Decisão de Toffoli tem efeito incerto sobre casos em andamento e na Lava Jato

Definição sobre paralisação em decorrência de medida a favor de Flávio Bolsonaro deve ser caso a caso

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São Paulo

Embora procuradores manifestem forte preocupação com as consequências da decisão do presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Dias Toffoli, de suspender inquéritos que se baseiam em relatórios do Coaf, há incerteza em relação aos efeitos do ato sobre grandes investigações em andamento, como as da Lava Jato. 

Nesta terça (16), Toffoli atendeu a pedido do senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) e barrou investigação sobre as movimentações financeiras do ex-assessor Fabrício Queiroz, baseada em dados do Conselho de Controle de Atividades Financeiras antes da obtenção de autorização judicial.

A suspensão de outros inquéritos e ações penais com base na decisão do ministro do STF precisará ser pedida pelas defesas caso a caso, sem repercussão automática.

O presidente do Supremo Tribunal Federal, Dias Toffoli
O presidente do Supremo Tribunal Federal, Dias Toffoli - Pedro Ladeira - 21.mar.19/Folhapress

É comum na Lava Jato do Paraná, por exemplo, que os relatórios do Coaf sejam anexados após a ordem judicial de quebra de sigilo, o que os deixaria fora da abrangência da decisão de Toffoli.

O Coaf é um órgão de inteligência, subordinado ao Ministério da Economia, que atua contra a lavagem de dinheiro. Ele recebe informações de instituições financeiras sobre operações consideradas atípicas, como transações de quantias significativas por meio de conta até então pouco movimentada ou mudança repentina e injustificada na forma de movimentação de recursos.

Para o professor de direito Gustavo Badaró, a Lava Jato tende a ser menos afetada pela medida por ter frentes de apuração com origens, por exemplo, em delações premiadas.

"Mas, no dia a dia, o Coaf faz centenas e centenas de relatórios de investigação fiscal. Isso vem sendo feito sem decisão judicial por causa da jurisprudência do Supremo. Todos esses casos ficam suspensos. Pode atingir um número muito grande de processos."

Para o advogado e professor de direito da USP Alamiro Velludo, para conseguir a suspensão as defesas precisarão mostrar que os relatórios de inteligência tiveram impacto no processo em andamento. "O relatório deve ser a condição na qual se sustenta a investigação. Se ela é sobre homicídio e há um relatório sobre movimentação financeira, não tem sentido suspender."

Também advogado e professor da USP, Pierpaolo Bottini tem entendimento parecido. "Se você tiver outras provas que permitam dar sequência na investigação, ocorre a suspensão só do uso da prova e todas aquelas dela derivada."

A decisão de Toffoli critica a inclusão sem autorização da Justiça de dados de inteligência que tragam mais do que "a identificação dos titulares das operações bancárias e dos montantes globais".

Nessa linha de raciocínio, os relatórios do Coaf não poderiam trazer detalhamento dos recursos movimentados, ainda que a atipicidade da operação sugira que tenha havido ilegalidade, sob o risco de caracterizar uma quebra de sigilo não autorizada. 

Essa tese foi defendida até pelo próprio presidente Jair Bolsonaro, em entrevista ao SBT em janeiro. "Falando aqui claro: quebraram o sigilo bancário dele [Queiroz] sem autorização judicial, cometeram um erro gravíssimo."

Para Velludo, há um dilema sobre o volume de informações que o órgão deve repassar. "Em operações de lavagem, é preciso ter rapidez na informação para que o Estado saiba. Mas, na outra ponta, há o cidadão com a garantia de seu sigilo bancário."

A deputada estadual Janaína Paschoal (PSL-SP), que é professora de direito, disse após a divulgação da decisão de Toffoli: "Dúvida de ordem técnico-jurídica: se, a partir da decisão do ministro Toffoli, o Coaf e a Receita não podem enviar indícios de crime ao Ministério Público Federal, o que deverão fazer com tais indícios?".

Ela disse que, "se entendeu bem" a ordem de Toffoli, "a decisão do ministro vai parar tudo". 

Erramos: o texto foi alterado

Versão inicial desta reportagem afirmou incorretamente que a relatoria do caso que envolve pedido do senador Flávio ​Bolsonaro (PSL-RJ) iria para a ministra Cármen Lúcia com o fim do recesso do Judiciário. Contudo, a responsabilidade continuará com o ministro Dias Toffoli. O texto foi corrigido.

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