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forças armadas

Apagão de segurança do DF e do governo federal gera Capitólio brasileiro

Forças do DF e Exército deixam correr solta baderna, que gera oportunidade para Lula e Moraes

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Brasília

Um apagão claramente intencional de segurança proporcionou o Capitólio brasileiro, a versão bolsonarista da invasão do centro de poder emulando o ataque à sede do Legislativo americano por ativistas ligados ao ídolo do ex-presidente americano Donald Trump.

A intervenção no Distrito Federal, algo radical embora limitada à área de segurança e a um mês, foi a resposta possível que sobrou a Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para o desafio à sua autoridade. Mas escamoteia um problema maior, que envolve o papel da inteligência militar no monitoramento dos radicais que subiram rampas neste domingo (8).

O incidente era uma das bolas mais cantadas da transição presidencial, como os atos do dia 12 de dezembro mostravam, que resolveu ignorar os manifestantes em frente a quartéis do Exército em todo o país em nome de uma acomodação e buscando evitar um desgaste de saída ao desalojar adversários.

Bolsonaristas em torno do Congresso após ataque antidemocrático neste domingo (8)
Bolsonaristas em torno do Congresso após ataque antidemocrático neste domingo (8) - Adriano Machado/Reuters

Mas a circunstância factual é tão grave quanto o fim em si da ação. Bolsonaristas, e chamá-los de radicais é ocioso, invadiram as sedes dos três Poderes do Brasil. E os fizeram de forma quase natural, sem oposição de ninguém.

Imagens de PMs do Distrito Federal gravando vídeos e fazendo selfies durante a manifestação prévia à invasão falam por si só. O governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha, do MDB que está assentado no governo Lula, está na primeira fila dos responsáveis a serem interrogados pelo que ocorreu.

O anúncio de exoneração do ultrabolsonarista Anderson Torres, ex-ministro da Justiça trazido para cuidar da Segurança do DF, obviamente não tira o papel óbvio do governador reeleito na confusão. A intervenção é apenas o começo.

Ibaneis sempre foi bolsonarista e sua PM é das mais ideológicas do país. Mas a inação ante a marcha da horda de acampados à frente do QG do Exército rumo à praça dos Três Poderes é um exemplo bizarro de facilitação de crime, que não escapará aos olhos do Judiciário sob a inspiração de Alexandre de Moraes.

Xerife do Supremo, presidente do Tribunal Superior Eleitoral e nêmesis do bolsonarismo, Moraes deverá ocupar protagonismo no processo contra os responsáveis pela crise.

Apesar de estar na cadeira da vítima, a situação não fica nada melhor em imagem para o governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O Exército, ora sob comando do petista, não mexeu uma palha para alertar o Ministério da Defesa ou a pasta da Justiça acerca da movimentação à frente de sua sede principal.

Aqui cabe examinar a rusga entre os ministros Flávio Dino (Justiça) e José Múcio (Defesa). O primeiro falou horrores ao longo dos dias acerca dos problemas e, no sábado (7), acionou a Força Nacional para interditar a Esplanada dos Ministérios. Para nada.

Ele pode argumentar que sabia sobre o óbvio mas as menos de duas centenas de homens mobilizados evidentemente não dariam conta da turba descendo a avenida. Já Múcio, advogado do comedimento necessário para lidar com o desconforto dos chefes militares com a eleição de Lula, ficou a pé na discussão. O Exército, que acompanha movimentações muito menos importantes, não fez nenhum alerta.

A baderna e destruição de patrimônio público são o testemunho mais vívido do modus operandi dos autoproclamados "homens de bem" do bolsonarismo, que passaram quatro anos defendendo alguma versão tortuosa do cristianismo e tal.

Segundo o Datafolha, 25% do eleitorado se diz bolsonarista. Para chegar aos 49,15% que o ex-presidente amealhou em 30 de outubro, há chão. Por mais odioso que Lula possa parecer ao grupo não fanático da seita, é uma questão saber o que esses antipetistas acham da barbárie brasiliense deste domingo.

Bolsonaro, covardemente curtindo suas férias na Flórida, sempre poderá dizer que nada teve a ver com o ímpeto de seus seguidores. Boa sorte com isso, até porque a porta está aberta agora a uma reação ainda mais dura da Justiça, que poderá ao fim beneficiar Lula.

Com o vandalismo em Brasília, de resto macaqueado de forma pálida ante a confusão de dois anos e dois dias atrás em Washington, o presidente tem todos os elementos para criminalizar a oposição bolsonarista.

Será difícil para deputados reticentes da centro-direita não ideológica apoiarem as cenas medonhas na capital do país.

A mais recente memória de ataque a símbolos das instituições do Brasil remontam a 2013, quando vândalos atearam fogo no Itamaraty e subiram na mesma cobertura do Congresso hoje atacada por bolsonaristas —em números muito mais vultosos. A situação é muito diferente hoje: falamos de aderentes golpistas de um perdedor em eleição.

Não haverá Arthur Lira, para usar um ícone do centrão, a apoiar o que aconteceu neste domingo em Brasília. Isso poderá ser usado por Lula em seu favor, mas não muda o essencial: o petista não tem controle pleno da inteligência de suas Forças Armadas e tem na leniência de governadores um flanco exposto altamente perigoso.

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