Descrição de chapéu Governo Lula

Lula 3 completa 100 dias sob cobrança para acelerar ações e crítica por falta de marca

Aliados se queixam de demora em projetos, com nomeações e verbas travadas; gestão fala em reconstrução após Bolsonaro

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Brasília

O governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) completa cem dias sob críticas de aliados, que reclamam de entraves para deslanchar projetos e da falta de uma nova marca ao terceiro mandato do petista.

Até então, apontam ministros e parlamentares que apoiam Lula, o governo reciclou programas antigos e foi palco de embates entre expoentes da equipe ministerial, que se desentenderam publicamente sobre o lançamento de propostas do governo.

Auxiliares do presidente afirmam que o slogan do governo é "União e Reconstrução", o que justifica o relançamento de iniciativas de gestões anteriores, como o Minha Casa, Minha Vida e o Bolsa Família, retomado no lugar do Auxílio Brasil, e que eles voltaram turbinados.

Alegam que houve retrocesso no governo Jair Bolsonaro (PL) e que a fome recrudesceu no país.

Esses colaboradores de Lula dizem que os últimos meses foram para "arrumar a casa" e que novos projetos serão lançados depois dos cem dias. Segundo integrantes do núcleo de governo, nesta segunda-feira (10), por exemplo, Lula terá reunião com ministros em que reforçará o que já foi anunciado, mas não deve ser apresentada nenhuma novidade.

Parlamentares e até ministros, porém, apontam uma demora excessiva para colocar a máquina federal para trabalhar. A reclamação é que ainda há cargos vagos a preencher e que pouca verba foi desembolsada. Essa morosidade é apontada por integrantes do Congresso Nacional como elemento da dificuldade do governo para formar uma base de apoio.

Apesar da justificativa sobre a falta de uma nova marca com a ideia de que o slogan do governo é de reconstrução, o próprio Lula tem expressado ansiedade. Na semana passada, ele cobrou de ministros agilidade na entrega de projetos, assim como a ampla divulgação dos programas durante a execução.

A própria centralização das decisões pelo presidente e pelo ministro da Casa Civil, Rui Costa (PT), é apontada como um dos fatores que geram demora na execução de tarefas no governo.

Em mais de uma ocasião, Lula fez questão de reforçar publicamente que todas as políticas do governo precisam passar pelo seu aval e da Casa Civil. Em uma delas, o presidente disse ser importante que nenhum ministro anuncie "genialidades" sem o crivo do Planalto.

"É importante que nenhum ministro ou ministra anuncie publicamente qualquer política pública sem ter sido acordado com a Casa Civil, que é quem consegue fazer com que a proposta seja do governo", afirmou em reunião ministerial de 14 de março.

As declarações foram dadas como forma de reprimenda do presidente a seus auxiliares. Nos últimos meses, por exemplo, já houve ao menos dois casos de chefes de pastas relevantes que anunciaram programas, que não foram lançados e, pior, desautorizados pelo presidente.

O ministro de Portos e Aeroportos, Márcio França, chegou a divulgar a intenção do governo de fechar acordo com companhias aéreas para vender passagens a R$ 200 por trecho a aposentados, estudantes e servidores públicos, em 13 de março. Depois do episódio, tanto o ministro da Casa Civil como Lula desautorizaram França.

O ministro do Trabalho, Carlos Lupi, anunciou, por sua vez, redução da taxa de juros dos empréstimos consignados concedidos a aposentados e teve que recuar.

Integrantes do Palácio do Planalto avaliam que esse tipo de atitude gera ruído desnecessário do governo com o mercado e o Congresso Nacional, pouco ajudando na governabilidade.

O fato de o ministério ser composto na maioria por ex-governadores e potenciais candidatos a cargos eletivos em 2026 é também apontado como uma fonte de inquietação interna.

Do total de 37 ministros, 8 já ocuparam função de governador. Integrantes do governo apontam que eles estavam acostumados a ter a palavra final sobre as decisões que tomavam. Agora, porém, precisam esperar aval da Casa Civil.

Isso gera, na avaliação de aliados de Lula, ansiedade nos titulares dos ministérios por não verem seus programas irem para frente na rapidez que desejam.

O ministério de Lula abriga ao menos quatro potenciais presidenciáveis para 2026: Rui Costa (Casa Civil), Geraldo Alckmin (Indústria e Comércio), Simone Tebet (Planejamento) e Fernando Haddad (Fazenda) são considerados pré-candidatos desde a campanha do ano passado.

Costa e Haddad, titulares das duas principais pastas do governo, já protagonizaram ao menos dois momentos de entrevero nesses cem primeiros dias. Um deles foi resultado de divergências sobre a política de desoneração dos combustíveis.

Na primeira fase, em janeiro, Rui Costa saiu vitorioso e conseguiu segurar a reoneração da gasolina e do etanol por 60 dias. Na segunda, em fevereiro, Haddad teve uma vitória parcial, conseguindo garantir a tributação sobre combustíveis.

Depois, ambos voltaram a se desentender, desta vez a respeito do marco fiscal. Haddad não mostrou a proposta antecipadamente ao ministro da Casa Civil, alegando, nos bastidores, temor de vazamento. Em seguida, Rui Costa pediu tempo para analisar o projeto.

O incômodo ficou tão evidente no governo que os dois tiveram de realizar um encontro e divulgá-lo para mostrar que haviam selado a paz.

As divergências entre Rui Costa e Haddad são tratadas como diferenças históricas entre as chamadas alas política e econômica, porém agravadas pelo fato de eles serem potenciais candidatos à Presidência.

Se ele próprio não disputar a reeleição em 2026, Lula vai definir o nome a ser endossado —e, até lá, aliados temem novos embates por protagonismo.

Integrantes do governo e do Congresso reclamam da demora para nomeações. O processo para formalizar uma contratação passa por análise da Casa Civil, da Abin (Agência Brasileira de Inteligência) e também da SRI (Secretaria de Relações Institucionais).

As análises são sobre o passado jurídico, criminal, profissional e também político da pessoa. Esse procedimento, sobretudo o de antecedentes políticos, acaba alongando o processo.

O próprio Lula pediu cautela nas nomeações e quer evitar que apoiadores ferrenhos de Jair Bolsonaro ocupem cargos considerados chaves no governo. Mas, sem as nomeações, bolsonaristas persistem acomodados na Esplanada.

No Congresso, a projeção também é de dificuldades. Hoje, na Câmara principalmente, o governo não tem uma base própria e está a reboque de aliados do presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL).

A partir da segunda quinzena de abril, o Planalto tentará aprovar no Congresso o novo marco fiscal, apresentado por Haddad.

O projeto, embora elogiado pelo mercado financeiro, enfrenta resistência no próprio partido de Lula, o que deve explicitar uma divisão no campo da esquerda a respeito da medida. A tendência é que ela seja aprovada porque será relatada por um aliado de Lira, o que significa que ela terá ampla maioria, mas que o texto final a ser aprovado não será exatamente o que o governo enviou.

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