É necessário criar formas para financiar o preço da passagem, dizem especialistas

Representantes dos candidatos à Presidência propõem novos tributos para carros e fundo para mobilidade

Na maioria das cidades brasileiras, o transporte público é bancado pela tarifa paga pelo usuário, e esse sistema é hoje insustentável.

Para que o transporte urbano se desenvolva e seja mais eficiente, é necessário criar outras formas de financiar o preço da passagem.

Em debate com especialistas e representantes de campanha de candidatos à Presidência, na quarta-feira (1º), algumas das principais propostas envolveram a taxação do transporte individual, a revisão da política de estacionamento grátis, a criação da “Cide Verde” e de um fundo para desenvolver a mobilidade.

Segundo o ex-secretário municipal de Transportes de São Paulo Jilmar Tatto, representante da candidatura do PT, o programa de governo do partido estuda maneiras de taxar o uso de veículos individuais, de forma que ajude a financiar o transporte coletivo.

Tatto, que é candidato ao Senado pelo estado de São Paulo, também propôs a utilização de recursos das Reservas Internacionais — dinheiro que o Brasil tem investido e guardado no Banco Central; é uma espécie de poupança do país, que soma US$ 379 bilhões.

Participantes do debate “E agora, Brasil? Transporte público”, realizado pela Folha com apoio da Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos, em SP - Folhapress

“A ideia é pegar 10% das Reservas Internacionais e, com outras parcerias, usar para investir em infraestrutura de transporte já no primeiro ano de governo”, afirmou Tatto.

O ex-secretário falou durante o debate “E agora, Brasil? Transporte público”, realizado pela Folha com apoio da NTU (Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos). O evento fez parte da programação do Seminário Nacional NTU 2018, sediado na Feira Latino-Americana do Transporte, em SãoPaulo.

Para compor a mesa, a Folha contatou dez campanhas de candidatos à Presidência, das quais quatro enviaram representantes. O debate teve a mediação do jornalista da Folha Fabrício Lobel.

Vaias marcaram o início do debate, quando o ex-secretário se apresentou como representante da campanha do ex-presidente Lula (PT)e fez críticas ao PSDB e seus aliados.

Entre o público presente, de cerca de 500 pessoas, houve quem gritasse o nome do capitão reformado e candidato à Presidência Jair Bolsonaro (PSL), quem falasse “Dilma acabou com o Brasil” e quem pedisse para que a mesa não discutisse política.

De acordo com o coordenador de transporte público e desenvolvimento urbano do ITDP Brasil (Instituto de Políticas de Transporte e Desenvolvimento), Gabriel Oliveira, parte do dinheiro investido em frotas de veículos individuais poderia estar sendo usada em ações para desenvolver o transporte coletivo. 

“Propostas como a de mudar a destinação do IPVA, a criação da ‘Cide Verde’ e a taxação de estacionamentos podem ajudar a criar um modelo de subsídio no qual o meio de transporte menos sustentável favoreça o mais sustentável”, afirmou Oliveira.

A “Cide Verde” é uma Proposta de Emenda à Constituição que cria uma alíquota sobre a venda de combustível, com o objetivo de financiar o transporte coletivo. Ela está em tramitação na Câmara.

O ex-secretário estadual de Transportes Metropolitanos de São Paulo, Jurandir Fernandes, que falou como representante da campanha do PSDB à Presidência, também defendeu o aumento de custo para o uso de veículo individual.

“A Cide, embora seja vista como mais um imposto, tem impacto de flacionário. O que ela agrega no preço sobre o combustível retira quando abaixa o valor da passagem”, disse Fernandes.

Oliveira também sugereque a taxação de aplicativos de transporte, como Uber e Cabify, pode ser convertida em financiamento direto para o transporte coletivo.

De acordo com Fernandes, É necessário criar formas para financiar o preço da passagem, dizem especialistas. Representantes dos candidatos à Presidência propõem novos tributos para carros e fundo para mobilidade esses aplicativos, em vez de serem tratados como inimigos, deveriam ser usados como exemplo para o transporte coletivo, até mesmo incluindo algumas de suas funcionalidades em linhas de ônibus já existentes.

Para que as tecnologias emergentes sejam implantadas no transporte público, no entanto, Fernandes afirmou que é necessária uma adaptação no modelo de contrato de concessões, para dar a quem opera hoje maior flexibilidade e capacidade de inovar.

Para Wagner Fajardo, representante da campanha do PC do B e coordenador-geral do Sindicato dos Metroviários de São Paulo, uma solução para o problema do financiamento é criar um fundo monetário nacional voltado para o setor de transporte.

Em São Paulo, o usuário arca com 50% do custo da passagem, e a prefeitura subsidia 38%.O restante (12%) vem de outras receitas, como vale-transporte. Em outras capitais, no entanto, como Rio de Janeiro e Belo Horizonte, os usuários ainda arcamcom o valor total da tarifa.

O secretário de coordenação de projetos do Programa de Parcerias de Investimentos do governo federal, Tarcísio de Freitas, que representou a campanha do MDB, ressaltou que é papel do governo o fomento de projetos qualificados de mobilidade urbana.

“O Ministério do Planejamento criou um fundo que já ajudou a desenvolver projetos de tratamento de esgoto,resíduossólidoseiluminaçãopública.Nenhumprojetodemobilidadefoiviabilizadoainda porque não recebemos algum que tivesse qualificação para isso”, afirmou Freitas.

A discussão em torno dos subsídios ao transporte coletivo brasileiro trouxe ao debate opiniões polarizadas. De um lado, a defesa pela ampliação da gratuidade do transporte público; do outro, os que alertam que “não existe almoço grátis”.

“Deve-se ampliar esse direito, não reduzir. Temos de viabilizar transporte para todos. Não é só quem pode pagar tarifa que tem direito”, afirmou Fajardo, do PC do B.

O petista Jilmar Tatto sustentou o mesmo ponto de vista. “Transporte deveria ser público, gratuito e universal. Evidentemente, o investimento tem de ser público”, disse, em alusão ao modelo de funcionamento do SUS no país.

O tucano Jurandir Fernandes, por sua vez, apoiou corte de beneficiários a partir de avaliação socioeconômica. “Não basta fazer populismo desbragado. Direitos precisam ser vistos através do prisma da necessidade”,afirmou

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