preterido.

A simpatia em torno de Luiz Philippe, que vai tentar uma vaga na Câmara dos Deputados pelo PSL de Bolsonaro, se deu em grande parte porque:

1) Credenciais conservadoras ele, que liderou um movimento pelo impeachment de Dilma Rousseff (PT), sem dúvida tinha; 

2) Seria um bom contraponto ao estilo espoleta de Bolsonaro. Enquanto o deputado polemiza com frases como “se o filho começa a ficar assim, meio gayzinho, leva um couro e muda o comportamento dele”, o príncipe é um “lord”. “Meu autêntico é ser formal pra c...”, ele afirma à Folha sem, desnecessário dizer, completar o palavrão.

“Até já recebi reclamações... ‘Luiz Philippe, você abre a boca e já te colocam como elite!”, brinca sobre o estilo formal de ser.

Mas ele é, oras, e de uma elite real. Só que é pelo ativismo político que este Orleans e Bragança vem se destacando. Lá pelo fim de 2014, ele ajudou a fundar o Acorda Brasil, um dos movimentos que tomaram as ruas para derrubar a petista Dilma (missão completa dois anos depois).

Um dos fatores que acordaram Luiz Philippe, segundo o próprio, foi a "burocracia petrificante" no país. Uma síntese desse seu pensamento está em seu "Por Que o Brasil É um País Atrasado?" (ed. Novo Conceito, 2017): "Um Estado totalitário buscará dominar todo o ecossistema político. Ele será limitado apenas pela eficácia do governo e da burocracia".

O viés de seu movimento, afirma, "é reformista, para reformar o Estado", que em sua opinião precisa meter menos o bedelho tanto na economia quanto na família brasileira.

Ele, afinal, "é um liberal, mas não um libertário". Ou seja, acredita num Estado mínimo, mas zela por valores conservadores, como o repúdio ao aborto ("é infanticídio"). "E o conservador preza pela não intervenção do Estado na família."

Filho de militar, Luiz Philippe nunca foi de esquerda, mas também não era muito engajado. Por anos trabalhou e estudou fora: um mestrado em ciências políticas na Universidade Stanford, onde aprendeu que marxismo e nazismo eram "duas ideologias de esquerda", e depois passagens por dois bancos de investimentos (JP Morgan e Lázard Frere) e um cargo de direção na Time Warner.

Voltou ao Brasil e, em 2005, quis empreender. Gostava de motos desde que um tio lhe ensinou a pilotá-las, ainda na infância. Abriu, então, um negócio de motopeças.

Ele já se sentia "asfixiado" pelos entraves burocráticos em seu país natal. A gota d'água foi 2014, quando o governo Dilma Rousseff emplacou a narrativa de que a economia nacional ia bem, obrigada.

"Alguns falando que o Brasil vai crescer, e eu, pequeno empresário, falando 'não está tudo bem, tem uma alta inadimplência [em seu ramo]." Luiz Philippe viu de de longe "o sinal da recessão".​ Dito e feito. 

"Decidi agir", ele conta no saguão de seu prédio nos Jardins, bairro nobre de São Paulo. Passados dois anos, no entanto, acha que o ativismo está dando sinais de desgaste. "É perda de tempo e dinheiro."

Daí a guinada para a carreira partidária. O príncipe participou da fundação do Partido Novo, mas não lhe agradava a falta de um posicionamento mais forte sobre questões como o aborto. Pulou para o PSL.

Ele elogia a dobradinha presidente-vice que vingou em sua nova legenda, Bolsonaro-Mourão. Seria uma "chapa boa para romper com a narrativa" de que os militares são uma chaga nacional. Uma oportunidade de aplicar o "mote progressista de incluir minorias", diz, incluindo "militares e liberais" nesse pacote. 

O deputado Eduardo Bolsonaro, filho do presidenciável, diz à reportagem que o príncipe é um ótimo quadro, e, num eventual governo de seu pai, o Ministério das Relações Exteriores "estaria em excelentes mãos" se liderado por ele —uma decisão que, frisa, "cabe ao JB [Jair Bolsonaro]". 

1964: golpe ou revolução?

Luiz Philippe pensa um pouco ao ser questionado sobre um tema caro ao clã Bolsonaro, 1964: golpe ou revolução? 

"Engraçado: qual a ideia aqui, se houve golpe ou não, se foi ditadura ou não? Vai haver um amplo debate." O caso chileno lhe parece mais claro: Salvador Allende foi assassinado, e o general Augusto Pinochet "começa e termina como ditadura de uma pessoa só".

No Brasil, não. "Aqui houve o impeachment do Jango." E depois disso, continua, "um regime rotativo de presidentes militares". Para defensores do regime militar, João Goulart foi retirado do cargo de forma legítima, ao contrário do que dizem especialistas.

O que é indiscutível, segundo Luiz Philippe, é o valor da monarquia. Um país regido por apenas três poderes e com foco no presidencialismo, caso do nosso, não tem como dar certo.

"O regime monárquico é uma ótima pedida para a sociedade brasileira. Foi fundamental [no passado]. Não reconhecer é dar um tiro na sua própria cidadania." 

Em sua opinião, o Brasil perdeu uma bela oportunidade no plebiscito de 1993. Ele tinha feito 24 anos no mês em que os eleitores puderam escolher entre monarquia ou república e parlamentarismo ou presidencialismo. Venceram as segundas opções.

"A história é simples", diz Luiz Philippe. A Globo era a favor do sistema vigente e fez uma campanha pesada para que tudo continuasse como estava. "Colocou na Sessão da Tarde 'Sinhá Moça'", afirma —a reprise da novela de 1986 aconteceu, na verdade, no Vale a Pena Ver de Novo.

Para ele, a emissora foi bem-sucedida ao "falsamente vincular o sistema monárquico com a escravatura", tema do folhetim. "Foi a coisa mais covarde e desinformante que eu vi."

Um adendo que o príncipe faz por WhatsApp, no dia seguinte à entrevista: "Vale lembrar que meu pai renunciou aos meus direitos dinásticos antes de eu nascer. Portanto, não tenho qualquer legitimidade de ser rei se por um acaso esse tema ressurgir". Sua Majestade Imperial, nesse caso, seria um tio seu.

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