Descrição de chapéu Eleições 2022

Tebet diz que erro fatal de Lula para não ganhar no 1º turno foi não detalhar plano de governo

Senadora do MDB que se aliou ao petista cita documento raso e defende anúncio de perfil de ministro da Economia

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Brasília

Agora ao lado da campanha de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), a senadora Simone Tebet (MDB) afirma que o "erro fatal" que custou a vitória no primeiro turno das eleições ao petista foi não ter detalhado seu plano de governo e ter apenas focado seus feitos do passado.

Tebet terminou o pleito de domingo (2) em terceiro lugar, com 4,16% (quase 5 milhões de votos).

"O erro fatal, a meu ver, que fez com que o candidato Lula não ganhasse no primeiro turno foi a incapacidade de perceber que só faltava um detalhe. O eleitor sabe o que foi o governo do PT, com os seus avanços e com os seus defeitos. Mas estava esperando uma fala, não do programa de televisão, mas nos debates, nos palanques, uma fala do Brasil do futuro", diz Tebet à Folha.

Imagem mostra a candidata à presidência da República e senadora Simone Tebet. Ela é uma mulher branca, de cabelos escuros. Veste uma roupa azul marinho
Tebet despista sobre cargos em eventual governo Lula e 2026: "se projetasse 2026, meu caminho seria a neutralidade" - Mauro Pimentel/AFP

Por isso, ela agora espera que esse erro seja corrigido. Não pede que Lula anuncie com antecipação o ministro da Economia em seu eventual governo. Mas considera necessário que, pelo menos, o perfil desse quadro já seja divulgado.

Apesar de ter ficado em terceiro lugar, Tebet ganhou força política durante a campanha eleitoral. Saiu-se bem nos debates, cresceu em alguns momentos nas pesquisas e seu apoio passou a ser cortejado. No entanto, a senadora despista sobre seu futuro, tanto em eventual governo Lula como nas próximas eleições presidenciais. "Se eu projetasse 2026, meu caminho seria a neutralidade [não apoio a Lula]", afirma.

Que avaliação a senhora faz do primeiro turno das eleições e de sua campanha? O que aconteceu no período eleitoral é exatamente reflexo do que estava acontecendo no Brasil: polarização entre duas correntes chamadas ideológicas, uma disputa pelo poder rasa, em que em nenhum momento o eleitor teve segurança de saber quais eram as propostas e soluções concretas para os problemas do Brasil. Não havia embate entre os principais personagens, que inclusive fugiram do debate.

Nesse aspecto, lamentavelmente a gente viu no período eleitoral o que temos acompanhado ao longo desses três anos e meio: um país dividido, um discurso de ódio raso, contaminado por fake news, muitas vezes de ideias nacionalistas, ora populistas. E o reflexo disso foi que a gente não conseguia ter candidaturas paralelas ou alternativas que pudessem de alguma forma furar a bolha.

O presidente Bolsonaro sai fortalecido? De todos os erros que cometemos, talvez o mais grave tenha sido cometido pela campanha do candidato Lula quando ele toma para si o pedido de voto útil, que é legítimo —eu faria a mesma coisa—, mas sem entregar para o eleitor um mínimo de segurança do que será esse terceiro mandato. Ele não entregou minimamente através da fala, apenas através de um documento raso, superficial, quais serão as propostas na área de geração de emprego, educação, saúde, seja o que for.

Diante desse cenário, não acho que Bolsonaro saiu fortalecido. Os votos úteis, meus e do Ciro, daquele eleitor menos seguro, acabaram indo para o Bolsonaro, porque o eleitor não se sentiu seguro de garantir a eleição para o Lula no primeiro turno, exatamente por essa falta de clareza.

Ele falava muito do passado e dizia "não, eu não preciso fazer promessas". Então aquele eleitor que não estava muito seguro comigo e com o Ciro, ele fez a opção "pera aí, eu vou votar aqui no Bolsonaro". Não vejo que Bolsonaro tenha saído fortalecido.

A senhora acha que o PT precisa agora detalhar mais o plano econômico? Fundamental! O erro fatal, a meu ver, que fez com que o candidato Lula não ganhasse no primeiro turno foi a incapacidade de perceber que só faltava um detalhe. O eleitor sabe o que foi o governo do PT, com os seus avanços e com os seus defeitos. Ele sabe o que eles fizeram e o que deixaram de fazer. Mas o eleitor estava esperando da fala [de Lula], não do programa de televisão, mas sim da fala nos debates, nos palanques, uma fala do Brasil do futuro. Quer dizer: qual é o Brasil que o PT está pronto para entregar para o futuro do Brasil a partir de janeiro do ano que vem.

E não é nos detalhes, é na singeleza das propostas. Óbvio, através da pauta econômica, para que rumo, se vem um pouco mais ao centro; não no liberalismo que não faz parte obviamente da visão econômica da esquerda, mas alguma coisa que dê conforto e aproxime. E é possível.

E a partir daí quais são os programas sociais. E aquilo que [Lula] vai fazer de políticas públicas definitivas. Não é só o Auxílio Brasil, o Auxílio Brasil é necessário, mas eu não posso fazer uma geração inteira, num país tão rico como o Brasil, ficar dependendo eternamente de auxílio do governo federal.

Como sinalização, Lula deve já anunciar quem vai ser seu ministro da Economia, por exemplo? Não acho que tenha que ser. É complicado antecipar e depois não poder voltar atrás. Muita coisa muda dentro desse processo eleitoral tão rápido. Escolher antes não é uma boa política. Talvez sinalizar qual é o perfil do futuro economista, que pode não necessariamente ser um economista. O perfil de um próximo ministro da Fazenda [Economia] acho que é uma boa sinalização para tranquilizar a economia brasileira, que pode inclusive já começar dar sinais a partir de dezembro, novembro; sinais positivos, que facilitam depois os juros menores, inflação menor, o início da próxima gestão.

A senhora segue querendo ser presidente da República e pensa em 2026? Sigo querendo ajudar o Brasil da forma como posso. Sou antes de tudo uma professora, uma mulher e uma mãe. Tenho muito mais do que mereço na minha vida. E o que ouvi ao longo dessa minha jornada na campanha não esperava ver mais na minha vida. Vi lamentavelmente retrocessos civilizatórios e de indicadores sociais, exatamente o que vi no início da minha vida pública na década de 1970: o mesmo mapa da fome, a mesma desigualdade social, a mesma apatia, a mesma falta de perspectiva, um cenário quase que de abandono.

Agora tenho que obviamente repensar qual é o meu papel como cidadã e como brasileira, nesse momento grave da história, diante do legado que eu tenho. Percebo especialmente [que] com as mulheres brasileiras houve uma aproximação de ideias, elas se sentiram representada de alguma forma com aquilo que eu tinha, com meus desabafos, minha indignação, com as minhas propostas. Então sei que saio com a responsabilidade de um legado muito mais político do que eleitoral. Acredito que tenha plantado boas sementes.

A senhora evita falar em ocupar ministérios, mas aceitaria se fosse convidada? Não tenho pretensão e acho que posso contribuir, se é que acham que minha voz é importante, dando sugestões, fazendo minhas considerações críticas, sem precisar de cargo. Posso contribuir da tela de um computador, por Zoom, no meu estado, na minha cidade, a gente tem como contribuir rodando o Brasil.

Eu já fui [do Poder] Executivo, prefeitura duas vezes, vice-governadora. Acho que a gente tem que acabar com esse fisiologismo para apoios. Os partidos não podem apoiar por cargos. É claro que partidos têm de ter espaço, mas partidos que ideologicamente pensam iguais. Agora o Brasil tem problemas tão sérios e tão complexos que o presidente da República tem que ter a liberdade de escolher os melhores.

A campanha de Lula assegurou que vai incorporar algumas das suas propostas? Eu dei todo o conforto para apresentar propostas factíveis, concretas, fáceis de serem executadas e fundamentais. A gente precisa cuidar das nossas crianças na hora certa, na primeira infância; devolver para a escola nossos jovens que agora estão afastados, indo para a marginalidade, e essa poupança [que estava em seu plano de governo] é uma forma de garantir a ele esse ensino técnico, obviamente de qualidade. A gente precisa zerar as filas represadas [do SUS] e aprovar uma lei que garanta igualdade salarial

Eu apresentei ideias tão simples que eu espero que sejam acolhidas. Claro que deixei claro que a única forma de o presidente governar é ter alguma âncora fiscal. Se não tiver um compromisso com a responsabilidade, e não estou nem falando de teto de gastos, ele não consegue de volta o Orçamento porque vai ficar refém de um Congresso fisiológico e não vai alcançar o social.

Não há nada que tenhamos apresentado que não seja factível e fácil de ser executado. Já houve uma sinalização de que eles poderiam acatar todas as sugestões. E amanhã [sexta-feira] já vai ter alguma coisa oficial. Já tive uma sinalização que, pela agenda do candidato Lula, ele vai me encontrar para que a gente possa oficializar as propostas e o retorno delas.

A senhora pretende ter uma postura ativa na campanha de Lula? E já tem uma ideia se vai subir em palanque, viajar o Brasil? Eu estou pronta para estar nas ruas, vigilante em defesa da democracia, para defender ideias das quais eu concorde. Eu não sei qual é o limite e a minha importância dentro da campanha, o quanto sou necessária. Essa tratativa vai acontecer após o meu encontro com o presidente Lula, onde vai estar acatando ou não as nossas sugestões.

Óbvio que eu não vou subir num palanque em que o PT apoia um candidato e o MDB ou a coligação apoia outro. Não vejo problema em estarmos juntos em palanques regionais que temos candidatos em comuns. Aí é uma questão de estratégia política da campanha dele do que minha. Eu vou estar obviamente nos palanques regionais que me convidarem independentemente do PT.

Quais os riscos vê de um eventual segundo governo Bolsonaro, agora com uma base mais forte no Congresso? Me preocupou, me assustou, não o caráter conservador do Congresso Nacional, porque isso faz parte da democracia. O problema é que, ao lado dos conservadores, a gente tem representantes de setores reacionários, a gente está falando de aumento da bancada da bala, de pessoas que têm visões mais extremistas à direita, ao lado de inexperientes que vêm com pautas muito específicas.

Essa hegemonia política, do apoio político do Legislativo, é a antessala da nova autocracia, da nova ditadura branca, que é velada, que é mais grave porque ninguém vê.

Então você é o Executivo e domina a Câmara, domina o Senado, com base nisso faz reforma do Judiciário, cria cargos, passa a ter maioria e aí está pronto para editar um terceiro mandato, aumentar o número de vagas [de ministros do STF]. E você permite inclusive na base do medo, dizer "fique no seu canto, porque ou instalo um processo de impeachment e te tiro do cargo".

Simone Tebet, 52

- Nascida em Três Lagoas (MS)
- Professora universitária e advogada
- Foi deputada estadual, prefeita de Três Lagoas por dois mandatos e vice-governadora do Mato Grosso do Sul. Eleita para o Senado em 2014, foi presidente da CCJ (Comissão de Constituição e Justiça), líder da bancada feminina e chegou a disputar a presidência da Casa. Atuou na CPI da Covid. Disputou neste ano a presidência da República pelo MDB.

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