Atores de Hollywood temem uso de inteligência artificial, e buscam novo acordo

Tecnologia pode ser usada em roteiros, dublagem e até vídeos

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Christopher Grimes
Los Angeles | Financial Times

O maior sindicato de Hollywood iniciará discussões sobre remuneração na era da inteligência artificial (IA) como parte das negociações contratuais com estúdios esta semana, debatendo como artistas humanos devem ser remunerados pelo trabalho de seus "dublês digitais".

As preocupações com o potencial disruptivo da IA abalaram os talentos de Hollywood, que temem que a tecnologia possa resultar em menos trabalhos para roteiristas, dubladores e outros. Os atores também estão preocupados em perder o controle de sua imagem, já que a tecnologia de IA tem sido usada para criar vídeos "deepfake", com imitações de atores como Keanu Reeves e Tom Cruise.

"Os rápidos avanços na IA generativa nos últimos 18 meses são algo que observamos em tempo real [e] já está afetando nossos membros", disse Duncan Crabtree-Ireland, negociador-chefe do sindicato dos atores SAG-Aftra.

O letreiro de Hollywood em Los Angeles, nos Estados Unidos - Mike Blake/Reuters

A SAG-Aftra se reuniu com seus colegas de estúdio de Hollywood nesta semana para começar a fechar um novo contrato de três anos. As negociações acontecem num momento tenso em Hollywood: o Sindicato de Escritores da América está em piquete há mais de um mês, e o SAG-Aftra pediu a seus membros que autorizem uma greve se um acordo não for alcançado até 30 de junho.

Se os atores entrarem em greve, será a primeira de seu sindicato desde 2000. Ela paralisaria Hollywood no momento em que os estúdios de cinema começam a se recuperar da pandemia. Um novo acordo de contrato foi fechado no domingo (4) entre os estúdios e o Sindicato de Diretores da América, que alguns esperam possa formar a base de um acordo com atores e roteiristas.

Uma das principais prioridades do sindicato de atores é garantir que haja "consentimento informado" sobre o uso de imagens criadas por IA dos artistas e que eles sejam pagos de forma justa pelo trabalho de seus dublês digitais, disse Crabtree-Ireland.

"Acho que não queremos ver nossos membros em uma corrida até o fundo com seus próprios dublês digitais", disse ele. "Todo o trabalho de nossos membros está sujeito a negociação acima de um certo mínimo [e] o ponto de partida seriam pagamentos em escala sindical" para imitações criadas por IA.

Advogados, produtores e executivos de agências de talentos dizem que esse tipo de acordo pode ser um ganho financeiro inesperado para as principais estrelas. Seria possível um ator ou atriz rodar um filme em locação, enquanto sua versão digital poderia ganhar dinheiro gravando um anúncio, dizem eles.

"Os atores (...) podem estar em vários lugares ao mesmo tempo, porque essas ferramentas podem ajudá-los a executar diferentes projetos em diferentes estágios", disse Hilary Krane, diretora jurídica da Creative Artists Agency.

Um negociador veterano de Hollywood acrescentou: "George Clooney provavelmente só pode produzir fisicamente dois ou três filmes por ano [mas com um dublê digital] talvez você possa colocá-lo em seis filmes. Contanto que ele receba um valor justo por isso, é definitivamente uma oportunidade".

Há menos otimismo em relação à IA por parte dos redatores de Hollywood, que temem que a tecnologia possa prejudicá-los. Essas preocupações aumentaram desde o lançamento do ChatGPT, em novembro, que demonstrou o potencial da IA generativa.

O Sindicato de Escritores se opõe ao uso de IA no processo de roteiro, exceto como ferramenta de pesquisa, disse Charles Slocum, diretor-executivo assistente do sindicato. "Ir além disso é imprudente", disse ele, rotulando os softwares de IA generativa de "máquinas de plágio".

A posição dos roteiristas sobre a IA –juntamente com suas preocupações sobre as práticas de remuneração trazidas pelo streaming– levou muitos a concluir que a greve pode durar até o verão.

"A principal preocupação [dos roteiristas] é que os estúdios vão substituí-los por IA", disse o veterano negociador de Hollywood. "Agora eles veem a questão da IA como uma coisa existencial."

O grupo que representa os estúdios e streamers, a Aliança de Produtores de Cinema e Televisão, ofereceu-se para realizar reuniões anuais sobre IA, dizendo que a tecnologia está avançando rápido demais para esperar os três anos entre negociações de contrato –proposta que foi recebida com desdém pelo sindicato dos escritores.

Ivy Kagan Bierman, advogada trabalhista do setor de entretenimento da Loeb & Loeb, disse que o tema da IA afastou ainda mais os estúdios dos sindicatos.

"Compreensivelmente, os estúdios não querem negociar algo que coloque obstáculos ao uso da tecnologia de IA", disse ela. "Do outro lado da mesa, você tem os roteiristas, diretores e atores que temem que essa tecnologia seja usada de maneiras que não são do seu interesse."

Ela defendeu uma força-tarefa em todo o setor para estudar o impacto da IA, mas a ideia não pegou. "A IA não é algo que devemos abordar por medo, nem a mesa de negociações é o melhor lugar para tentar inicialmente resolver preocupações", disse ela.

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

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