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02/08/2012 - 13h25

Phelps bate recorde de medalhas, mas não é consenso

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CHRISTOPHER CLAREY
DO 'NEW YORK TIMES', EM LONDRES

Michael Phelps continuará a nadar no Centro Aquático da Olimpíada de Londres esta semana, mas em certo sentido a disputa já acabou.

Ele já conquistou mais medalhas do que qualquer outro atleta olímpico, nos Jogos de verão e inverno (e também na primavera ou outono).

Mas se você acredita que isso faz de Phelps, por aclamação, o maior atleta olímpico da história, a questão não é tão simples.

"É claro e evidente, tendo em vista seu total de medalhas, que ele é o atleta de maior sucesso; minha opinião pessoal é a de que não estou certo de que ele seja o maior", disse Sebastian Coe, presidente do comitê organizador dos Jogos de Londres, na quarta-feira.

Coe, que conquistou duas medalhas de ouro olímpicas, estava falando em uma entrevista coletiva no dia seguinte à conquista da 19ª medalha de Phelps -e seu 15º ouro -, como parte da equipe norte-americana que venceu o revezamento quatro por 200 metros no nado livre.

Com suas 19 medalhas, Phelps tem uma a mais que Larisa Latinina, a ginasta da antiga União Soviética que obteve 18 medalhas entre 1956 e 1964.

Mas a contagem de medalhas olímpicas não é igual para todos. Se você for o maior arremessador de dardo do planeta, não tem a chance de conquistar medalhas por arremessar o dardo com a mão esquerda, a direita, por sobre ou por sob a cabeça. Tem apenas uma chance, apenas uma prova olímpica, a cada quatro anos.

Na natação, se você for versátil e voraz como Phelps, pode disputar oito provas, como ele fez em Atenas, em 2004, e Pequim, em 2008, ou sete, como ele planeja fazer em Londres.

Fabrice Coffrini/France Presse
Michael Phelps após receber a medalha de ouro pelo revezamento 4 x 200 livre. Foi a sua 19ª medalha de ouro em Jogos Olímpicos
Michael Phelps com o ouro do revezamento 4 x 200 livre

"Não temos arremesso de peso de seis quilos, sete quilos e oito quilos", diz David Wallechinsky, o norte-americano que preside a Sociedade Internacional de Historiadores Olímpicos. "É preciso levar em conta, simplesmente, que ginastas e nadadores têm mais facilidade para conquistar múltiplas medalhas porque seus esportes permitem que concorram em múltiplos eventos. Se você for olhar as 12 pessoas que mais conquistaram medalhas na história das Olimpíadas, descobrirá que nove delas são nadadores ou ginastas". E é evidente que nove entre os 12 maiores atletas olímpicos de todos os tempos não foram nadadores ou ginastas.

Três das provas disputadas por Phelps em cada uma de suas olímpicas também terão sido eventos de revezamento, outra opção que não está disponível para a maioria dos atletas
olímpicos.

Esse desequilíbrio estatístico pode distorcer facilmente o debate, e há outras considerações, tais como longevidade e universalidade.

"Com 15 medalhas de ouro, ele já merece ser incluído entre os melhores atletas olímpicos de todos os tempos", escreveu Steve Redgrave, o ícone olímpico britânico, em artigo para o jornal britânico "Daily Telegraph", esta semana. "Mas ainda acredito que seu feito teria sido mais impressionante caso ele o realizasse ao longo de seis ou sete olimpíadas". Esta é a quarta e provavelmente última olimpíada de Phelps, de acordo com a maioria das indicações, mesmo as dele. A primeira que ele disputou foi a de 2000, aos 15 anos, e saiu sem medalhas, mas desde então vem fazendo do pódio seu segundo lar.

Redgrave conquistou medalhas de ouro para o Reino Unido no remo em cinco Olimpíadas consecutivas, de 1984 a 2000, obtendo a última em Sydney, depois de pedir aos torcedores para atirar nele caso voltasse a chegar perto de um barco, quatro anos antes.

Redgrave, ao contrário de Phelps, não tinha como disputar múltiplas provas. Concentrou-se em apenas uma na maioria de suas participações, e participou de uma segunda prova apenas em 1988.

Outros atletas especializados que perduraram nos jogos foram Al Oerter, norte-americano que venceu a prova olímpica de arremesso de disco em quatro jogos consecutivos, de 1956 a 1968, e Birgit Fischer, da Alemanha, que conquistou oito medalhas de ouro no caiaque em seis olimpíadas disputadas, a última das quais aos 42 anos, em Atenas.

Coe, que expressou sua opinião na quarta-feira, declarou que o debate para decidir quem foi o maior atleta olímpico é "uma ótima brincadeira de bar".

"Eu poderia oferecer diversos nomes", afirma. "Poderia falar de Steve Redgrave. No contexto britânico, poderia mencionar Daley Thompson". Ele acrescentou: "Se recuarmos algumas gerações, acho que aquilo que Jesse Owens fez em 1936 foi inacreditável".

Thompson, astro do esporte britânico conhecido pela franqueza, conquistou ouro no decatlo em 1980 e 1984. Owens, o astro do atletismo norte-americano, conquistou quatro medalhas de ouro em sua única olimpíada, a de Berlim, em 1936. Coe também mencionou Nadia Comaneci, a ginasta romena de rosto inescrutável que definiu o ideal de perfeição da ginástica feminina em Montreal, 1976, e conquistou cinco medalhas de ouro em duas olimpíadas.

Wallechinsky, autor de "The Complete Book of Olympics", estudou mais estatísticas e histórias olímpicas do que provavelmente qualquer outro interessado, e inclui Phelps no grupo dos cinco maiores atletas olímpicos de todos os tempos, em companhia de Fischer, Paavo Nurni, Emil Zatopek e Carl Lewis.

"Não creio que Phelps seja o maior, mas o incluo certamente entre os cinco maiores", disse Wallechinsky. "Outro fato que gosto de levar em conta é a universalidade de um esporte. Especificamente, se você conversar com as pessoas na rua vai descobrir que quase todo mundo um dia já disputou uma prova de corrida de 100 metros, e quase ninguém nadou 200 metros em estilo borboleta".

Fischer, no caiaque, certamente pode ser contestada no quesito universalidade. Mas Nurmi e Zatopek eram fundistas. Nurmi venceu 12 medalhas em 12 provas disputadas, de 1920 a 1928, nove das quais de ouro. O tcheco Zatopek, cujo estilo fazia as provas de fundo parecer difíceis (o que são) e não fáceis, venceu os cinco mil e 10 mil metros e a maratona em uma mesma olimpíada, em 1952, feito que certamente não será igualado.

E há Lewis, o homem mais frequentemente mencionado em companhia de Phelps. Ele conquistou cinco medalhas de ouro nas provas de velocidade e quatro ouros consecutivos no salto em distância, entre 1984 e 1996.

Lewis também tinha mais carisma (e uma língua mais afiada) que Phelps, mas esse é provavelmente um debate diferente, como a alegação de Latinina de que admira Phelps mas acredita que continua a merecer o posto de maior atleta olímpica de todos os tempos porque ajudou a União Soviética a conquistar medalhas também como treinadora.

Mas um observador objetivo não teria como duvidar que Phelps merece constar em qualquer short list dos maiores atletas olímpicos - mesmo que não em primeiro lugar. A seu crédito, além do número de medalhas, está o fato de que, ao contrário de alguns dos grandes que o precederam, como Lewis e Comaneci, nenhuma das olimpíadas que ele disputou foi diluída por boicotes.

Toby Melville/Reuters
O sul-africano Chad le Clos comemora
O sul-africano Chad le Clos comemora

Ele também sempre recusou seguir o caminho mais fácil. O que conseguiu em Pequim já bastaria para defini-lo como fenômeno: conquistar oito medalhas de ouro em oito provas disputadas, uma das quais vencida apenas na última braçada, quando derrotou Milorad Cavic por apenas um centésimo de segundo nos 100 metros borboleta.

O fato de que Phelps tenha conquistado sete recordes mundiais nessas oito provas de 2008 soa mais impressionante do que pareceria sob a lente da História, porque aconteceu depois que trajes que melhoram o desempenho do nadador começaram a ser usados.

Em Londres, até o momento, há uma sensação de revanche aquática, já que Phelps foi derrotado na última braçada nos 200 metros borboleta, pelo sul-africano Chad Le Clos, e os norte-americanos perderam a liderança para os franceses no revezamento quatro por 100 no final da prova, depois de uma vitória de virada em 2008. Mas Phelps, mesmo com seus poderes reduzidos e à beira da aposentadoria, já conquistou três medalhas em Londres, e é provável que saia de Londres com seis, o que elevará o total de sua carreira a 22.

Será difícil para qualquer atleta olímpico atingir marca semelhante no futuro, e ainda mais difícil se ele não for nadador ou ginasta.

Tradução de Paulo Migliacci

 

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