Descrição de chapéu
Sabatinas Saúde

Faltam às campanhas presidenciais metas claras para aumentar o financiamento da saúde

Tema que mais preocupa os brasileiros, segundo Datafolha, saúde foi debatida durante sabatinas promovidas pelo jornal

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

São Paulo

A saúde é o tema que mais preocupa os brasileiros, mas as campanhas dos candidatos à Presidência mais bem colocados nas pesquisas eleitorais não informam metas objetivas para enfrentar um dos principais problemas da área, o subfinanciamento do SUS.

Os gastos públicos em saúde estão na ordem de 3,8% do PIB, e correspondem à metade da média dos países integrantes da OCDE (Organização para a Cooperação de Desenvolvimento Econômico). Já os gastos privados, especialmente os das famílias com planos de saúde e medicamentos, atingem 6,2%.

Claudia Collucci, repórter especial de saúde da Folha, media sabatina sobre saúde promovida pela Folha
Cláudia Collucci, repórter especial de saúde da Folha, media sabatina sobre saúde promovida pela Folha - Gabriel Cabral/Folhapress

Em um ciclo de sabatinas realizadas pela Folha, a campanha de Lula (PT) garantiu que haverá aumento dos gastos públicos, com objetivo de torná-los superiores aos gastos privados, mas não definiu um percentual do PIB ou prazo para atingi-lo. Já a campanha de Bolsonaro não participou dos debates e não também não respondeu às perguntas enviadas.

A campanha de Ciro Gomes (PDT) se compromete em elevar os gastos públicos em saúde a 6% do PIB, mesma meta que consta em um pacto firmado em 2014 entre o Brasil e outros países e a Opas (Organização Panamericana de Saúde). Simone Tebet (MDB) promete atingir 5% nos próximos quatro anos e 6% até 2030.

Ainda como fonte de financiamento, as campanhas de Lula e de Ciro se comprometeram em revogar o teto de gastos (Emenda Constitucional 95, de 2016), que estabeleceu que, por um período de 20 anos, recursos da saúde fossem corrigidos apenas pelo IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) do ano anterior. Esse congelamento já retirou quase R$ 37 bilhões do SUS entre 2018 e 2022, em relação à regra anterior.

Tebet defende que os recursos extras direcionados à saúde durante a pandemia sejam mantidos por até dois anos para dar conta do represamento de cirurgias e procedimentos eletivos, que passam de 900 mil, segundo estimativas da Fiocruz. Ambas as iniciativas, porém, dependem de aval do Legislativo.

Favoráveis a uma reforma tributária, Tebet e Ciro prometem aumentar impostos sobre produtos que podem ser danosos à saúde, como alimentos ultraprocessados e as bebidas alcoólicas, medidas que fazem parte de políticas públicas recomendadas pela OMS (Organização Mundial da Saúde) e outros organismos internacionais. Já a campanha de Lula diz que o tema será estudado pela equipe econômica.

Os presidenciáveis também concordam com a necessidade de melhorar a eficiência do SUS por meio de uma atenção primária mais bem qualificada e conectada aos demais níveis de atenção à saúde, como os ambulatórios e os hospitais, que trabalhariam em redes regionais.

Uma das principais ferramentas é a digitalização dos dados em saúde, que possibilitaria o tão esperado prontuário eletrônico do paciente, e o uso da telemedicina, que agilizaria o acesso a médicos especialistas, outro grande gargalo do SUS.

Porém, para que isso ocorra, será preciso garantir que as todas as UBSs tenham acesso adequado à internet. Pesquisa da Fiocruz realizada em 2020 mostrou que embora tenha aumentado o número de UBSs com internet, só 40% dos profissionais relatam que dispõem de uma boa conexão que possibilite, por exemplo, uma teleconsulta.

Também é necessária uma interligação entre os diversos sistemas de informação existentes nas secretarias municipais, estaduais e Ministério da Saúde.

Isso facilitaria, inclusive, a criação de uma nova lógica de remuneração baseada em resultados e não apenas em volume de procedimentos como ocorre atualmente.

Para enfrentar a falta de médicos, a campanha de Lula também propõe a reedição do Programa Mais Médicos, que ganharia um outro nome, para suprimir áreas onde há vazios assistenciais. A ideia não é recorrer aos médicos cubanos, como na versão passada, mas sim atrair profissionais brasileiros, por meio da residência médica, oferecendo melhores condições de trabalho no SUS.

O desafio é grande. A começar pelo fato de que há muita oferta de trabalho médico no setor privado, que temsalários mais competitivos do que os da rede pública.

Uma das ideias discutidas pela campanha de Lula é a criação de uma carreira médica federal. Mas médico sozinho não faz verão. Nas regiões remotas também faltam enfermeiros, fisioterapeutas, dentistas, entre outros profissionais da saúde. Seria preciso uma ampla revisão na política de recursos humanos do SUS, que envolva treinamento e capacitação, tema que ainda carece de mais atenção nos planos de governo dos presidenciáveis.

Os representantes dos candidatos também defendem a promoção de grandes campanhas nacionais para aumentar a cobertura vacinal e impedir a volta de doenças erradicadas. Só 67% das crianças foram vacinadas em 2021 contra a poliomielite ante uma meta de 95%.

Entre as estratégias anunciadas estão a oferta de vacinas dentro das escolas, a exigência da caderneta de vacinação para a matrícula escolar e nos programas de transferência de renda, além da ampliação do horário de funcionamento das UBS. Todas são válidas, mas é preciso adequá-las de acordo com a realidade de cada região.

Os presidenciáveis estão cientes de que novas epidemias virão e que o país precisa estar mais bem preparado para combatê-las, com seus sistemas de vigilâncias sanitária e epidemiológica fortalecidos, mas, de novo, faltam projetos consistentes de enfrentamento. A que mais avança neste sentido é a campanha de Simone Tebet, que propõe transformar a Secretaria de Vigilância em Saúde em uma agência aos moldes da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária).

Reconhecida como uma das melhores do mundo, a Anvisa registra um declínio do número de servidores e chegou neste ano ao nível mais baixo desde 2010.

O INPI (Instituto Nacional de Propriedade Industrial) e a ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) também vivem situação semelhante.

A campanha de Lula diz que abrirá concursos públicos para repor esses quadros.

Reforçar a estrutura dessas instituições também é importante para o fortalecimento do complexo industrial da saúde. Atualmente, 95% dos insumos farmacêuticos consumidos no Brasil vêm de fora, da China e da Índia. Com a pandemia de Covid, que elevou o consumo de medicamentos, o aumento do dólar e a guerra entre a Rússia e a Ucrânia, o país passou a enfrentar desabastecimento de remédios e de outros produtos.

O assunto, que também envolve pesquisa e inovação, extrapola os limites da saúde. Depende também de outros ministérios, como o da Economia, da Ciência e Tecnologia e da Justiça. A campanha de Ciro Gomes propõe deixá-lo a cargo da Casa Civil e torná-lo uma questão interministerial, uma política de estado.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.