Descrição de chapéu Desafios do Ensino Superior

Nos EUA, cresce a dúvida sobre o valor real da universidade

Preços altos, perspectivas ruins e polarização política alimentam ceticismo, diz Liz McMillen

Liz McMillen, editora a publicação The Chronicle of Higher Education, faz palestra durante seminário Desafios do Ensino Superior
Liz McMillen, editora da publicaçãoThe Chronicle of Higher Education, faz palestra durante seminário Desafios do Ensino Superior - Reinaldo Canato / Folhapress
Camila Gambirasio
São Paulo

A principal questão a ser enfrentada pelas universidades americanas é a crescente onda de dúvidas sobre a validade de investir ou não em um diploma universitário, avalia a jornalista Liz McMillen, editora do The Chronicle of Higher Education, principal publicação voltada ao ensino superior nos Estados Unidos.

O questionamento é impulsionado por fenômenos como o aumento constante do valor dos cursos, o endividamento progressivo dos estudantes e as perspectivas ruins de empregabilidade, além da polarização política.

“A ideia de que o ensino superior é essencial para a democracia e a cidadania parece estar se enfraquecendo no país”, declarou McMillen em palestra durante o seminário Desafios do Ensino Superior.

Nos EUA, tanto universidades públicas como privadas cobram pelo ensino e, segundo dados da consultoria Bloomberg, as anuidades cresceram 1.120% entre 1978 e 2012.

A alta superou em cerca de quatro vezes o aumento da inflação do período, alimentando o juízo de que a educação superior está completamente fora de alcance para grande parte da população.

Ao mesmo tempo, desde a crise de 2008, grande parte dos graduados acaba trabalhando em empregos que não requerem diploma.

“O que passa na cabeça das pessoas é: por que vou me endividar em até US$ 50 mil para continuar tendo dificuldade de obter um bom emprego?”, descreveu McMillen.

A polarização política, agravada desde as eleições de 2016, contribui para a desconfiança. 

Segundo o Pew Research Center, 58% do eleitorado republicano acha que as universidades exercem um efeito negativo nos EUA. Os campi impõem ao país uma agenda ideológica de esquerda, dizem outras pesquisas.

Nesse cenário, ganham protagonismo outras formas de certificação acadêmica, como cursos online, certificados e programas de educação continuada.

McMillen afirmou que o país vem percebendo, também desde 2008, quedas acentuadas nas graduações de humanidades em favor das áreas STEM (acrônimo em inglês para ciências, tecnologia, engenharia e matemática).

“Os alunos procuram o caminho que consideram mais seguro para o mercado de trabalho, mas na verdade muitos recrutadores querem pessoas que sabem escrever, pensar e resolver problemas, capacidades bastante relacionadas ao estudo de humanidades.”

A tendência influencia as grades curriculares das faculdades, o trabalho de pesquisa e o progresso do conhecimento de determinadas áreas, culminando na exclusão de cursos como filosofia e história.
Para piorar, espera-se na próxima década um aperto no financiamento, provocado em parte por declínio de 15% a 20% nas matrículas.

Por tudo isso, as instituições passaram a se dedicar não apenas a atrair alunos, mas a tentar garantir que não abandonem seus cursos e tenham condições de planejar suas carreiras: oferecem orientação profissional, oportunidade de estágios e opções para aprender na prática. 

“Algumas instituições têm sido inovadoras ao usar análises de dados e big data para intervir e oferecer ajuda aos estudantes quando necessário, vendo se algum aluno andou perdendo aulas ou obtendo baixo desempenho nos testes”, afirmou a jornalista.

O seminário Desafios do Ensino Superior foi realizado pela Folha nesta quarta-feira (26), em São Paulo, com patrocínio da Unip.

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