Descrição de chapéu Voluntariado na Educação

ONG ensina inglês e ajuda aluno carente a estudar no exterior

Soul Bilíngue tem professores, mentores e psicólogos voluntários, além de parcerias com instituições estrangeiras

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Lisandra Matias
São Paulo

Ex-estudante de escola pública, filha de uma manicure e de um auxiliar de almoxarifado, a jornalista Ariane Noronha, 31, fez sua primeira viagem internacional em 2014. Passou um ano e meio nos Estados Unidos, onde trabalhou como au pair (babá).

A experiência, que ela considera transformadora, deu origem, anos depois, à Soul Bilíngue, uma rede de voluntários que oferece atividades relacionadas ao aprendizado da língua inglesa e à orientação sobre possibilidades acessíveis de intercâmbio e bolsas de estudo no exterior para jovens de baixa renda.

"Minha vivência fora do país foi muito impactante. Quando voltei, queria ajudar as pessoas que também vieram de escolas públicas a enxergar o mundo como eu pude enxergá-lo", diz Ariane, fundadora e dirigente da Soul Bilíngue.

Criada em 2018, a organização já atendeu mais de mil jovens e possibilitou 15 viagens de estudo para países como Austrália, Nova Zelândia, Malta, Canadá, África do Sul e Inglaterra. Para o próximo ano, a previsão é de embarcar, no mínimo, 30 estudantes.

O programa está estruturado no trabalho voluntário em três frentes: aulas de inglês, mentoria e atendimento psicológico.

Inicialmente, as aulas semanais aconteciam presencialmente, em instituição parceira de Poá, e depois em sede própria, em Mogi das Cruzes, ambas na região metropolitana de São Paulo. O formato online adotado na pandemia tornou possível ampliar o programa de 50 para 300 atendidos por semestre.

Além das aulas, os jovens se conectam individualmente com mentores brasileiros e estrangeiros, que os acompanham remotamente durante os seis meses do programa.

São mais de 280 voluntários —a maioria está no Brasil, mas também há mentores em países como Irlanda, Estados Unidos, México, Portugal e Bélgica. São pessoas que disponibilizam até cinco horas mensais para ajudar na prática do idioma, tirar dúvidas e orientar os alunos.

O trabalho de acompanhamento psicológico, que já acontecia em encontros mensais, foi intensificado a partir da pandemia, graças à formação de uma rede de psicólogos voluntários que também atendem remotamente.

Para Ariane, a Soul Bilíngue não é simplesmente um cursinho de inglês. "Ela chega para ampliar os horizontes dos jovens com novas ferramentas, preparando-os para o mundo."

Brasileiros que já viveram fora do Brasil, por exemplo, acabam virando referência para esse jovem, que se espelha no mentor. "Não adianta falar de intercâmbio, de viagem e de potencializar essas pessoas se elas não tiverem apoio ou preparo psicológico para o choque cultural", afirma.

O programa não garante a viagem de estudo no exterior. Há uma espécie de ranking para a distribuição das bolsas, que considera critérios como desempenho nas provas, assiduidade, participação nas mentorias, entregas de lições e engajamento nos desafios individuais e em grupo, como as campanhas de arrecadação de fundos.

Nessas ações, que são a maior fonte de receita da organização, o aluno ganha pontos no ranking a cada doação.

As bolsas de estudo no exterior incluem curso de quatro semanas e acomodação em casa de família ou residência estudantil. São oferecidas por escolas de idiomas, como Good Hope Studies, na África do Sul, English Path e LAL Schools, na Inglaterra, e ATC Language Schools, na Irlanda.

"As bolsas não representam custo para a Soul Bilíngue. Nós captamos os parceiros e, em contrapartida, trabalhamos na divulgação dessas instituições", afirma a dirigente.

Em abril deste ano, Rebeca Oliveira, 22, passou um mês na Cidade do Cabo, África do Sul. "Posso dizer que a Soul conseguiu mudar parte da Rebeca que eu era antes. Sempre fui pobre, de família simples, mas voltei da viagem com outro pensamento, uma visão bem mais ampla de onde posso chegar", diz a jovem, que pretende estudar medicina e fazer trabalho voluntário.

"Tive um aprendizado muito grande de que eu sou capaz, conquistei uma coisa que sempre sonhei. Então, eu posso e tenho capacidade de conquistar muito mais."

Uma das mentoras do programa, a analista de TI Jade Carvalho Lanziloti, 29, vive atualmente em Limerick, Irlanda, para onde foi a trabalho em 2019. Vinda de família simples, ela diz que isso foi possível graças ao apoio recebido de muitas pessoas, o que a levou a ser voluntária na Soul.

"Acho que é um dever de todos nós, que temos a possibilidade de viver experiências diferentes, encontrar formas de expandir essa oportunidade para outras pessoas."

Entre os critérios do processo seletivo para participar do programa da Soul Bilíngue estão ter entre 18 e 26 anos, morar nas regiões Sudeste e Nordeste, ter cursado todo o ensino médio em escola pública, possuir renda bruta per capita de até R$ 2.200 e nunca ter feito intercâmbio internacional. Para o 1º semestre de 2022 serão 330 vagas.

De acordo com Ariane, em cada edição do programa, de 70% a 75% dos jovens são meninas e 60% se autodeclaram pretos ou pardos. Do total de bolsas disponíveis, 25% são destinadas a alunos autodeclarados pretos e pardos.

"A gente preza muito isso. Não adianta falar em diversidade e viajar para o exterior se não trouxermos essa diversidade e representatividade também."

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