Descrição de chapéu Eleições 2022

Pressão de Zema e do PT leva prefeitos à corda bamba em Minas

Gestores municipais se equilibram na tentativa de não desagradar nem governador nem eleitores

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Belo Horizonte

Apesar de estarem na mira de uma ofensiva pró-Bolsonaro feita pelo governador Romeu Zema (Novo) e de um contra-ataque por parte do PT, prefeitos de Minas Gerais dizem manter a dinâmica de apoios do primeiro turno, alguns tentando se equilibrar para não desagradar ao governador nem aos eleitores, que em várias cidades deram a vitória a Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Aqueles que já apoiavam Lula e Jair Bolsonaro (PL) desde a primeira rodada afirmam que se converteram em cabos eleitorais mais ativos. Outros, apesar do apoio quase em peso à reeleição de Zema, dizem optar agora pela neutralidade

A Folha ouviu 18 prefeitos de grandes, médias e pequenas cidades do estado nos últimos dias, além de vários políticos engajados na campanha de Bolsonaro ou Lula na região.

Minas é considerada estratégica na disputa ao Palácio do Planalto pelo peso do seu eleitorado, o segundo maior do país, e pelo fato de que após Getúlio Vargas (1950) todo vitorioso em solo mineiro conseguiu chegar à Presidência da República.

Romeu Zema ao lado de Jair Bolsonaro e de seu candidato a vice, Braga Netto, no Palácio da Alvorada, durante anúncio do apoio do governador de Minas à reeleição do presidente - Adriano Machado-4.out.22/Reuters

Além disso, o estado sempre foi visto por parte da campanha de Bolsonaro como um dos territórios com maiores chances de crescimento, muito em função do apoio de Zema.

No primeiro turno, Lula venceu no estado com uma diferença de cinco pontos percentuais, praticamente o mesmo placar nacional. Zema foi reeleito e logo após o resultado anunciou apoio a Bolsonaro e promoveu reuniões com prefeitos em que cobrou empenho e "trabalho de formiguinha" a favor do presidente.

Pesquisa do Datafolha divulgada nesta quinta-feira (27) mostra que Lula segue à frente no estado, com 48% das intenções de voto, contra 43% de Bolsonaro.

A saia justa de prefeitos neste segundo turno é simbolizada, por exemplo, no caso do prefeito de Salinas, Kinca Dias (PDT).

A cidade do norte do estado, região que Lula teve as votações proporcionais mais expressivas, deu ampla vitória ao petista no primeiro turno, 60% dos votos válidos contra 34% de Bolsonaro. O prefeito, que diz ter apoiado a reeleição de Zema, agora está neutro.

"O que mais pesou foi em respeito à população. A grande maioria votou em Lula. Se eu fosse acompanhar o governador, iria contra essa maioria. Se eu fosse apoiar Lula, seria uma afronta ao governador, que foi grande parceiro do município", disse.

Prefeito de Montes Claros, também no norte de Minas, Humberto Souto (Cidadania) diz que já apoiava Bolsonaro "e não precisou ninguém pedir", em referência ao apelo do governador.

Nos últimos dias, Souto subiu ao palanque com o presidente e pediu votos a Bolsonaro. "Tenho muito medo de voltar à época do [ex-governador Fernando] Pimentel, em que o dinheiro não vinha", afirma ele, repetindo o mesmo mantra entoado por Zema na campanha.

Prefeito da pequena Ibituruna (sul do estado), Francisco Antonio Pereira, eleito pelo DEM (hoje União Brasil), também diz apoiar Bolsonaro desde o primeiro turno e vai na mesma linha: "Eu acho que o pessoal aqui está definido, não vai mudar muita coisa não."

Já Maycon Willian (PSB), prefeito de Machado, no sul de Minas, diz que mantém o apoio a Lula mesmo tendo apoiado Zema no primeiro turno.

"O governador achou que prefeito é igual gado, onde ele puxa o voto, e não é assim não. Não é porque ele apoia o Bolsonaro que todos os prefeitos vão apoiar. O compromisso que fiz com ele eu honrei, mas presidente é outra história", afirma.

Na conversa com prefeitos e políticos do estado, vinculados às duas campanhas, as narrativas são distintas. De um lado, Zema e aliados apostaram na mobilização dos prefeitos, seja por meio de contato direto do governador ou de aliados, seja por meio de associações de municípios e empresariais ou em eventos.

"Eleição é sempre imprevisível, tudo pode mudar na véspera, no último dia, mas nós estamos aqui em Minas assistindo a um crescimento do eleitor pró-Bolsonaro, e sabemos que isso pode continuar nos próximos dias, pode se intensificar, pode dar uma paralisada e pode até recuar. Mas estamos otimistas", disse Zema em entrevista à Folha no início da semana.

"Os prefeitos se dedicaram, em sua maioria no primeiro turno, a eleger seus deputados estaduais e federais. E sabemos que a grande maioria dos prefeitos de Minas, 80% ou mais, sofreram muito na época do PT e do Pimentel, que é cria do Lula, e sabem como o PT é capaz de fazer estragos."

Do lado adversário, petistas e aliados afirmam que o governador faz uma avaliação errônea sobre o eleitorado que, no primeiro turno, votou tanto nele como em Lula.

"Antes do voto ser do Zema, ele foi Lula, 40% do voto do Zema foi Lula e Zema", diz o deputado federal Reginaldo Lopes (PT), um dos coordenadores da campanha petista no estado.

O deputado André Janones (Avante), que tem coordenado informalmente a campanha nacional de Lula nas redes sociais, reforça: "O que a gente viu foi: o prefeito vai ao encontro com o Zema, fala que agora ele é um soldado a favor do Bolsonaro, daí chega na cidade dele, coloca o material de campanha debaixo do colchão e vai pra prefeitura para continuar o trabalho. Foi um apoio para inglês ver."

A postura de vários prefeitos que acenam a Zema ao mesmo tempo em que não mudam sua rotina tem como explicação o temor de perder parte do eleitorado, dividido, além do cenário de voto cristalizado que indica pouca margem de manobra.

"Meu município é bastante dividido, e os dois lados disputam voto a voto", afirma a prefeita de Vespasiano, Ilce Rocha (PSDB), sobre a opção por não declarar apoio a nenhum candidato. Na cidade, que fica na região metropolitana, Lula teve 46,7% dos votos, e Bolsonaro, 45,3%.

Já em Presidente Kubitschek, cidade do Vale do Jequitinhonha que deu maior percentual de votos a Lula no primeiro turno, no estado (82,8%), o prefeito também diz ter optado pela neutralidade. "A posição da maioria já está definida", afirma Lauro de Oliveira (PSB), que diz ter apoiado Zema no primeiro turno.

A busca pelo apoio dos prefeitos também inaugurou uma batalha de números. Aliados de Bolsonaro estimam que cerca de metade dos 853 gestores municipais já tenham declarado apoio ao presidente. Já membros da campanha do Lula dizem estimar que cerca de 500 prefeitos apoiam o ex-presidente, ainda que alguns "informalmente".

Na mesma guerra dos números, a Associação Mineira de Municípios divulgou inicialmente que 300 gestores estiveram em evento com Bolsonaro —de onde alguns prefeitos saíram, inclusive, com materiais de campanha. Depois, afirmou que seriam 687.

Em encontro no norte de Minas, representantes do governo do estado falaram em 20 a 30 prefeitos. Já gestores locais falam que houve a participação de 52, ao mesmo tempo em que imagens do auditório vazio se espalharam nas redes. A região tem ao todo 89 cidades.

Para o presidente da Associação dos Municípios da Área Mineira da Sudene e prefeito de Padre Carvalho (norte de Minas), José Nilson (Republicanos), prefeitos estão "90% com Bolsonaro, ajudando".

"No primeiro turno muitos prefeitos ficaram com medo de pedir voto para Bolsonaro para não atrapalhar a eleição de deputado", afirma. Ele atribui uma possível maior mobilização nesta etapa a declarações de Lula em um comício em Belo Horizonte, interpretadas como uma "ameaça" a Zema.

"Aquilo ficou na boca dos prefeitos." A declaração (quando Lula dizia que Zema teria remorso se soubesse o que PT fez por Minas), porém, tem circulado de forma descontextualizada e editada em vídeos bolsonaristas, de forma a soar como ameaça direta

Para Daniel Sucupira (PT), prefeito de Teófilo Otoni, Zema "mentiu a eleitores e escondeu seu apoio a Bolsonaro no primeiro turno". "Se ele tivesse assumido a face bolsonarista no primeiro turno, não tinha sido reeleito", afirma.

Angelo Oswaldo (PV), prefeito de Ouro Preto e que apoia Lula desde o primeiro turno, diz sentir pressão muito grande de entidades municipalistas, mas questiona a capacidade de transferência de votos daqueles que aderem às campanhas e cita exemplos de outras eleições.

"Em 1998, o governador Eduardo Azeredo era candidato à reeleição e exerceu grande pressão sobre os prefeitos, reunindo todos do Vale do Jequitinhonha. Só um não declarou apoio a ele. Mas quando foram abertas as urnas, o ex-presidente Itamar Franco [que concorria ao governo do estado] venceu em todas as cidades [do Vale]", lembra.

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