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06/06/2004 - 05h05

Condenação por homicídio leva quase 4 anos

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MARIO CESAR CARVALHO
da Folha de S.Paulo

O desempregado G.S., 23, não quer nem ouvir em falar de atraso da Justiça. "Roubaram três anos da minha vida, mas esquece que eu existo", diz. O pesadelo de G.S. começou no dia 9 de janeiro de 2001, quando a polícia o incluiu num grupo que se reunira para resgatar presos num distrito em São Paulo. Foi acusado de seis tentativas de homicídio, formação de quadrilha, resistência e porte ilegal de arma.

Testemunhas diziam que ele só passara em frente da casa, a polícia confirmava que ele não tinha antecedentes criminais, mas os pedidos de liberdade para G.S. foram recusados pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, pelo STJ (Superior Tribunal de Justiça) e pelo STF (Supremo Tribunal Federal).

No dia 13 de janeiro deste ano, não houve nem julgamento de G.S. --o promotor que deveria acusá-lo desistiu do caso porque não havia nenhuma prova. Foi libertado depois de passar 3 anos e quatro dias na prisão (ou 1.099 dias). Em menos tempo (717 dias), a esquadra de Fernão de Magalhães fez a primeira viagem de circunavegação na Terra.

O caso de G.S. é quase uma caricatura da lentidão da Justiça, mas o prazo em que ele foi julgado é rápido para os padrões de São Paulo. No Estado, são gastos, em média, 1.431 dias (3 anos, 11 meses e 6 dias) para mandar o autor de um homicídio para a prisão, quando se contabiliza o tempo entre o inquérito policial e o início do cumprimento da pena.

O prazo é a principal revelação de um levantamento do Seade (Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados) sobre o funcionamento da Justiça criminal entre 1991 e 1998. É a primeira pesquisa brasileira que reúne dados da polícia, do Ministério Público, do Judiciário e do sistema prisional. Para chegar aos dias gastos, foram computados 7.255.314 processos, armazenados na Prodesp (companhia estadual de processamento de dados). A pesquisa consumiu dois anos e meio de trabalho.

"Nossa idéia é dar transparência a todas as fases do processo criminal. Só assim, as pessoas poderão julgar se os prazos são razoáveis", diz o sociólogo Renato Lima, que conduziu o levantamento junto com a estatística Eliana Bordini.

Comparados aos prazos dos EUA, os 1.431 dias parecem nada razoáveis. Um levantamento feito há quatro anos em nove Estados concluiu que Oakland, na Califórnia, tinha a corte mais vagarosa. Ela gastava 282 dias, em média, para julgar os crimes mais violentos, como homicídio e estupro.

É claro que não dá para comparar o sistema judicial dos EUA com o brasileiro. Mas o fato de Oakland julgar um homicídio em 1/5 do tempo gasto em São Paulo sugere que há algo errado no sistema judicial brasileiro.

Sergio Renault, secretário da Reforma do Judiciário do Ministério da Justiça, diz que vai propor mudanças para agilizar o funcionamento da Justiça criminal. Os principais problemas, segundo ele, estão no Código de Processo Penal, que regula inquéritos e processos, e no gerenciamento: "A gestão da Justiça é muito obsoleta. Os prazos dos processos não são razoáveis".

Para Renault, o ideal seria o Brasil adotar parâmetros como os existentes em outros países. Nos EUA, por exemplo, a Associação dos Tribunais Americanos determinou que o julgamento de um homicídio não pode ultrapassar 12 meses. Lá, a reengenharia que varreu o mundo corporativo na década passada chegou à Justiça.

Em São Paulo, um réu solto que entrasse até abril último com recurso no Tribunal de Justiça teria de esperar quatro anos para saber o resultado do julgamento.

O Tribunal de Justiça acumula 199.278 processos que aguardam distribuição --ou seja, o envio para a câmara que irá julgá-los. A área criminal é a que tem menos processos à espera de distribuição, segundo a assessoria de imprensa do órgão: são 25.598.

Em abril, o TJ decidiu criar 16 câmaras extraordinárias para diminuir a fila de processos. Elas funcionarão nos próximos oito meses, descontando julho, quando o tribunal está de férias. Até abril, havia seis câmaras ordinárias e três extraordinárias.

As câmaras já reduziram de quatro para três anos o tempo de espera de um recurso de réu solto. Para réu preso, o tempo de espera da sentença será de três a quatro meses, segundo o TJ.

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