Um professor pede aos alunos que escrevam um ensaio sobre a literatura do século 18. Seus alunos, antenados e preguiçosos, decidem terceirizar a tarefa: recorrem à inteligência artificial, um chatbot, que entrega um ensaio capaz de convencer o professor humano.
Com a emergência de uma nova tecnologia, isso pode se tornar uma realidade.
O ChatGPT, novo software de inteligência artificial que simula conversas humanas, tem causado burburinho no Vale do Silício. A tecnologia é capaz de entender a linguagem humana natural e gerar respostas extremamente refinadas, semelhantes ao intelecto humano após receber um pedido.
A TV Folha entrevistou nesta quinta-feira (26) o neurocientista Álvaro Machado Dias, colunista da Folha, sobre a influência dos algoritmos no cotidiano.
Ele conversou com o repórter da Ilustríssima Eduardo Sombini, apresentador do podcast Ilustríssima Conversa.
A novidade do ChatGPT trouxe consigo temores sobre possíveis cenários de extinção de uma série de profissões. Trouxe também preocupações sobre implicações na educação, como estudantes trapaceando em redações e provas.
Para Machado Dias, a tecnologia pode de fato trazer consequências negativas, mas o saldo é positivo. Profissões burocráticas e modelos de ensino baseado em "decoreba" podem estar com os dias contados.
Do lado negativo, o neurocientista diz que acredita num cenário de enfraquecimento da potência decisória humana.
Porém, ele explica, o ChatGPT dialoga com algo muito maior que já vem acontecendo há algum tempo, que é a "algoritmização do pensamento humano".
"O atual modelo de lição de casa, o modelo de texto feito para rede social, o modelo da redação burocrática. Tudo isso já é feito de uma maneira meio algoritmizada pelas pessoas", diz Machado Dias. "A gente tem um modelo de educação muito cristalizado e de produção de ciência muito burocrática."
"Eu acho que o aprendizado baseado em 'decoreba' e produção burocrática de conteúdo tem que cair mesmo", diz. "Cada vez mais aprender estratégias não só de construção coletiva, de inovação, de invenção, mas efetivamente de uso do cérebro é o caminho da educação."
Quando surgiu o computador, lembra o cientista, era comum ouvir a lamúria: "Nossa, e agora? Ninguém mais vai pensar".
"A gente desenvolveu maneiras de pensar que usam a computação para fazer coisas muito mais interessantes. Muitas áreas foram destruídas, não só a datilografia, como áreas práticas. Agora está acontecendo a mesma coisa", diz Machado Dias. "Mas por outro lado tem esse aspecto em que a gente pode questionar uma série de práticas que são engessadas e pouco produtivas."
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