Celular já é principal meio de conexão para 85% dos jovens, aponta pesquisa
Em sua segunda edição, a pesquisa Juventude Conectada revela que 21% dos jovens já empreenderam no meio digital, e 49% deles afirmam que querem abrir um negócio com o uso da internet em até cinco anos.
Estes são alguns dos dados da pesquisa realizada pela Fundação Telefônica Vivo, que ouviu 1.440 jovens de 15 a 29 anos, das classes A, B, C e D, de todas as regiões do Brasil.
O dado mais significativo do levantamento é que o celular se tornou a principal fonte de conexão à internet para a juventude brasileira, de todas as classes sociais, como destaca Americo Mattar, diretor-presidente da fundação.
Em entrevista à Folha, ele destaca o papel da tecnologia na educação, um dos pilares de atuação da instituição, em programas como Escolas Conectadas e Escola Digital, promovendo curadoria de conteúdo e customização de plataformas que contam hoje com 17 mil professores cadastrados em todo o país.
No entanto, apesar de a tecnologia está incorporada em todos os aspectos da vida do jovem, o uso em sala de aula para aprendizagem ainda deixa muito a desejar, segundo a pesquisa, que revela ainda que 42% dos estudantes se dizem mais mais motivados a estudar com o uso da internet.
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Folha - Qual é o dado mais surpreendente da pesquisa?
Americo Mattar -Temos alguns dados bastante interessantes, como a vontade de empreender e o desejo de abrir o próprio negócio com o uso da internet. Mas o mais surpreendente é que o jovem está usando basicamente o celular para se conectar e transformou o aparelho no principal meio de utilização para conexão à internet, em detrimentos de outros.
O computador de mesa está praticamente obsoleto, sumido. Imaginávamos que isso fosse acontecer ao longo do tempo, mas ocorreu numa velocidade muito rápida. Saímos de 49% no estudo de 2014 para 85%, em 2016, em apenas dois anos.
O próprio notebook e surpreendentemente até o tablet também caíram na pesquisa. Não dão portabilidade. Nosso diagnóstico mostra que o jovem quer portabilidade, mobilidade, facilidade de acesso, e tudo isso ele tem no celular, que virou o principal meio, no que se refere ao comportamento de conexão.
É uma revolução?
Sim. E muito rápida. Havia uma pergunta na pesquisa anterior relacionada ao tempo de conexão. O jovem dizia que passava oito horas, mais ou menos, conectado por dia.
Agora, a pergunta gerou estranhamento. O jovem não entendia: 'Como assim? Eu tô conectado full time, meu amigo'. Ele não desconecta mais. Tira o celular do bolso e mostra que está no Facebook, no Twitter, no WhatsApp e mais quatro redes sociais.
Isso é o efeito da disponibilidade de conexão. Ele tem hot spots de internet, restaurantes e praças públicas com wi-fi gratuito. A popularização do smartphone permitiu tamanha conexão, essa mobilidade. Tudo isso corroborou.
Que jovem é esse pesquisado?
Não tem uma classe social definida. Temos todas as classes e todas as regiões do Brasil. São mais de 1.400 jovens. A estratificação é quanto ao perfil de utilização da internet.
O jovem de utilização avançada representa 16% da base da pesquisa, enquanto 33% é de utilizador com conhecimento moderado e 51% de utilização básica.
A utilização é considerada avançada quando jovem publica e constrói conteúdos on-line. Moderada é aquele que consome conteúdos, também publica suas opiniões, mas não gera nada novo na internet. Já está um grau além daquele que só observa ou faz pesquisa de conteúdo, mas é um utilizador praticamente passivo.
Além de ferramenta de socialização, a internet é vista como instrumento de educação?
Este é um bom ponto. Eu ia citar justamente o exemplo de educação. Estamos vivendo um momento muito interessante, que permite que o jovem aprenda por si só.
Estamos em um momento que até contradiz a nossa Constituição, que obriga a criança a estar em sala de aula. A tecnologia está permitindo uma universalização de conhecimento, de poder levá-lo a todos os lugares.
Um segundo aspecto importante é que a tecnologia exige uma reinvenção do papel do professor, o ator mais relevante na educação e que tem pouca visibilidade, por incrível que possa parecer. Nós queremos dar visibilidade ao trabalho do professor.
Como um professor analógico vai se comunicar com um aluno digital?
Nem todos os professores estão familiarizados com a tecnologia, que não está aqui para substitui-lo. A tecnologia não é um fim em si próprio, mas um caminho para para aquele que quer incrementar a sua aula. O professor não precisa saber mais do o aluno em termos de tecnologia.
Vou dar um exemplo simples. É o caso do professor que, ao invés de tirar o celular do jovem de dentro da sala de aula, coloca o uso do aparelho dentro do seu plano de aula. Vai falar de um conceito de geografia ou a história brasileira e pede que a classe pesquise em grupos e faça uma interpretação do que leram na internet. Isso dá uma agilidade instantânea.
Eu diria que o professor hoje está indo por um caminho de facilitador da educação e não mais o polo de atenção na sala. A educação está migrando o poder de concentração para o aluno, mas o professor ainda tem um papel muito relevante, de ser o mediador da qualidade desse conhecimento.
Seria um papel mais de curador dos conteúdos?
Exatamente. Curar os melhores conteúdos, além de desenvolver o senso critico dos seus alunos. É o caso das informações no Wikipedia, que qualquer um edita, portanto não é fidedigna, de qualidade.
Como criar ambiente propício para essa nova forma de educar em sala de aula?
Há um plano de governo de conectar todas as escolas, através de pacote governamental. O que faz falta ao professor são conteúdos e auxílio para que ele encontre esses conteúdos de qualidade.
Pensando nisso, a fundação criou uma plataforma chamada Escola Digital, onde curou mais de 15 mil conteúdos de qualidade, vindos de universidades, pesquisadores. Todos eles criados com Creative Commons [permitindo o uso dos materiais sem ferir as leis de proteção à propriedade intelectual].
Você tem ali desde videoaula, até planos e roteiros de aulas que o professor pode usar. É um conteúdo livre e sistematizado por disciplina, tipo de cadeira, nível de profundidade, por séries.
O professor pode acessar essa plataforma gratuitamente, em 17 Estados brasileiros, que aderiram o projeto via Secretarias de Educação.
Nós customizamos a plataforma à necessidade deles. E ainda se congrega na mesma plataforma o aluno, os pais e os professores. Professor pode mandar mensagem para os pais e vice-versa. O professor manda roteiro para o aluno copiando os pais.
Então, a gente criou uma integração, que é ciclo saudável da educação, com os pais participando dentro da sala de aula.
Que impacto tem essa plataforma?
Testamos essa metodologia em cinco escolas, aqui em São Paulo, Recife [PE] e Rio Grande do Sul. Essas escolas estão recebendo um banho de loja em termos de tecnologia, em uma parceira que temos com a Unesco [Organização das Nações Unidas para a educação, a ciência e a cultura], para medir o impacto da tecnologia na sala de aula.
Já percebemos que o aluno está mais interessado nas aulas. No município de Viamão [RS], o poder público gostou tanto da ideia que está massificando para outras dez escolas.
Há crianças do meio rural que no primeiro dia de aula já pegam uma placa e fazem um robô. O que mostra que o fato de estar numa ou noutra região não faz a criança ter menos capacidade. Ela tem que ser estimulada e ter oportunidade para se desenvolver.
Em princípio, estamos vendo muito bons resultados. Mas, de novo, volta o papel central dos professores, que compraram a ideia, assim como as escolas, os diretores e a secretaria de educação, que permitiram que avançássemos com esse piloto para validar o modelo.
Achamos que, ao final de três anos, será um período razoável para avaliar essas crianças e ver qual foi o desempenho delas comparado com outras escolas que não receberam essa tecnologia.
A fundação está especificamente focada em educação e empreendedorismo?
Sim. Na inovação educativa porque temos dentro disso o empreendedorismo e a cidadania digital. Colocamos tudo isso dentro do guarda-chuva de inovação educativa porque é a educação em seus vários matizes. A educação é empreendedora.
Para cidadania digital, queremos que o jovem assuma um papel protagonista na vida dele. Hoje, quando a gente faz um evento, não temos a fantasia que vão sair 200 Bill Gates, 200 Steve Jobs daqui. Não é isso.
Queremos que saiam 200 jovens com projetos de vida, que ele receba uma educação com as competências empreendedoras, para que ele possa não só ocupar seu papel na sociedade como cidadão com senso crítico e propositivo, assim como possa ocupar um lugar em uma empresa ou em um negócio que queira abrir.
A nossa provocação para o jovem é que ele ocupe o seu papel na sociedade.
Vocês já têm exemplos práticos do impacto do potencial desse jovem conectado e empreendedor?
Em Santarém [PA], eles criaram um aplicativo para informar o horário das barcas. Inscreveram o projeto e começamos a estimular esses jovens a pensar outras soluções. O projeto evoluiu para a compra do bilhete da barca, e os meninos encontraram uma oportunidade de classificados dentro do aplicativo. Tudo com tecnologia mobile.
É um exemplo de projeto que está crescendo e transformando a realidade daquela comunidade. Queremos que o jovem pense nos problemas sociais que ele enfrenta e como a tecnologia pode resolver aquilo.
Não sou eu aqui do meu gabinete dizendo: 'Olha, tá aqui a minha solução'. Mas perguntar: 'Cara, como posso te ajudar para desenvolver uma solução para resolver o teu problema?'.
Então, damos formação em design thinking, gestão de projetos, gestão financeira, para que eles pensem nessas soluções dentro desse arcabouço.
Como fazer com que essas ações ganhem mais escala e virem política pública?
Estamos entre as dez maiores fundações empresariais do país, arrisco a dizer que estamos entre as cinco. A Vivo tem um compromisso desde o Grupo Telefônica.
Ao longo desses 15 anos, nunca reduziu o orçamento da fundação, que vem aumentando ano contra ano. A grande provocação do negócio Vivo para a fundação é como usar a tecnologia para mudar a sociedade, o entorno.
Então, hoje o negócio é o nosso estímulo porque a conexão permite essa universalização, esse nivelamento de conhecimento. Através dessa conexão vamos criando nossos projetos.
Nossa intenção é oferecê-los ao poder público, para que possam ganhar escala e virar política pública. Esse não é só o desejo da Fundação Telefônica Vivo, mas acho que de todas as fundações empresariais do país. Corremos na direção de somar esforços para mudar a política pública.
Onde vocês estão mais próximos disso?
A Escola Digital é um processo muito próximo de uma virada. Estamos pronto, com parcerias em 17 Estados, em um total de 23 acordos com as secretarias municipais e estaduais. Esperamos chegar aos 27 Estados em 2017.
Esse é o nosso desafio. Por que o Estado vai investir criando uma plataforma se eu tenho uma de graça e pronta? E que ele ainda pode customizar? Para dar escala a esse projeto precisamos, sim, do poder público.
Não queremos, de forma alguma, substituir o Estado, queremos somar força, entendendo os problemas para ajudar. Quando olhamos para os números do Ideb, não podemos nos conformar que 20% dos jovens não dominam a disciplina básica de matemática, que 30% não conseguem interpretar um texto.
Não dá para se conformar com isso.
Na Rede Folha, temos a Geekie, um case brasileiro de tecnologia sendo vendida para o exterior? Esse é um caminho?
A plataforma Geekie é um ganho tremendo para quem está se preparando para o Enem. É um motivo de orgulho nosso. Quando o Sassaki [Cláudio, cofundador] lançou a ideia, a fundação foi um dos primeiros apoiadores. Falamos: 'Cláudio, vamos colocar essa plataforma de pé com você'.
Fizemos uma parceria, conseguimos alavancar o projeto. Quando ele ganhou força e robustez, a fundação sai, porque realmente virou um negócio. Temos muito orgulho da Geekie. É esse tipo de coisa que queremos incentivar.
É o que chamamos de 'o poder nivelador da tecnologia'. A tecnologia está oferecendo para um aluno em Macapá [AP] o que um estudante de uma escola de ponta em São Paulo tem disponível.
É o caso de uma menina do Nordeste que salta de 200 e alguma coisa na avaliação do Enem para 890 porque ela se dedicou àquilo. Isso é o empoderamento, dar ao jovem o poder transformar sua realidade através da tecnologia.