Descrição de chapéu Folhajus

Lava Jato acusa filho do presidente do STJ de receber cerca de R$ 82 milhões para influenciar decisões da corte

Segundo a investigação, Eduardo Martins tinha como missão obter decisões que pudessem manter Orlando Diniz à frente da Fecomércio fluminense

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Brasília

A Operação Lava Jato acusa o advogado Eduardo Martins, filho do recém-empossado presidente do STJ (Superior Tribunal de Justiça), Humberto Martins, de receber cerca de R$ 82 milhões da Fecomércio do Rio de Janeiro para influenciar em decisões de ministros da corte.

Eduardo foi alvo de uma ação da Lava Jato deflagrada nesta quarta-feira (9) que mira escritórios de advocacia investigados pelo MPF (Ministério Público Federal) por suspeitas de serem usados para desviar recursos do Sistema S fluminense.

A missão de Eduardo, segundo o MPF, seria a de obter junto ao STJ decisões que pudessem manter Orlando Diniz à frente da Fecomércio fluminense. Diniz foi preso pela Lava Jato e firmou acordo de delação premiada com a Procuradoria.

As informações prestadas por ele e outros documentos coletados pelos investigadores durante as apurações nas entidades antes comandadas por Diniz embasaram a ação desta quarta.

O ministro Humberto Martins, pai do advogado, assumiu a Presidência do STJ no final de agosto. Antes, ele ocupava o cargo de corregedor nacional de Justiça.

A Folha ligou para os escritórios de Eduardo Martins em Brasília e Maceió, além de celulares do advogado, mas não conseguiu contato.

Humberto Martins
Humberto Martins, presidente do STJ - Gustavo Lima/SCO/STJ

Os investigadores acusam Eduardo dos crimes de organização criminosa, exploração de prestígio, estelionato e lavagem de ativos.

Na decisão em que acatou a denúncia do MPF e determinou a realização de buscas e apreensão, o juiz Marcelo Bretas, titular da 7ª Vara Criminal Federal do Rio de Janeiro, apontou o recebimento de valores pelo advogado em três trechos.

“De forma livre e consciente, entre 23.12.2015 e 29.4.2016, em quinze oportunidades diferentes, Eduardo Martins desviou para si e para Cesar Rocha, com a ajuda também livre e consciente de Orlando Diniz e Cristiano Zanin, R$ 37.400.000,00 (trinta e sete milhões e quatrocentos mil reais) do SESC/RJ e do SENAC/RJ.”

Cesar Rocha citado é o ex-ministro e ex-presidente do STJ Cesar Asfor Rocha. Cristiano Zanin é o advogado que atua na defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Ambos foram alvos da operação desta quarta-feira (9) e denunciados pelo Ministério Público Federal —Zanin afirma ser vítima de intimidação por criticar a Lava Jato.

Em nota, o ex-ministro Asfor Rocha afirmou que "as suposições feitas pelo Ministério Público em relação a nosso escritório não têm conexão com a realidade. Jamais prestamos serviços nem recebemos qualquer valor da Federação do Comércio do Rio de Janeiro, tampouco de Orlando Diniz".

O despacho de Bretas narrou um segundo evento em que valores transferidos pela Fecomércio ao advogado Eduardo Martins foram considerados ilícitos.

“De forma livre e consciente, entre 23.12.2015 e 4.7.2017, em vinte e três oportunidades diferentes, Eduardo Martins desviou para si, com a ajuda também livre e consciente de Orlando Diniz e Cristiano Zanin, R$ 40.100.000,00 (quarenta milhões e cem mil reais) do SESC/RJ e do SENAC/RJ.”

De acordo com os procuradores da República, houve formalização de contratos de honorários advocatícios firmados com a Fecomércio/RJ, “feitos para conferir aparência de legalidade à exploração de prestígio antes narrada”.

A peça acusatória indicou um terceiro caso, mais antigo, de 2014, em que Eduardo Martins, com o mesmo propósito dos outros repasses listados —ou seja, supostamente influenciar decisões do STJ—, teria recebido cerca de R$ 5 milhões da Fecomércio do Rio.

“Orlando Diniz e Eduardo Martins”, diz a acusação, “ocultaram e dissimularam a natureza e a origem ilícitas de R$ 5.500.000,00 (cinco milhões e quinhentos mil reais), convertendo-os em ativos lícitos, mediante idealização e elaboração de dois contratos de honorários advocatícios ideologicamente falsos”.

A denúncia apontou que, em relação aos R$ 40,1 milhões, foram providenciados cinco contratos de honorários advocatícios “ideologicamente falsos” firmados pela Fecomércio/RJ com diferentes escritórios de advocacia.

Entre esses escritórios de advocacia, segundo o Ministério Público, um deles é ligado a Jamilson Santos de Farias, de quem Eduardo já manteve sociedade.

Em contrapartida, foram emitidas 23 notas fiscais, “todos esses documentos ideologicamente falsos na medida em que os serviços neles especificados não foram prestados”, narra a denúncia do MPF.

Quanto aos R$ 37,4 milhões, a Procuradoria afirmou que foram elaborados três contratos de honorários advocatícios, firmados entre a Fecomércio/RJ e o escritório de Advocacia Martins, de propriedade de Eduardo.

Neste caso, o MPF afirmou que foram emitidas 15 notas fiscais, “todos esses documentos ideologicamente falsos na medida em que os serviços neles especificados não foram prestados”.

Os repasses indicados pela Lava Jato ao advogado Eduardo Martins ocorreram em período que tramitou no STJ recurso para manter Orlando Diniz à frente das entidades do Sistema S no Rio de Janeiro.

Houve intervenção administrativa promovida pelos Sesc e Senac nacionais nas entidades regionais do Rio de Janeiro que o afastou das funções, medida confirmada pelo Tribunal de Justiça fluminense.

Em novembro de 2015, Diniz recorreu ao STJ e obteve uma liminar do ministro Napoleão Nunes Maia Filho para seguir à frente do cargo.

Dois anos depois, em novembro de 2017, ele foi afastado do posto por decisão de Maia Filho.

Em ação da Lava Jato, Diniz foi preso pela Polícia Federal em fevereiro de 2018 e passou a negociar com os investigadores a delação.

Lava Jato acusa também o advogado Tiago Cedraz, filho do ministro do TCU (Tribunal de Contas da União) Aroldo Cedraz, de tráfico de influência e lavagem de dinheiro.

De acordo com o MPF, o ex-governador Sérgio Cabral e a ex-primeira-dama do Rio Adriana Anselmo, solicitaram a Orlando Diniz a contratação de Tiago a pretexto de influenciar atos praticados pelo Tribunal de Contas da União”.

“Orlando Diniz e Tiago Cedraz, com auxílio de Sérgio Cabral e Adriana Anselmo, de modo consciente e voluntário, desviaram, em proveito de Tiago Cedraz, recursos do SESC/RJ e SENAC/RJ, por intermédio da Fecomércio/RJ, no valor total de R$ 13.703.333,33”, segundo trecho da denúncia.

"[A contratação] só se deu em razão de ter sido sugerido que Tiago Cedraz tinha poder de influência dentro do TCU", afirma a Lava Jato.

Não houve, segundo os procuradores da República, prestação de serviços do escritório nos processos para os quais foi contratado.​

​Em nota, o escritório de Cedraz negou o cometimento de atos ilícitos atribuídos pela Lava Jato. "O escritório tem convicção de que os eventos de hoje são absurdos e reprováveis. Além disso, acredita que a verdade logo será reestabelecida", afirmou.

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