Mudar de buscador no celular não é tão simples quanto o Google pensa

Empresa afirma que mudança leva apenas alguns passos, mas um grupo de designers chegou a conclusões diferentes

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Brian X. Chen
The New York Times

Imagine se toda vez que você fosse ao supermercado seu carrinho de compras viesse carregado com a mesma caixa de cereal.

Acontece que esse cereal é o mais popular, então é conveniente para a loja deixá-lo no carrinho. Se você não gostar, é simples colocá-lo de volta na prateleira e pegar uma caixa diferente.

Essencialmente, essa é a defesa do Google contra o Departamento de Justiça dos Estados Unidos em um importante julgamento antitruste —o primeiro caso federal desse tema na era moderna da internet— que está se desenvolvendo agora no tribunal.

O governo acusa o Google de ilegalmente se juntar a fabricantes de dispositivos móveis, fabricantes de computadores e desenvolvedores de navegadores para sufocar concorrentes na busca online.

Logo do Google
Logo do Google - Arnd Wiegmann - 19.jul.2018/Reuters

Sob essas parcerias, argumenta o Departamento de Justiça, o Google tornou seu buscador o serviço padrão em uma maioria esmagadora de eletrônicos de consumo, incluindo smartphones. Isso então desencorajou as pessoas a experimentarem outros serviços alternativos, como Bing, da Microsoft, DuckDuckGo e outros.

Mas o Google argumentou que é fácil para as pessoas mudarem seu mecanismo de busca —tão simples quanto colocar uma caixa de cereal de volta na prateleira da loja.

O julgamento levanta questões sobre como e por que usamos a busca do Google. Muitos de nós crescemos fazendo pesquisas no Google porque parecia entregar os melhores resultados com o mínimo de esforço. Mas ficaríamos sabendo se algo melhor surgisse, já que o Google vinha configurado na maioria de nossos dispositivos? E mesmo se soubéssemos, continuaríamos usando o Google, já que seu mecanismo de busca estava definido como padrão?

Decidi testar a dificuldade de mudar para um mecanismo de busca diferente. Em um post em seu blog oficial neste mês, o Google disse que a mudança era um processo simples e ofereceu três exemplos:

  • Em um iPhone, são necessários quatro toques;
  • No navegador Safari de um Mac, são necessários dois cliques;
  • Em celulares Android, são necessários dois toques.

Então, segui as instruções do Google e também compartilhei as orientações da empresa com três veteranos em design. O veredito: é difícil mudar —e a maioria das pessoas provavelmente desistiria antes de concluir a mudança.

"Deus me ajude, estou morto", disse Ted Selker, um veterano em design de produtos que trabalhou na IBM e Xerox PARC, depois de ler as etapas para mudar o mecanismo de busca em um iPhone.

Harry Brignull, um consultor de experiência do usuário no Reino Unido, concluiu o seguinte sobre a busca do Google: "A maioria das pessoas simplesmente continuará usando".

Tive conclusões semelhantes. Aqui está o que os especialistas em design e eu descobrimos depois de tentar acabar com a busca do Google.

No iPhone

O Google disse que os proprietários de iPhones podem mudar para um mecanismo de busca diferente em quatro toques, abrindo o aplicativo Ajustes, tocando em Safari, tocando em Buscador e, em seguida, selecionando um alternativo.

Na realidade, é mais complicado.

Depois que o Ajustes é aberto, o Safari não aparece imediatamente na tela. Ele está escondido sob outros 36 itens de menu, então o usuário precisa deslizar para cima pelo menos duas vezes para encontrar as configurações do Safari. Na realidade, são necessários seis toques.

Mas mesmo quatro etapas provavelmente seriam demais para muitos de nós, disse Selker. Pode ter sido simples há 15 anos, quando a maioria das navegações na internet era feita em computadores de mesa, mas na era dos smartphones, alguém procurando essa configuração pode ser interrompido enquanto está em movimento —para pegar um ônibus, por exemplo.

"Você não pode esperar que as pessoas se lembrem de várias etapas", disse.

No Mac

Com apenas dois cliques, o Google disse que os usuários de Mac podem mudar o mecanismo de busca padrão no navegador Safari para um serviço diferente —primeiro clicando no ícone de lupa e depois selecionando um buscador diferente, como Yahoo, Bing ou DuckDuckGo.

Isso é muito mais simples do que em um iPhone. Mas nem todos sabem que o ícone de lupa é um botão —ele permite que as pessoas digitem uma consulta na barra de pesquisa.

Mais problemático é que a troca de buscador pode ser confusa, porque as etapas são inconsistentes entre o Safari em um iPhone e o Safari em um Mac, disse Tony Hu, diretor do MIT que supervisiona um programa de liderança em engenharia.

"No geral, a pessoa média provavelmente teria dificuldade com isso", disse.

Selker disse que um design melhor teria sido tornar a mudança do mecanismo de busca mais "evidente", como um prompt pedindo aos usuários para escolher um serviço ao abrir o navegador.

"Tem que te deixar ciente de que a opção exista até que você a tenha dispensado", disse.

No Android

No celular Android, o Google disse que é necessário pressionar a barra de pesquisa para que o botão Remover apareça. Os usuários podem então tocar nele para remover o widget da barra de pesquisa do Google da tela inicial.

Este exemplo é especialmente falho. Primeiro, as etapas do Google para remover o widget da barra de pesquisa funcionam em alguns telefones Samsung, mas não funcionam em todos os dispositivos Android. Nos telefones Pixel do Google, por exemplo, quando um usuário pressiona longamente a barra de pesquisa, nenhuma opção de Remover aparece.

O mais importante é que remover o widget de pesquisa exclui um atalho para a barra de pesquisa do Google na tela inicial, mas não altera o mecanismo de pesquisa em um navegador.

Mudar para um buscador diferente requer um conjunto diferente de etapas. Semelhante ao caminho nos iPhones, é um processo de quatro etapas que envolve abrir o navegador e alterar suas configurações.

Opção Padrão

A lição geral do julgamento antitruste do governo contra o Google é que, quando as empresas fazem acordos para se tornarem a opção padrão, elas estão cientes de que você provavelmente ficará com o status quo porque mudar para uma alternativa requer consciência e esforço, disse Brignull, autor de "Deceptive Patterns: Exposing the Tricks Tech Companies Use to Control You" [Padrões enganosos: expondo os truques que as empresas de tecnologia usam para controlar você].

O Google afirmou em comunicado que é fácil para as pessoas alterarem seu mecanismo de pesquisa padrão em dispositivos Android e no Safari da Apple. A empresa acrescentou que nos computadores com Windows, que exigem um longo processo para retirar o Bing como buscador padrão no navegador Edge da Microsoft, a grande maioria das pessoas escolhe o Google.

Com tudo isso em mente, e as instruções agora diante de você, será possível experimentar outros mecanismos de pesquisa. Se você descobrir que prefere o Google de qualquer maneira, pelo menos será sua decisão —não do Google.

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