Descrição de chapéu Eleições 2018

Derrotado no PR, Requião diz que eleição foi despolitizada e defende voto em Haddad

Emedebista diz que voto em Bolsonaro foi motivado pela rejeição aos políticos tradicionais

Estelita Hass Carazzai
Curitiba

Derrotado nas urnas depois de passar quase 30 anos seguidos em cargos eletivos, o senador Roberto Requião (MDB), ex-governador do Paraná e um dos principais opositores do governo de Michel Temer no Congresso, afirmou em entrevista à Folha que essa foi uma eleição despolitizada, do "bem contra o mal" e contaminada pela desesperança.

Para ele, que ficou em terceiro lugar na disputa para o Senado, com 15% dos votos, sua derrota se deve a erros nas pesquisas e a uma tentativa de colá-lo ao PT —que ele critica, ao mesmo tempo em que defende voto no presidenciável Fernando Haddad.

Requião diz que o voto em Jair Bolsonaro (PSL) foi motivado pela rejeição aos políticos tradicionais, provocada em parte pela Operação Lava Jato, mas o chama de "troglodita" e “preconceituoso”, além de um risco à democracia.

O senador de 77 anos também diz haver uma “guerra híbrida” do capital estrangeiro, através dos meios de comunicação e das redes sociais, contra o estado-nação, que acabou prejudicando candidatos como ele, e relativiza os benefícios da renovação do Congresso: “Depende de quem entrou”.

O senador paranaense Roberto Requião (MDB), durante entrevista à Folha em sua casa em Curitiba - Eduardo Matysiak / Divulgação


 
Houve uma renovação recorde no Congresso nestas eleições. Isso é bom para a política brasileira? Eu acho que é. Mas depende de quem entrou. Se tiram um ruim para pôr um péssimo, não é bom. Desapareceram os partidos políticos e surgiram candidatos alternativos. Aqui no Paraná, por exemplo, esse Oriovisto [Guimarães, eleito senador pelo Podemos], dono do grupo educacional Positivo. Não é meu inimigo, não. Mas afastado de tudo, de política, riquíssimo. É consequência da desmoralização da atividade política no país.

A que o sr. atribui sua derrota nas urnas? Todos os institutos me davam vitória com conforto. Como você pode explicar que o Ibope me dê 38% de intenção de voto pela manhã, e eu faça 15% dos votos à noite? Não me pergunte por quê; eu não sei. Foi uma onda, um movimento. E impulsionado por uma guerra híbrida, fundamentalmente pelo WhatsApp. Não só na minha campanha, mas de uma forma geral. Foi uma eleição despolitizada, uma eleição moral, do bem contra o mal. Ficou a imagem de que todo político é ladrão.

O sr. não considera que pode ter havido uma reprovação à sua atuação política? Sua votação caiu de quase 2,7 milhões de votos para 1,5 milhão, entre 2010 e 2018. Foi a ligação com o PT. "Requião é o PT". Eu fiz oposição ao PT no Senado. Eu estou do lado do Brasil. Nunca engoli a política econômica do [Henrique] Meirelles e do [Joaquim] Levy [ex-ministros da Fazenda dos governos petistas].

Mas conseguiram fazer essa vinculação. Eu tive boa aprovação no governo do estado. Em todas as pesquisas de opinião, eu era o senador, proporcionalmente, que seria o mais votado do país. Eu acho que foi a vinculação ao PT e o voto útil. O Requião está eleito: votem nos outros, para tirar o [ex-governador] Beto Richa [que estava em segundo lugar nas pesquisas, e acabou em sexto]. 

O sr. foi contra o impeachment de Dilma Rousseff, criticou a condenação do ex-presidente Lula. Isso não lhe custou votos? Claro que custou votos. Mas não me arrependo. A minha posição é essa. Eu faria de novo tudo o que eu fiz nessa campanha, ganhando ou perdendo. É evidente que os marqueteiros me diziam: abandone isso, abandone o PT. Mas então o que eu estou fazendo na política? Não é um brinquedo, um jogo de tabuleiro. Nós estamos tentando formar opinião, construir um país.

O sr. acha que a Operação Lava Jato teve influência no cenário eleitoral? Teve. Eu saudei o início da Lava Jato. Mas o que eu acho é que a busca passou a ser seletiva. Eles foram capturados. Não acho que o Sergio Moro seja agente da CIA. Mas ele se deslumbrou com os Estados Unidos. Passou a ser convidado para palestras em universidades americanas, botavam lá milhares de alunos... Ele foi capturado pela vaidade. Da mesma forma que algumas lideranças do PT foram capturadas pela vaidade e se colocaram numa posição completamente contrária às posições iniciais do partido.

Mas a Lava Jato não é só o Sergio Moro. Há dezenas de policiais, procuradores, servidores concursados na investigação. O [Deltan] Dallagnol [procurador da Lava Jato] é um fundamentalista. Essa história da corrupção, sem uma visão holística da sociedade, é uma loucura. A Lava Jato abriu a caixa-preta da corrupção no Brasil, mas depois passou a ser dirigida, no sentido de dar uma cobertura para o liberalismo econômico de interesse geopolítico dos EUA e dos países mais desenvolvidos. 

O sr. diria que ela foi instrumentalizada? Foi instrumentalizada, sim. Com o apoio da imprensa, com a captura da vaidade, com as benesses e os elogios feitos aos seus membros. Claro que a Lava Jato é seletiva. Pegaram o [Eduardo] Cunha [do PMDB]. Mas deram cobertura à visão liberal, ao fim do estado-nação. Desmoralizou a classe política, desmoralizou a Petrobras, deu cobertura à tentativa de venda da Eletrobras. O combate à corrupção deve ser contínuo e é necessário. Ladrão tem que ir para a cadeia e político tem que ser investigado. Mas é evidente que a Lava Jato deu cobertura a isso.

O brasileiro identificou a corrupção como o principal problema do país, segundo o Datafolha. O sr. concorda? Esta é a narrativa da mídia. Do teu jornal, da Globo. É a consequência do monopólio da comunicação. É uma narrativa: o Brasil não precisa ser nação, mas sim acabar com a corrupção. E aí se entrega o patrimônio nacional. É uma guerra híbrida: uma extensão da grande guerra pelo domínio do petróleo, do subsolo, mas agora por outros meios. 

O que o sr. quer dizer com guerra híbrida? É a guerra que utiliza meios de comunicação. É o domínio da imprensa, da televisão, da internet. Veja o meu Twitter: tinha a adesão de 4.000 a 5.000 pessoas por semana. Entrou no processo eleitoral, caiu para 200. Por quê? Algoritmo, né? É uma guerra do capital financeiro internacional, da globalização, contra a visão nacional. 

Isso não soa como uma teoria da conspiração? Isso não é de domínio público ainda. Mas é algo que vai longe. Financiar candidatos de direita, entreguistas, que não acreditam no país, por exemplo. É uma forma. 

O sr. falou em desmoralização da atividade política. Quais são os efeitos disso? Eu me preocupo. O Bolsonaro, o que ele é? Fascista? Não. É mais nazista, preconceituoso. É um sujeito primário, um troglodita. O programa do PT de hoje [que associa a candidatura de Bolsonaro à tortura no regime militar] está bom. É o melhor que fizeram. O Bolsonaro é isso. Ele era absolutamente insignificante no Congresso.

Ele só aparecia brigando com uma deputada aqui, uma senadora ali. Uma coisa pobre, medíocre, pequena. Briga de lavadeira. 

O Bolsonaro não tem voto: o que tem voto é o ‘contra tudo isso que está aí’. O que tem voto é a desesperança. Da mesma forma como o Hitler subiu na Alemanha. Ninguém acredita em mais nada. É uma onda. Mas eu não atribuo tudo isso ao Bolsonaro. Eu atribuo isso ao desencanto com a política fabricado pela narrativa da imprensa, e pela culpa de muita gente. É claro que esse pessoal se perdeu na corrupção, no aparelhamento do Estado. 

Nesse caso, os políticos não estão pagando o preço pelos seus próprios erros? A classe política está pagando. Mas quem é que está vindo no lugar? Bolsonaro? Oriovisto? Qual é a opinião sobre o Brasil, sobre a economia, sobre os direitos sociais que um desses caras deu durante sua vida?
 
Se os brasileiros estão votando nesses candidatos, não é por que acreditam no que eles pregam ou representam? Não. É o bem contra o mal. É o [candidato] que vai combater a corrupção. Não é o ideário. 

Por que o sr. apoia Fernando Haddad? Não sou um petista fanático. Mas não sou idiota. Eu estou apoiando o Brasil com o Fernando Haddad. A proposta do PT não é meu ideal nacional-desenvolvimentista. O Haddad é um uspiano, trabalha no Insper. Agora, é um bom sujeito. É um cara sério. Não é votar no Haddad: hoje, é votar contra o autoritarismo.

O Bolsonaro hoje representa um risco à democracia? Sem sombra de dúvidas. O Bolsonaro é um risco à sua vizinhança, não só à democracia. 
 

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