Para membros do Supremo, religião deles é irrelevante para atividade de ministro

Sete ministros do STF são católicos, dois, judeus, e dois não informaram se professam religião

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Brasília

A religião de um ministro do Supremo Tribunal Federal é irrelevante para as atividades que desempenha, consideram integrantes da corte. A questão veio à tona na sexta-feira (31), quando o presidente Jair Bolsonaro (PSL) perguntou se não está na hora de termos um evangélico como ministro do STF.

“Existe algum entre os 11 ministros do STF evangélico, cristão?”, indagou Bolsonaro em um evento da igreja Assembleia de Deus, ao comentar criticamente o julgamento, em curso, de dois processos que discutem a criminalização da homofobia.

O Supremo tem maioria católica (ao menos sete ministros), dois judeus e nenhum evangélico.

“Em uma República laica é absolutamente irrelevante a fé religiosa que um juiz da suprema corte possa ter, pois, nesse domínio, há de prevalecer, sempre, um comportamento de absoluta neutralidade dos magistrados em assuntos de ordem confessional”, afirmou à Folha o decano do tribunal, ministro Celso de Mello, que não declarou se professa religião e qual seria essa.

A indicação de ministros do Supremo é uma atribuição do presidente da República, que depois precisa ser aprovada pelo Senado. Até o final de seu mandato, Bolsonaro poderá indicar ao menos dois deles.

O primeiro ministro do Supremo que deve deixar a corte é o decano Celso de Mello, que completa 75 anos (a idade de aposentadoria obrigatória) em novembro de 2020. A segunda vaga no STF deve ficar disponível com a aposentadoria de Marco Aurélio Mello, em julho de 2021.

Bolsonaro chegou a dizer que a primeira vaga estava reservada para o ministro Sergio Moro (Justiça), ex-juiz da Lava Jato. Depois, negou já haver um acordo sobre isso. A assessoria da pasta da Justiça informou que o ministro é católico.

O presidente do STF, Dias Toffoli, e os ministros Marco Aurélio, Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia, Edson Fachin e Alexandre de Moraes são católicos.

O ministro Luiz Fux é judeu, e Luís Roberto Barroso é reconhecido como judeu pela comunidade judaica por ser filho de mãe judia e pai católico. A ministra Rosa Weber não se manifestou.

“Cresci indo a sinagogas e a igrejas e me sinto bem nos dois ambientes. Sou espiritualizado, medito algumas vezes por dia, mas não sou religioso em sentido formal. Tenho uma religião feita por mim mesmo: tem Torá, Evangelhos, Buda, Aristóteles, Kant [filósofo que viveu de 1724 a 1804] e influência de textos de uma organização espiritual chamada Brahma Kumaris, de filosofia oriental”, disse Barroso.

“Minha fé racional é que a história é uma marcha contínua na direção do bem e do avanço civilizatório. Mesmo quando a gente não consegue ver da superfície, ela flui como um rio subterrâneo para onde deve seguir. Foi isso que nos trouxe dos tempos primitivos de aspereza e sacrifícios humanos, atravessou perseguições e despotismos, até chegarmos à era dos direitos humanos”, completou.

Barroso disse que não entra no debate sobre jurista evangélico. “O importante é o conhecimento e a integridade. Há juristas com essas características em todas as religiões ou mesmo sem religião. O Estado é laico. Porém uma das maiores juristas brasileiras por acaso é evangélica: a professora Ana Paula de Barcellos”, exemplificou.

Barcellos é professora de direito constitucional na Uerj (Universidade do Estado do Rio de Janeiro). Seu currículo no site da instituição aponta como principais temas de atuação direito constitucional, dignidade da pessoa humana, direitos fundamentais, direitos sociais, democracia e políticas públicas.

Autor de livros jurídicos, o ministro Alexandre de Moraes inclui o salmo “O Senhor é meu pastor, e nada me faltará...” em todas as edições de sua principal obra, "Direito Constitucional", publicada pela primeira vez em 1997.

“Acredito na religião do amor, aquela que nos conecta com Deus e nos faz seguir o maior ensinamento de Jesus: amai-vos uns aos outros como eu os amei”, disse Moraes à reportagem.

No evento evangélico em que falou da religião dos ministros do Supremo, Bolsonaro questionou se a corte não estaria “legislando” ao julgar processos que tratam da criminalização da homofobia. Sua manifestação foi seguida de uma forte salva de palmas.

O STF já tem maioria de seis votos para enquadrar condutas homofóbicas e transfóbicas na lei que tipifica os crimes de racismo. Os relatores dos processos sobre o tema são os ministros Celso de Mello e Fachin, que consideraram haver omissão do Congresso ao deixar de legislar para proteger as minorias LGBT.

Julgamentos recentes do Supremo têm apontado no sentido de garantir a plena liberdade religiosa. Em setembro de 2017, os ministros julgaram constitucional o ensino religioso nas escolas, mesmo que de caráter confessional (vinculado a uma religião específica), desde que a aula não seja obrigatória, como está expresso na Constituição.

Em março deste ano, a corte considerou constitucional uma lei do Rio Grande do Sul que deixa expressamente autorizado o abate de animais em cultos de religiões de matriz africana, como a umbanda e o candomblé.

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