Descrição de chapéu Eleições 2018

Facada foi decisiva para Bolsonaro, diz marqueteiro do PSDB

Para Lula Guimarães, ataque atingiu mais Alckmin do que o deputado e interrompeu possibilidade de desconstrução

Rogério Gentile
São Paulo

Responsável pelo marketing da campanha de Geraldo Alckmin (PSDB), o jornalista Lula Guimarães, 51, afirma que o atentado à vida do deputado Jair Bolsonaro (PSL) foi o fator decisivo que o colocou no segundo turno.

“A facada atingiu mais o Alckmin do que o Bolsonaro”, diz. “Interrompeu a possibilidade de mostrar quem Bolsonaro é realmente.”

Segundo o jornalista, a forte presença nas redes sociais foram importantes para o candidato do PSL, mas a cobertura jornalística do atentado o ajudou muito mais. “Somente na Globo teve mais de três horas de exposição”, diz. “Nenhum candidato teve isso.”

Sobre os erros do PSDB, Guimarães diz que o partido não fez a autocrítica que cobrou do PT, citando as acusações envolvendo Aécio Neves e outros líderes tucanos.

Lula Guimarães, marqueteiro do ex-presidenciável e atual presidente nacional do PSDB, Geraldo Alckmin, durante entrevista à Folha
Lula Guimarães, marqueteiro do ex-presidenciável e atual presidente nacional do PSDB, Geraldo Alckmin, durante entrevista à Folha - Eduardo Anizelli - 11.out.2018/Folhapress

 

Bolsonaro obteve uma votação impressionante sem ter tempo no horário eleitoral e com uma campanha focada nas redes sociais. O marketing político como conhecemos morreu? Acho que não. Imagine se o Bolsonaro tivesse dois minutos de televisão no horário eleitoral. Provavelmente venceria no primeiro turno. Teria feito diferença. O Haddad teve a candidatura lançada pouquíssimas semanas antes da votação. Se não fosse a televisão, não teria crescido como cresceu. As redes sociais não bastariam.

O atentado foi decisivo? Foi decisivo para o resultado do Bolsonaro. O colocou no segundo turno. A facada atingiu mais o Geraldo Alckmin do que o Bolsonaro. Em pouquíssimos dias de campanha, a rejeição do Bolsonaro subiu bem. Ele também se expôs em dois debates, passando a imagem de completo despreparo. A facada interrompeu a desconstrução da sua imagem. Interrompeu essa possibilidade de mostrar quem ele é realmente. Numa campanha curtíssima, passou a ser poupado. Foram duas semanas perdidas.

E a cobertura do crime? Bolsonaro passou a ter um espaço enorme na televisão. Somente na Globo, por conta do atentado, teve mais de três horas de exposição. Nenhum candidato teve isso. Foi o maior tempo de TV disparado, o dobro dos outros. Uma mídia que tem muito mais credibilidade do que a propaganda. E mais, em um processo de vitimização. Era a luta de um homem pela vida. Então, não é verdade que Bolsonaro chegou ao segundo turno por conta da internet apenas, ainda que tenha conseguido uma exposição extraordinária nas redes sociais num trabalho que começou lá atrás. A TV, involuntariamente, o ajudou muito.

De qualquer modo, Alckmin teve um tempo enorme no horário eleitoral. A Folha se equivocou ao dizer que o Alckmin tinha um latifúndio de tempo na TV. Teve cinco minutos e meio. Dilma teve 11 minutos e meio em 2014. O tempo disponível para os candidatos na eleição passada era de 25 minutos, o dobro de agora. E a campanha era mais extensa, com 15 dias a mais.

Mesmo não sendo um latifúndio, Alckmin teve um tempo muito maior do que os outros. Você saiu de uma vitória em primeiro turno com João Doria dois anos atrás. E agora seu candidato teve um desempenho pífio. O que ocorreu? O marketing é apenas um dos fatores em uma campanha. Eleição é como um acidente aéreo, não há uma única causa. Alckmin é um moderado num momento em que o Brasil pede alguém com posição mais histriônica.

Além disso, há o fato de que o PSDB não fez a autocrítica que cobrou do PT. Aécio Neves e outros líderes estão envolvidos em escândalos, e o partido não se posicionou contra eles. O tamanho da derrota do PSDB no país é reflexo disso.

Houve ainda uma série de boatos disseminados na internet pelos adversários contra o Alckmin. Isso tudo se combina com um candidato e um partido sobre o qual recaem em São Paulo uma certa fadiga de material. Há sempre um assunto que comanda a eleição, mais do que as ferramentas. O momento social e econômico fala mais alto que a comunicação. Os marqueteiros influenciam, mas com limitação. E a pauta desta eleição é a mudança dos políticos.

Estava certo, então, FHC, do ponto de vista da comunicação, quando pensou no Luciano Huck, um nome novo? Luciano é um cara muito talentoso. É excelente comunicador e tem muitas qualidades, mas não conheço sua capacidade administrativa. É lamentável saber que as pessoas foram buscar o novo apenas pelo impacto da empatia que podia ter na comunicação. Sem se preocupar com o preparo administrativo, com o preparo técnico. Huck seria um ótimo produto eleitoral, mas estamos escolhendo o presidente da República e não um apresentador.

A eleição já acabou? Acho que não, há espaço para movimentação. A tendência é Bolsonaro vencer, mas a gente não sabe o que pode ocorrer até lá. Pode haver erros. Mudanças de posicionamento. Ou a sociedade pode simplesmente repensar. Mas impressiona a solidez dos votos dos dois, sobretudo do Bolsonaro.

Dá para comparar Bolsonaro com Trump? Relativamente, já que lá não ocorreu um atentado. Mas há comparação. As fake news são uma característica das duas campanhas. No caso da do Trump, identificadas depois. Aqui ainda não sabemos quem pagou ou quanto custou essa presença. Outra coisa que se assemelha é o fato de os dois serem muito autênticos. Quem tem essa presença autêntica se sobrepõe nas redes sociais.

 

Lula (Luiz Flavio) Guimarães
Jornalista formado pela PUC-SP com mais de 25 anos de experiência em eleições. Coordenou a propaganda da campanha presidencial de Eduardo Campos e Marina Silva, em 2014, e a da campanha do ex-prefeito João Doria, em 2016.

 
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