Críticas forçam novo discurso das big techs

Líderes de tecnologia mudam discurso e assumem responsabilidade em Davos

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Sam Schechner
Davos | The Wall Street Journal

Empresas como Facebook, Google, da Alphabet, Microsoft e Amazon vêm enfrentando oposição cada vez forte ao seu tamanho e poder que não param de crescer.

Ao longo do ano passado, políticos, consumidores e parceiros de negócios expressaram preocupações quanto ao tamanho dessas empresas, a maneira pela qual tratam dados pessoais e o potencial da inteligência artificial para destruir empregos e distorcer decisões.

Na semana passada, durante o Fórum Econômico Mundial em Davos, executivos de tecnologia admitiram que muitas das críticas procedem, e disseram ter maior responsabilidade por mitigar os perigos daquilo que suas empresas criaram.

"Há muita preocupação e ansiedade sobre as empresas de tecnologia, o poder das empresas de tecnologia", disse Sherryl Sandberg, vice-presidente de operações do Facebook, em uma palestra lotada, em Davos.

Sheryl Sandberg, chefe de operações do Facebook; junto a outros líderes, ela adotou discurso menos otimista em relação a outros fóruns mundiais
Sheryl Sandberg, chefe de operações do Facebook; junto a outros líderes, ela adotou discurso menos otimista em relação a outros fóruns mundiais - Lino Mirgeler/AFP

"Vivemos uma fase de verdadeira preocupação com os males causados, e muitas dessas preocupações são legítimas. Precisamos fazer um trabalho melhor."

É uma mudança considerável de tom, ante a situação que existia alguns anos atrás.

Durante muito tempo, os executivos de tecnologia se reuniram com líderes empresariais e representantes de governos, em Davos e outros foros. Eles projetaram confiança ilimitada em que suas tecnologias estavam tornando o planeta um lugar mais aberto e próspero.

Agora, embora mantenham o otimismo que vê a tecnologia como uma força que promove o bem, as empresas estão começando a acatar a ideia de mais regulamentação, e vêm falando em obrigações sociais maiores.

"Com o tamanho que atingimos, temos a compreensão de que é preciso um senso maior de responsabilidade, responsabilidade para com as comunidades nas quais operamos", disse Ruth Porat, vice-presidente de finanças da Alphabet.

"Como garantir que a tecnologia seja de fato uma força democratizante? Essa é uma das áreas a que estamos dedicando tempo considerável."

Embora as empresas de tecnologia afirmem que continuam a enfrentar concorrência feroz em muitos dos setores em que operam, seu tamanho se tornou um tópico importante para os líderes empresariais esta semana.

A queda das ações de tecnologia reduziu um pouco o valor de mercado vertiginoso das maiores empresas do setor, mas isso não significa que a oposição às mais poderosas delas vá se reduzir, disse Jacqueline Hunt, diretora de gestão de ativos e de seguros de vida da Allianz, a maior seguradora da Europa, no mercado dos Estados Unidos.

"Sem dúvida, se você contemplar as posições dominantes que algumas dessas empresas têm, elas a construíram ao atender necessidades dos consumidores, o que é admirável, de muitas maneiras", disse Hunt.

"Mas creio que cada vez mais gente considere que o tamanho imenso delas, e seu alcance global quase irrestrito, possam estar impedindo o acesso de rivais ao mercado."

Os anunciantes também expressaram preocupação sobre o tamanho do Facebook e do Google, que juntos devem abocanhar cerca de 52% dos gastos no mercado mundial de publicidade digital, em 2019, de acordo com o grupo de pesquisa eMarketer.

Compradores de publicidade dizem que as duas companhias são lugares em que se pode gastar dinheiro de maneira muito efetiva, mas acrescentam que gostariam que houvesse mais concorrentes de grande porte entre os quais escolher —tirando vantagem da competição.

"Eles merecem a posição que conquistaram, mas talvez tenham crescido demais", disse Maurice Levy, presidente do conselho do Publicis Group, companhia de publicidade. "Alguns clientes se preocupam um pouco porque gostariam de ter mais controle sobre seu dinheiro."

O controle sobre os dados é outra questão. David McKay, presidente-executivo do Royal Bank of Canada, o maior banco canadense por valor de mercado, diz que que os dados de que as empresas de tecnologia dispõem sobre os clientes dos bancos são um dos maiores desafios para o setor, em longo prazo.

Cada vez mais, "eles têm insights melhores sobre as vidas de nossos clientes do que nós temos", disse McKay.

As empresas de tecnologia vêm reagindo mais rápido, agora, aos pedidos dos governos por remoção de conteúdo extremista, disse Catherine De Bolle, diretora executiva da Europol, a agência policial da União Europeia.

"Em 85% dos casos, o setor privado faz o que pedimos", sem solicitar mais informações.

Enquanto isso, os executivos de tecnologia passaram a falar mais sobre os riscos potenciais das tecnologias de inteligência artificial que suas empresas vêm desenvolvendo —como o potencial de uso de sistemas de reconhecimento facial para fortalecer um Estado de vigilância.

O Google publicou um estudo com recomendações sobre a governança de sistemas de inteligência artificial, que incluem como garantir que a inteligência artificial tome decisões justas, e quem deve ser responsabilizado quando erros forem cometidos.

"Como criadores de inteligência artificial, precisamos estipular um conjunto de princípios de projeto que governe a equanimidade, segurança, prestação de contas e resistência" dos sistemas, disse Satya Nadella, presidente-executivo da Microsoft, em entrevista.

"Essas seriam coisas sem as quais, sem esses controles, poderíamos nos ver em um mundo distópico."

A mudança de tom foi especialmente notável no Facebook. A empresa foi muito criticada, especialmente no ano passado, por ser lenta demais em combater problemas como interferência em eleições, posts de incitação à violência e coleta indevida de dados sobre seus usuários por empresas externas.

Em Davos este ano, a empresa equipou seu espaço de reuniões, de dois andares, com telões que alardeiam as medidas tomadas para resolver seus problemas, como a ampliação a 30 mil pessoas do seu quadro de funcionários na área de segurança, o que inclui 15 mil moderadores de conteúdo.

Sandberg enfatizou essa mensagem, afirmando que a empresa está investindo bilhões de dólares ao ano em segurança.

"Adotamos uma abordagem fundamental diferente sobre como administrar a empresa", disse Sandberg em sua palestra. "Sabemos que precisamos reconquistar a confiança. E isso significa que temos de apresentar provas."

Tradução de Paulo Migliacci

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