Descrição de chapéu Folhajus

PGR analisa delação de advogado que diz ter sido laranja de Aécio em compra de apartamento

José Antônio Fichtner, que era amigo do deputado, cita transação com parentes de tucano; relato é falso, diz defesa

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Rio de Janeiro

A Procuradoria-Geral da República analisa a delação já homologada na Justiça em que o advogado José Antônio Fichtner afirma ter sido “laranja” do deputado federal Aécio Neves (PSDB-MG) na compra de um imóvel em Santa Catarina.

No depoimento, dado há dois anos, ele disse que, após quatro anos com o apartamento em seu nome, o vendeu para a mãe do deputado e devolveu o montante em dinheiro vivo para a irmã de Aécio, Andrea Neves.

O imóvel, localizado no bairro Lagoa da Conceição (região nobre de Florianópolis), já havia entrado no radar da Polícia Federal em 2017. Durante a deflagração da Operação Patmos, agentes encontraram a escritura de compra do imóvel por Fichtner na casa do tucano.

A delação do advogado, sob sigilo há dois anos, foi homologada pelo juiz Marcelo Bretas, responsável pelos processos da Operação Lava Jato no Rio de Janeiro.

O acordo chegou a ser analisado pela Procuradoria-Geral da República na gestão de Raquel Dodge, mas ela avaliou que os fatos sobre Aécio não tinham relação com o mandato do deputado, determinando a remessa para a primeira instância.

Segundo a Folha apurou, a PGR, sob Augusto Aras, voltou a analisar os anexos da colaboração de Fichtner. Não há informações sobre que medidas foram tomadas a partir desta análise.

Fichtner é considerado um dos maiores especialistas no país em arbitragem, processo extrajudicial no qual as partes definem um julgador para analisar uma divergência. O mecanismo costuma ser usado por grandes empresas para agilizar a solução de uma causa.

O advogado era amigo de Aécio havia décadas. É também irmão de Régis Fichtner, ex-secretário da Casa Civil do governo Sérgio Cabral (2007-2014) no Rio de Janeiro e acusado em um esquema estadual.

De acordo com o relato do advogado, o empresário Alexandre Accioly o procurou para que comprasse o imóvel para Aécio. Fichtner relatou que recebeu o dinheiro para a aquisição por meio de honorários advocatícios superfaturados, vinculados a serviço que já prestava para o empresário.

A compra ocorreu em julho de 2010 por R$ 380 mil, segundo dados declarados na matrícula do imóvel em cartório de Florianópolis. Segundo o advogado, Accioly relatou que o imóvel seria usado pela esposa de Aécio, a modelo Letícia Weber.

Fichtner disse ao Ministério Público Federal que, após alguns anos, sentiu-se incomodado com o papel de “laranja”. Assim, ficou combinado com Accioly que a família compraria o apartamento e ele devolveria o dinheiro.

A transação foi feita em nome da mãe de Aécio, Inês Maria Neves. De acordo com a matrícula do imóvel, ela adquiriu o imóvel por R$ 460 mil em abril de 2014, meses antes da campanha eleitoral em que o então senador concorreu à Presidência da República contra Dilma Rousseff (PT).

Accioly é descrito por Fichtner como uma espécie de agenciador de atividades do deputado. Ele relatou que o empresário lhe disse que administrava uma conta na Suíça de propriedade real de Aécio.

Sob sigilo há dois anos, a delação de Fichtner já gerou uma ação penal contra ele, que confessou ter usado dinheiro vivo do irmão para o pagamento, “por fora”, de uma fazenda em Wanderley (BA).

A transação foi declarada em R$ 4 milhões, mas houve um pagamento não informado às autoridades fiscais de R$ 400 mil, em espécie. Segundo José Antônio, seu irmão afirmou a ele que essa parte do dinheiro tinha como origem sobras de campanha eleitoral de Cabral.

Para o MPF, trata-se de dinheiro do esquema de propina do ex-governador, preso há quatro anos. Régis é réu sob acusação de envolvimento no caso.

A delação de José Antônio Fichtner foi firmada em agosto de 2019, meses depois de seu escritório de advocacia ser alvo de mandados de busca e apreensão em razão das investigações contra seu irmão. Ele deixou os quadros da banca tempos depois.

Meses após deixar o escritório, o advogado passou a questionar na Justiça os termos do acordo de rescisão com os antigos sócios. Alegou que sofreu grave depressão no período de negociação e tinha direito a valores maior do que o pago na sua saída, como revelou o jornal Valor Econômico em outubro do ano passado.

Afirmações são 'absolutamente falsas', diz defesa de tucano

O advogado Alberto Toron, que defende Aécio, afirmou em nota que as afirmações de José Antônio Fichtner são “absolutamente falsas”. Ele afirma que o próprio advogado negou em 2017 haver ilegalidades na transação imobiliária que realizou com a mãe do deputado.

“Lamentamos que falsas e contraditórias declarações que são facilmente desmentidas pelos fatos possam servir a interesses ainda desconhecidos de quem as profere”, afirma a nota do advogado.

Toron também disse que precisa ser investigada “a indústria de delações sem provas que leva pessoas a mentirem e alterarem suas versões sobre os mesmos fatos em troca de benefícios pessoais”.

O advogado Fábio Tofic, responsável pela defesa de Andrea Neves, disse que "é falsa a acusação feita" à sua cliente. "A situação narrada —e inventada— pelo sr. Fichtner nunca ocorreu", afirmou ele.

Procurado, o advogado Flávio Mirza, que representa José Antônio Fichtner, não respondeu aos questionamentos da reportagem.

A assessoria de imprensa de Alexandre Accioly disse, em nota, que o empresário nega ter solicitado ao advogado a compra de imóvel para o deputado.

“O escritório de advocacia de Fichtner advogou para empresas de Accioly cobrando por hora trabalhada e nega a cobrança irregular de honorários”, diz a nota da assessoria do empresário.

Accioly também nega que tenha administrado “contas bancárias de terceiros”. “Todos os seus bens estão devidamente declarados”, diz a nota.

Os advogados Geraldo Prado e Antônio Pedro Melchior, que representam Régis Fichtner, afirmam que o ex-secretário “sempre atuou com retidão, honestidade e seriedade na vida pública e em âmbito privado, repelindo qualquer insinuação de que possa ter praticado irregularidade de alguma natureza”.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.