Descrição de chapéu ataque à democracia

Mensagens mostram que Ibaneis e PM subestimaram radicais no 8 de janeiro

Governador afastado do DF disse ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, que não haveria 'problemas'

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Brasília

Mensagens analisadas pela Polícia Federal indicam que o governador afastado Ibaneis Rocha (MDB) e o comando da Polícia Militar do Distrito Federal minimizaram os indícios de que apoiadores de Jair Bolsonaro (PL) invadiriam os prédios dos três Poderes no dia 8 de janeiro.

"Já estamos mobilizados. Não teremos problemas", afirmou o governador no dia anterior por meio de aplicativo de mensagem após ser procurado por Rodrigo Pacheco (PSD-MG), presidente do Senado.

As informações constam em relatório da PF que analisou as conversas de Ibaneis.

"De alguma forma, a Polícia do Senado repassou informações ao seu presidente quanto à preocupação de invasão dos prédios públicos dos três Poderes. Ibaneis informa que estão mobilizados, que não haverá problemas e que todo o efetivo estará na rua para apoio", diz trecho do relatório.

Vândalos golpistas invadem a praça dos Três Poderes e depredam os prédios - Gabriela Biló/Folhapress

Outro indício de que o risco foi minimizado colhido pela PF ocorreu também no dia 7. O ministro da Justiça, Flávio Dino, questionou Ibaneis após ele afirmar ao site Metrópoles que as manifestações estavam liberadas na Esplanada desde que de forma pacífica.

Às 21h11, Dino encaminhou para Ibaneis ofício em que aponta para intensa movimentação e bolsonaristas e para a possibilidade de "ações hostis". O ministro questionou onde seriam os pontos de bloqueio e qual a atuação das forças de segurança do DF para o dia seguinte.

"Segundo relatos, o referido movimento teria a intenção de promover ações hostis e danos contra os prédios dos ministérios, do Congresso, do Palácio do Planalto, do Supremo Tribunal Federal, e, possivelmente, de outros órgãos como o Tribunal Superior Eleitoral", dizia o ofício.

Em resposta a Dino, Ibaneis encaminhou um informativo no qual se dizia: "situação tranquila, no momento."

De acordo com a perícia feita no celular de Ibaneis, a presidente do STF (Supremo Tribunal Federal) foi uma das primeiras pessoas a falar com o governador afastado após o início da invasão. Rosa Weber enviou mensagens a ele quando golpistas começaram a invadir os prédios dos três Poderes. "Já entraram no Congresso!", escreveu Rosa.

O governador afirmou ainda que estava cuidando do caso e encaminhou à ministra o contato do delegado Fernando de Sousa Oliveira. Rosa Weber afirma que o contato com o governador afastado foi feito porque o então Secretário de Segurança Pública do Distrito Federal, Anderson Torres, estava em férias.

A PF diz no relatório que a investigação "não revelou atos do governador Ibaneis em mudar planejamento, desfazer ordens de autoridades das forças de segurança, omitir informações a autoridades superiores do governo federal ou mesmo de impedir a repressão do avanço dos manifestantes durante os atos de vandalismo e invasão".

Além do governador afastado, integrantes da Segurança Pública também minimizaram a situação, segundo mensagens recuperadas pela polícia.

No dia 6, data em que o planejamento da segurança seria discutido, a coronel da PM Cintia Queiroz, à frente da Subsecretaria de Ações Integradas, enviou mensagem ao então secretário-executivo da Segurança Pública, Fernando Sousa Oliveira, que responderia pela pasta em razão da viagem de férias aos Estados Unidos do titular à época dos fatos, Anderson Torres.

"Cintia então passa, ao que parece, a tranquilizar Fernando acerca da reunião que não participariam dizendo que estariam (possivelmente a PMDF) acostumados a 'fazer', em alusão a eventos de manifestações na Esplanada dos Ministérios", afirma outro trecho do relatório.

A PF captou duas conversas entre Torres e Oliveira. Na primeira, no dia 7, o titular da Segurança Pública do DF pediu ao interino que deixasse Ibaneis atualizado sobre os manifestantes.

No dia seguinte, com os ataques já deflagrados pelos apoiadores de Bolsonaro, Torres voltou a escrever para o substituto. Desta vez, compartilhou mensagens recebidas em um grupo formado por autoridades locais e anotou: Não deixe chegar no Supremo".

Em depoimento à PF na terça-feira (7), o major Flávio Silvestre de Alencar, que no dia dos atos antidemocráticos respondia pelo batalhão responsável pela região da Esplanada, disse que o número de policiais não era suficiente para conter os manifestantes.

Ele afirmou que se fosse uma situação na qual não houvesse quebra da ordem pública o efetivo de policiais que estava sob seu comando —cerca de 310, segundo ele— seria suficiente.

"Se tivesse havido qualquer informação a respeito da radicalidade dos manifestantes o efetivo de policiais teria que ser superior. Aliado a isso, desses policiais, cerca de 178 eram oriundos do curso de formação, ou seja, sem qualquer experiência de campo, razão pela qual os empregou em tarefas nas quais não requeressem grande experiência policial", diz trecho do depoimento.

Também na última terça, a PF realizou uma série de prisões na quinta fase da operação Lesa Pátria. Entre eles estavam o major Alencar e o coronel Jorge Eduardo Naime Barreto, então chefe do Departamento Operacional da PM do DF. Ele estava de folga no dia dos atos.

O coronel, no entanto, entrou na mira dos investigadores após o ex-comandante-geral da Polícia Militar do DF Fabio Augusto Vieira afirmar em depoimento tê-lo encontrado no local dos ataques golpistas. Segundo a versão de Vieira, o coronel disse que foi ao local para ajudar.

Além do coronel, foram presos o major Flávio Silvestre de Alencar, o capitão Josiel Pereira César e o tenente Rafael Pereira Martins.

No caso do coronel, a prisão decretada foi preventiva, sem prazo para terminar. Os outros foram presos de forma temporária.

Pesou contra Naime uma suspeita de plano de fuga denunciada pela ex-mulher. Segundo ela, o coronel planejava viajar. Após tomar conhecimento por um dos filhos, a ex-esposa procurou Naime e teria sido agredida pela atual companheira dele. O ocorrido foi registrado em um boletim de ocorrência.

Outro ponto considerado gravíssimo pelos investigadores e que sustenta os pedidos de prisão é a falta de planejamento operacional da PM para o dia 8.

Também nesse caso, era o setor até então comandado por Naime o responsável pela elaboração e implementação do plano, o que não teria ocorrido para o dia dos ataques.

A PF também cita o fato de a tropa estar sem o efetivo necessário para conter a investida golpista dos bolsonaristas e sem comando eficiente para organizá-la contra os golpistas.

Também é citado no pedido o fato de PMs estarem de férias ou licença na data. A Folha apurou que havia uma proibição para esses benefícios até o dia 9 de janeiro.

Naime, por exemplo, estava de folga no dia, embora tenha sido visto no local pelo ex-comandante Fabio Vieira.

Como mostrou a Folha, foi o atual comandante da PM do Distrito Federal, Klepter Rosa Gonçalves, o responsável por autorizar dias de folga do coronel.

Klepter Gonçalves assumiu o comando da PM após o 8 de janeiro, escalado pelo interventor na segurança pública do Distrito Federal, Ricardo Cappelli.

No dia 5, ainda como subcomandante-geral da PM, ele assinou requerimento autorizando o afastamento total de Naime do serviço entre 3 e 8 de janeiro.

As prisões dos PMs do DF foram cumpridas no inquérito conduzido pela PF que investiga a possível omissão de autoridades durante os ataques. Além das quatro prisões, foram realizados mandados de busca e apreensão expedidos pelo STF (Supremo Tribunal Federal) em seis endereços.

Para além dessa linha das autoridades omissas, os ataques também são investigados na PF em outras três frentes.

Uma mira os possíveis autores intelectuais, e é essa frente que pode alcançar Bolsonaro. Outra visa mapear os financiadores e responsáveis pela logística do acampamento e transporte de bolsonaristas para Brasília.

O terceiro foco da investigação PF são os vândalos. Os investigadores querem identificar e individualizar a conduta de cada um dos envolvidos na depredação dos prédios históricos da capital federal.

Colaborou o UOL

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