Descrição de chapéu Eleições 2018

Dirigentes de empresas fazem doações e ajudam a eleger 53 parlamentares

Contribuições ocorrem após lei ter vetado participação de empresas; para STF, doação foi 'mascarada'

Ranier Bragon Camila Mattoso
Brasília

A análise da prestação das campanhas mostra que dirigentes de empresas participaram do processo eleitoral por meio de doações feitas em bloco.

A Folha identificou ao menos 40 companhias que têm mais de um executivo financiando partidos ou candidatos. 

Os representantes dessas empresas ajudaram a eleger 53 congressistas, gastando R$ 42 milhões.

A lista inclui nomes como grupo Votorantim, Grendene, Dasa, Rede D’Or, Grupo Jereissati, MRV, Cosan, Riachuelo, Localiza e Península.

Em 2015, o Supremo Tribunal Federal decidiu vetar o financiamento empresarial sob o argumento de que a prática desequilibra a disputa e representa a captura da política pelo poderio econômico. 

Apesar de os valores terem caído de 2014 para 2018, o balanço até agora mostra que a maior parte do financiamento privado das campanhas segue vindo do bolso de empresários ou de candidatos ricos, em doações como pessoa física.

O sistema da Justiça Eleitoral registrava até a última quinta (11) mais de 145 mil doações de pessoas físicas.

Do valor total de R$ 407 milhões, 55% eram relativos a repasses individuais acima de R$ 10 mil, na quase totalidade vindos de empresários.

Cosan, MRV, Adami S/A, Votorantim e Riachuelo, por exemplo, têm, cada uma, de quatro a cinco acionistas ou dirigentes na lista dos maiores doadores desta eleição.

Gigante do setor de energia e combustível, a Cosan tem doações registradas do presidente do Conselho de Administração, Rubens Ometto Silveira Mello, do diretor-presidente, de dois conselheiros e do presidente da Raizen, empresa do grupo.

Juntos, repassaram R$ 7,5 milhões a PSDB, MDB, PTB e PP, além de mais de 50 candidatos de diversas siglas, incluindo o PT.

Eles foram os mais bem-sucedidos no apoio que deram na disputa por vaga ao Congresso: ajudaram a eleger 17 parlamentares, entre deputados e senadores.

Em 2014, empresas como a JBS e a Odebrecht fizeram doações pulverizadas a diversos políticos, inclusive rivais na corrida presidencial. 

A MRV tem do cofundador a diretores regionais como apoiadores de candidatos. Ao todo, doaram até agora R$ 3,4 milhões para DEM, PP e outros 20 candidatos, incluindo os rivais PSDB e PT. 

A Riachuelo, de Flávio Rocha, —que tentou se lançar candidato à Presidência pelo PRB-- também tem quatro financiadores de políticos.

O patriarca, Nevaldo, e os filhos Flávio, Elvio e Lisiane injetaram R$ 8,6 milhões até agora para o Novo e a mais de 20 candidatos.

O empresário Abilio Diniz —ex-executivo do Pão de Açúcar e com participações no Carrefour e BRF— e seu filho João Paulo Diniz, ambos da empresa de investimentos Península, já repassaram R$ 1,4 milhão a candidatos.

“Era um segredo de polichinelo, era óbvio que haveria esse intercâmbio e tudo continuaria igual”, disse o ministro do STF Gilmar Mendes.

Questionado sobre a possibilidade de o STF ter barrado doações de executivos, Gilmar disse que “se o tribunal tivesse avançado nisso seria uma discriminação”.

“O grande problema é estar mascarando uma doação de pessoa jurídica, da empresa. O Supremo bateu o martelo entendendo inconstitucional a atuação [da empresa]”, disse o ministro Marco Aurélio Mello, também do STF. 

Segundo ele, a Justiça Eleitoral poderá analisar, caso a caso, suspeitas de burla à decisão de 2015.

Em 2014, ano das últimas eleições com doações empresariais, o gasto declarado pelos candidatos ficou em torno de R$ 5 bilhões (R$ 6,4 bilhões em valores de hoje). Desse total, cerca de R$ 3 bilhões (R$ 3,8 bilhões hoje) vieram de empresas.

Na atual eleição, o financiamento privado está até agora em R$ 764 milhões. O restante do dinheiro das campanhas é público, cerca de R$ 2,7 bilhões.

Em reportagem no mês passado, a Folha mostrou que a maioria dos campeões do financiamento em 2014 afirmaram proibir ou desaconselhar seus executivos a fazer doações, entre elas a JBS e a OAS.

Os empresários que lideram o ranking de doadores na atual eleição afirmam que o financiamento, mesmo em bloco, tem sido feito em caráter pessoal e ideológico, desvinculado das empresas e de seus interesses.

“Quero fazer a minha parte, ajudar bons candidatos, honestos, ficha limpa, sou um doador de campanha histórico”, diz o presidente da Localiza, José Salim Mattar Júnior.

A Rede D’Or São Luiz afirmou que “respeita a legislação e o direito de seus colaboradores participarem do processo político” e que as “doações citadas foram em caráter estritamente pessoal”.

Abilio Diniz e seu filho João Paulo também afirmaram que as doações foram em caráter individual, dentro das regras, e contemplam candidatos de 10 partidos diferentes.

A Votorantim disse que o financiamento feito por acionistas e por um conselheiro independente de uma de suas empresas foram “decisões de foro íntimo e não têm qualquer relação com a empresa”.

“A família Rocha acredita que deve participar do processo eleitoral e fortalecer a democracia brasileira. Nesse sentido, já realizou doações em outras eleições. Nas eleições de 2018, Nevaldo, Lisiane, Elvio e Flávio Rocha realizam doações a candidatos afinados com a perspectiva da renovação. E também a partidos políticos”, afirmou, em nota, a família dona da Riachuelo.

A Grendene afirmou que Alexandre Grendene e Pedro Grendene não fazem parte do quadro de executivos da empresa desde 2013 e que não tem informações ou conhecimento sobre as atividades privadas de seus acionistas e conselheiros. Os dois são, respectivamente, presidente e vice-presidente do Conselho de Administração, órgão que dá a palavra final em relação à gestão da empresa.

A Dasa disse que as doações feitas pelos empresários não têm relação entre si e que não representam ação em conjunto já que foram feitas individualmente para diferentes partidos, diretórios e candidatos.

Os executivos da Cosan também afirmaram que as doações ocorreram em caráter pessoal e seguiram as regras.

Presidente da Raizen (empresa do grupo), Luis Guimarães disse que suas doações foram feitas sem nenhuma vinculação a sua atividade profissional ou empresarial “e sim por acreditar que estes indivíduos possuem propostas e histórico de vida que caso eleitos irão contribuir para reformas estruturais necessárias, trabalharão para redução do estado e melhoria da efetividade das necessárias ações sociais”.

Ele afirmou conhecer o trabalho e as propostas de todos. “As doações são minha contribuição para a democracia no Brasil.”

A empresa Ânima afirmou que "é uma instituição apartidária, que cumpre integralmente a legislação, não tendo realizado doação a qualquer candidato, nem agora e nem no passado. Respeitamos a pluralidade de ideias e o direito individual de livre expressão e manifestação, garantido constitucionalmente a todos”. 

​O Grupo Jereissati, o Grupo Rezek, a MRV, a Adami e a Horita não se manifestaram.

Colaborou Reynaldo Turollo Jr.

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