Descrição de chapéu transição de governo

Lula defende conversa com centrão, promete não interferir na Câmara e prega harmonia entre Poderes

Petista afirma que é tempo para governar, e não de vingança, raiva ou ódio

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Brasília

Em sua primeira agenda em Brasília após a vitória eleitoral em 30 de outubro, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) defendeu, nesta quarta-feira (9), diálogo com o centrão e prometeu não interferir nos processos de escolha dos novos presidentes do Congresso Nacional —num aceno ao deputado Arthur Lira (PP), atual chefe da Câmara.

Em outra frente, Lula se reuniu com os ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) e pregou a harmonia entre os Poderes, numa contraposição ao conflito institucional constantemente estimulado pelo atual presidente, Jair Bolsonaro (PL).

O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), ao lado de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) - Pedro Ladeira/Folhapress

"Eu não enxergo dentro da Câmara e do Senado essa coisa do centrão. Eu enxergo deputados que foram eleitos e que, portanto, vamos ter que conversar com eles para garantir as coisas que serão necessárias para melhorar a vida do povo brasileiro", disse Lula, após se reunir com o presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), ministro Alexandre de Moraes.

Em outro gesto a partidos hoje distantes do PT, Lula disse que "não há tempo para vingança", para "raiva" ou para "ódio". "O tempo é de governar."

"O centrão é uma composição de vários partidos políticos que o PT tem que aprender a conversar, que o [Geraldo] Alckmin [vice eleito] tem que aprender a conversar e que eu tenho que aprender a conversar e tentar convencer da nossa proposta", disse.

Alckmin ainda recebeu, à noite, o governador eleito do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB), e o presidente do PSDB, Bruno Araújo. Após o encontro, os tucanos disseram que o partido vai colaborar para a "governabilidade" e "estabilidade" do país durante a gestão de Lula, ainda que não faça parte da base de apoio do petista.

Leite disse que as divergências entre o PSDB e a gestão de Lula serão tratadas com "responsabilidade". "Nunca exercendo de forma irresponsável ou sistemática uma oposição que traga prejuízo ao interesse nacional maior de fortalecer a nossa democracia", declarou o governador eleito.

O centrão é um grupo de partidos políticos que hoje controla o Legislativo e que tem em Lira uma de suas principais lideranças.

Não por acaso, a primeira reunião do dia de Lula foi com Lira, na residência oficial da Câmara.

O encontro durou cerca de duas horas e cumpriu mais uma etapa da articulação que pode unir em um mesmo lado o petista e o líder do centrão.

De acordo com pessoas que acompanharam a conversa, Lula disse a Lira o que viria a anunciar publicamente horas depois: que não pretende interferir na eleição para o comando da Casa.

Caso isso se confirme, fica praticamente selada a reeleição de Lira em fevereiro, já que se torna bastante improvável que surja um concorrente competitivo sem o apoio do presidente eleito.

Em troca, dizem aliados do petista, Lira trabalhará em um primeiro momento em prol da aprovação da PEC da Transição, medida essencial para que Lula acomode no orçamento verbas para cumprir em 2023 algumas de suas principais promessas de campanha.

Em um segundo momento, afirmam esses parlamentares, a ideia é que haja uma aliança formal entre Lira e Lula, o que daria ao presidente eleito parte do centrão e uma base muito mais sólida na Câmara do que se contasse apenas com a esquerda e com partidos de centro e de direita hoje independentes, como PSD e MDB.

Lira não deu entrevista após a reunião. O presidente da Câmara, porém, postou em suas redes sociais três fotos em que aparece sorridente ao lado de Lula.

De acordo com petistas, o presidente da Câmara se mostrou bastante receptivo à ideia de manter um entendimento com o PT, em troca do apoio ou da não interferência em sua campanha à reeleição —apesar do histórico de divergências durante a campanha.

As fotos postadas por ele são um sinal claro nesse sentido, avaliam.

Resta ao futuro governo, porém, vencer as resistências de Renan Calheiros (MDB-AL) a essa aliança. O senador é adversário de Lira e tem dado declarações contrárias a um acerto com o centrão.

Participaram também do encontro o vice-presidente eleito, Geraldo Alckmin (PSB), a presidente do PT, Gleisi Hoffmann (PR), o coordenador de governo da campanha de Lula, Aloizio Mercadante, e um grupo de deputados aliados de Lula.

Logo em seguida, Lula e sua comitiva se deslocaram alguns metros no Lago Sul de Brasília e se reuniram em almoço com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).

O senador mineiro é simpático a Lula e também é favorito para se reeleger para a presidência da Casa Legislativa em fevereiro, com o apoio do futuro governo.

Senadores que estavam no almoço relataram que os participantes deram início a uma contagem informal do tamanho da base de apoio à Lula no Senado. Uma parte do grupo concluiu que o número pode chegar a 51 senadores —ante os 81 totais.

Após a reunião, Pacheco disse nas redes sociais que tratou sobre temas de interesse do governo de transição.

"Reafirmei ao presidente Lula que o Congresso irá trabalhar, de forma responsável e célere, para assegurar os recursos que garantam, em 2023, os R$ 600 do Auxílio Brasil, o reajuste do salário mínimo, e os programas sociais necessários para a população mais carente do país", escreveu o senador.

Lula e Pacheco, acompanhados de Alckmin e Gleisi - Pedro Ladeira/Folhapress

Lula também se encontrou com ministros do STF.

A agenda do petista no tribunal foi acompanhada por quase todos os ministros da corte, inclusive os dois nomes indicados por Bolsonaro: Kassio Nunes Marques e André Mendonça. O único ausente foi Luís Roberto Barroso, que participa da reunião global do clima, a COP27, que ocorre no Egito.

O ex-governador e senador eleito Flávio Dino (PSB-MA) disse que, na reunião, Lula declarou "enfaticamente" o desejo de paz entre os Poderes e convidou o STF a participar de debates na política ambiental e na pauta do desarmamento.

Segundo o ex-governador, que acompanhou a reunião, Lula também disse que o desarmamento é fundamental para a segurança pública do país. O presidente eleito ressaltou que os Poderes são independentes.

De acordo com Dino, também foi tema do encontro a preocupação com a defasagem educacional provocada pela pandemia e a situação da superlotação das prisões.

Depois, Lula foi ao TSE conversar com Moraes.

Após a agenda com Moraes, ele afirmou que é possível resgatar a cidadania do povo brasileiro e recuperar a harmonia entre os Poderes e a normalidade da convivência entre as instituições.

"Instituições que foram atacadas, violentadas, por uma linguagem nem sempre recomendável por algumas autoridades ligadas ao governo", disse.

Lula afirmou ainda que conversou com os ministros do STF e com o presidente do TSE para agradecer a lisura do comportamento do Judiciário no "enfrentamento à violência, à ilegalidade, ao desrespeito" feito contra a democracia.

Ele enalteceu o sistema eletrônico de votação.

"Então, eu vi aqui para dizer do respeito que nós temos com as instituições", afirmou.

Ao fazer gestos aos demais Poderes, Lula marca uma diferença com seu antecessor.

A gestão Bolsonaro foi marcada por constantes atritos com a cúpula do Judiciário e principalmente com Moraes, Barroso e o ministro Edson Fachin.

Bolsonaro já acusou o trio de atuar para beneficiar Lula eleitoralmente e também conduziu uma cruzada contra o sistema eletrônico de votação, sem nunca apresentar provas de supostas fraudes apontadas por ele.

No fim do dia, Lula ainda recebeu um grupo de parlamentares que entregou ao petista uma carta com pautas para a juventude. Participaram da reunião a deputada Tabata Amaral (PSB-SP), além de a deputada federal eleita Duda Salabert (PDT-MG).

Lula também recebeu o governador Helder Barbalho (MDB) à noite. Ambos vão participar da COP27, no Egito.

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