Ações na Justiça tentam barrar posse de amigo do clã Bolsonaro no comando da PF

Base dos pedidos é acusação de Moro, que pediu demissão alegando interferência do presidente na Polícia Federal

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Brasília

Ações na Justiça tentam impedir a posse do delegado Alexandre Ramagem na diretoria-geral da Polícia Federal. Os pedidos feitos por partidos e movimentos políticos alegam “abuso de poder” e “desvio de finalidade” na escolha do novo chefe da corporação.

Nesta terça-feira (28), o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) oficializou, via Diário Oficial, o nome de Ramagem para o cargo de diretor-geral da instituição. A posse, contudo, ainda não está marcada.

Até as 18h às desta terça, ao menos seis ações pediam a suspensão da nomeação de Ramagem alegando que o chefe do Executivo praticou “aparelhamento particular” ao indicá-lo para a função.

Alexandre Ramagem em sabatina Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, antes de ocupar o cargo de diretor-geral da Agência Brasileira de Inteligência - Marcos Oliveira/Agência Senado

A base dos pedidos é a denúncia do ex-ministro da Justiça Sergio Moro, que pediu demissão na última sexta-feira (24) alegando interferência do presidente da República na Polícia Federal.

Moro, que será substituído por André Mendonça, então chefe da AGU (Advocacia Geral da União), afirmou que Bolsonaro queria ter uma pessoa do contato pessoal dele no comando da PF para poder “colher informações” e “relatórios” diretamente. O ex-ministro afirmou que Bolsonaro tentava, assim, influenciar investigações em curso.​

Ramagem é homem de confiança do presidente e de seus filhos. Ele se aproximou da família Bolsonaro durante a campanha de 2018, quando comandou a segurança do então candidato a presidente após o episódio da facada contra Bolsonaro.

O vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos) é um dos seus principais fiadores e esteve diretamente à frente da decisão que o levou ao comando da Abin (Agência Brasileira de Inteligência) em junho passado.

No sábado (25), a Folha mostrou que uma apuração comandada pelo STF (Supremo Tribunal Federal), com participação de equipes da PF, tem indícios de envolvimento de Carlos em um esquema de disseminação de fake news.

Na noite de segunda (27), Bolsonaro disse não haver esquema de notícias falsas. "Meu Deus do céu. Isso é liberdade de expressão. Vocês deveriam ser os primeiros a ser contra a CPI das Fake News. O tempo todo o objetivo da CPI é me desgastar", afirmou o presidente, ao ser questionado sobre possíveis prejuízos que a troca no comando da Polícia Federal traria à investigação sobre as fake news.

A posse de Ramagem na PF e de Mendonça no Ministério da Justiça está marcada para as 15h desta quarta (29).

O PDT entrou com um mandado de segurança no STF (Supremo Tribunal Federal) alegando "abuso de poder por desvio de finalidade" com a nomeação do delegado para o posto na PF. O relator será o ministro Alexandre de Moraes.

Um outro caso relatado por Moraes está entre os motivos que levaram a demissão do antigo diretor geral da PF Maurício Valeixo.

Em trocas de mensagens apresentada por Moro, o presidente Jair Bolsonaro pede a troca de comando na PF com base em uma informação de que a corporação estaria investigando deputados bolsonaristas. Em resposta, Moro diz que a investigação é conduzida pelo ministro Moraes.

“Este inquérito é conduzido pelo ministro Alexandre no STF, diligências por ele determinadas, quebras por ele determinadas, buscas por ele determinadas. Conversamos em seguida às 9h”, em referência ao encontro que teriam na manhã de quinta-feira quando o presidente confirmou a troca no comando da PF desencadeando a crise que levou a saída do ex-juiz da Lava Jato.

A Rede Sustentabilidade também entrou no STF contra a nomeação.

O partido apresentou ADPF (Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental) afirmando que conversa por aplicativo de mensagem entre Bolsonaro e Moro "demonstram de forma inequívoca a vontade de interferência em investigações".

Para o senador Randolfe Rodrigues (AP), líder da sigla no Senado, apesar de preencher os requisitos estritamente legais, a nomeação é "uma tentativa de Bolsonaro controlar e abafar investigações da instituição que envolvem seus familiares e conhecidos”.

Ainda de acordo com o senador, “não pode a competência legal de nomeação e exoneração ser confundida com carta branca para fazê-las em total descumprimento com princípios fundamentais para a administração pública: impessoalidade e moralidade".

Randolfe, ao lado do senador Fabiano Contarato (ES), é autor de outra ação no Judiciário. Os parlamentares pediram para que fosse anulada a exoneração de Maurício Valeixo e suspensas novas nomeações. A ofensiva, porém, foi rejeitada pelo juiz Ed Leal, da 22ª Vara Federal Cível do Distrito Federal. Os advogados da Rede avisaram que irão recorrer à segunda instância.

O PSOL, através do deputado federal Marcelo Freixo (RJ), entrou com ação, mas preferiu contestar a nomeação à primeira instância da Justiça. “Não permitiremos que o presidente transforme a PF numa polícia política a serviço da família", afirmou.

A deputada Tabata Amaral (PDT-SP) também ingressou com ação na Justiça Federal em Brasília pedindo para que Alexandre Ramagem seja proibido de assumir a diretoria-geral da Polícia Federal. A parlamentar quer ainda que a nomeação seja suspensa em caráter liminar, até o julgamento final da ação.

O coordenador do Movimento Brasil Livre (MBL), Rubinho Nunes, confirmou que o grupo político também entrou com uma ação contra a posse. "Sua nomeação —para agir como lacaio do Bolsonaro— fere o princípio da finalidade, da impessoalidade e da moralidade", disse o coordenador do MBL.

Bolsonaro sinalizou a aliados que não pretende desistir da escolha do amigo da família para o comando da PF.

Reservadamente à Folha integrantes do STF avaliam que não há impedimento legal para Ramagem assumir o cargo mesmo tendo ligações pessoais com o clã Bolsonaro. Os ministros ouvidos lembram, no entanto, que o histórico recente do Supremo demonstra que o cenário político também é levado em consideração em decisões desta natureza.

Um dos exemplos citados foi a tentativa da então presidente Dilma Rousseff (PT) nomear o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para chefiar a Casa Civil em 2016. Em tese, ele preenchia os requisitos constitucionais para a função, que é ser brasileiro, ter mais de 21 anos e não estar com os direitos políticos cassados, mas acabou barrado pela Corte.

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