Descrição de chapéu The Washington Post Eleições 2018

Fake news? Há um aplicativo para isso

WhatsApp está combatendo a desinformação, mas o próprio aplicativo é seu maior inimigo

Washington Post

Na guerra contra a desinformação que corre solta em sua plataforma, o Facebook tem uma vantagem: a empresa consegue enxergar as falsidades. A mesma coisa não ocorre com o WhatsApp, software de bate-papo pertencente ao Facebook em que as mensagens são encriptadas de ponta a ponta –e com o qual missivas políticas promovendo teorias conspiratórias estão se espalhando entre usuários brasileiros antes do segundo turno da eleição presidencial do país, no domingo.

Logo do aplicativo de mensagens WhatsApp em tela de smartphone
Logo do aplicativo de mensagens WhatsApp em tela de smartphone - Thomas White/Reuters

O WhatsApp é tremendamente popular no Brasil. E está repleto de mentiras. Na semana passada a Folha de S. Paulo noticiou que empresas pagaram milhões de dólares por pacotes de mensagens para inundar eleitores em propaganda política favorável ao candidato de extrema direita Jair Bolsonaro.

Pesquisadores que analisaram as 50 imagens mais compartilhadas em grupos brasileiros do WhatsApp abertos ao público descobriram que mais de metade eram enganosas ou falsas. Algumas mensagens difamavam o adversário de Bolsonaro, tachando-o de comunista. Também Bolsonaro foi difamado por fake news, como a acusação de que ele teria encenado seu esfaqueamento em um comício.

O WhatsApp está combatendo a desinformação, mas sob muitos aspectos o próprio aplicativo é seu maior inimigo. O WhatsApp se promove como uma plataforma para conversas particulares, conferindo mesmo a seus maiores grupos uma intimidade que leva os usuários a acreditar naquilo que leem.

Contudo, como os grupos podem conter até 256 pessoas, e como os usuários podem individualmente transmitir mensagens a 256 contatos de uma vez, os mal-intencionados podem alcançar milhares de pessoas com apenas alguns toques em uma tela de celular. A encriptação de ponta a ponta não permite que ninguém, mesmo os funcionários do WhatsApp, veja quais mensagens vão para mais longe e em menos tempo.

Há ainda outro fator complicador: muitos planos de telefonia celular no Brasil permitem acesso à internet apenas para o uso do Facebook e WhatsApp, de modo que os usuários podem ter dificuldade em consultar sites de jornalismo para checar ou esclarecer notícias de confiabilidade suspeita.

Pesquisadores já sugeriram soluções remediais para salvar a integridade da eleição deste domingo, entre elas reduzir ainda mais o número de vezes que uma mensagem pode ser encaminhada.

Foi o que o WhatsApp fez na Índia depois de rumores inflamadores difundidos no aplicativo levarem a linchamentos durante o verão. Além disso, a empresa limitou o número de contatos com que um usuário pode se comunicar ao mesmo tempo. Os pesquisadores também querem que o WhatsApp restrinja temporariamente o tamanho dos grupos novos formados no Brasil.

Mas a introdução dessas medidas tão pouco tempo antes da eleição pode acabar atrapalhando os esforços para desacreditar as fake news, na medida em que a desinformação continua a se alastrar rapidamente.

Uma revisão mundial do WhatsApp que reduzisse o alcance da atuação dos usuários ou desencriptasse os grupos que superam determinadas dimensões também traria desvantagens: se o WhatsApp abandonar as características que o definem, outra empresa pode ocupar seu lugar.

E, em países repressivos, o WhatsApp pode proporcionar à sociedade civil a capacidade de se organizar, um espaço onde o governo não consegue identificar e calar a dissensão.

O WhatsApp precisa reconhecer que é muito mais que apenas a plataforma de troca de mensagens particulares que seus executivos promovem. É uma plataforma de publicação, assim como sua empresa-mãe e as pares do Facebook. Isso significa assumir responsabilidade pela desinformação e violência que ele facilita. Não existe resposta fácil. Mas talvez haja uma resposta difícil, e o WhatsApp precisa procurá-la.

Tradução de Clara Allain

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