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10/05/2008 - 23h13

Ditadores de Mianmar realizam referendo em meio a crise humanitária

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da Folha Online

A junta militar que comanda Mianmar realizou eleições que visam consolidar seu poder, enquanto transforma a ajuda humanitária internacional para as vítimas do ciclone Nargis em propaganda de campanha. Em alguns casos, os nomes dos generais no poder foram escritos nas caixas com suprimentos enviados por outros países.

Organizações de direitos humanos e grupos dissidentes têm feito duras acusações de que a junta é negligente com as vítimas do desastre ao levar adiante o referendo deste sábado, que visa a aprovação pública de uma nova Constituição classificada por críticos como uma farsa.

EFE
Soldados birmaneses descarregam caixas com ajuda humanitária enviada pela China, no aeroporto de Yangun neste sábado
Soldados birmaneses descarregam caixas com ajuda humanitária enviada pela China, no aeroporto de Yangun neste sábado

Aye Aye Mar, 36, ficou assustada ao ser questionada pela agência Associated Press se alguém votaria contra. "Um voto 'não' não fará diferença", afirmou sussurrando e olhando ao redor. "Eu digo 'sim' à Constituição", disse, levantando a voz.

O referendo é realizado uma semana após ventos de até 120 km/h e uma onda de mais de 3,5 metros devastarem as terras baixas do delta do Irrawaddy, matando mais de 23 mil pessoas e deixando outras 42 mil desaparecidas. Outros dois milhões estão desabrigados ou sem comida e remédios.

Apesar de a ajuda internacional ter começado a chegar --com mais dois aviões do Programa Mundial de Alimentação da ONU (WFP, na sigla em inglês) pousando em Yangun neste sábado--, quase todos os trabalhadores humanitários estrangeiros foram barrados de entrar no país.

Ajuda

A junta diz que quer administrar sozinha a distribuição dos suprimentos doados.

Porém, com estradas destruídas e pontes submersas, é quase impossível chegar às áreas mais atingidas. Os militares têm apenas algumas dezenas de helicópteros, a maioria velha e pequena. O país tem também 15 aviões de transporte, sendo que apenas alguns conseguem carregar grandes quantidades de carga.

EFE
Sobreviventes da tempestade observam suas casas em Bogalay, um dos locais mais atingidos pelo ciclone Nargis em Mianmar
Sobreviventes da tempestade observam suas casas em Bogalay, um dos locais mais atingidos pelo ciclone Nargis em Mianmar

Longas filas se formaram na frente de prédios do governo, onde porções minúsculas de arroz eram distribuídas. Pelo país, as pessoas se reúnem à beira de estradas esperando por ajuda. As palavras "Ajudem-nos" foram escritas com giz na frente de uma casa.

Ko Zaw Min, 27, disse que a ajuda que chega à sua comunidade não é o suficiente. Cada família recebe cerca de meio quilo de comida por dia.

"Quero construir minha casa onde ela ficava, naquele campo", disse o agricultor, que perdeu seu filho de nove anos e um bebê de um mês no desastre. "Mas não tenho nada".

Propaganda enganosa

Apesar dos apelos estrangeiros para que o referendo fosse adiado, a votação foi realizada neste sábado em quase todo o país, exceto nas partes mais devastadas.

Conforme as filas iam se formando, a TV estatal ficava repetindo imagens de seus generais, incluindo o líder da junta militar, o general Than Shwe, entregando caixas de suprimentos para sobreviventes do ciclone, em elaboradas cerimônias.

Em uma das caixas, o nome do general Myint Swe, nome proeminente da hierarquia governamental, aparecia em destaque, cobrindo um rótulo menor que dizia "ajuda do governo da Tailândia".

"Nós já vimos comandantes regionais colocando seus nomes em caixas com ajuda vinda da Ásia, dizendo que era um presente deles e que eles estavam distribuindo na região", disse Mark Farmaner, diretor da Campanha Burma UK, em prol dos direitos humanos e da democracia em Mianmar.

Há 18 anos que o país não realiza nenhuma eleição, e muitas pessoas não tinham idéia do que fazer. "Aonde vou", ou "o que faço", perguntavam os birmaneses uns aos outros ou aos militares, ao entrarem nas cabines de votação.

"Caminho da democracia"

O referendo procura a aprovação popular de uma nova Constituição, que, segundo os generais, será seguida por uma eleição geral em 2010. Ambas as votações são elementos do que a junta chama de "o caminho da democracia".

Mas a Constituição proposta garante 25% do Parlamento aos militares e permite ao presidente entregar todo o poder ao Exército em caso de emergência.

O novo documento também impede que Aung San Suu Kyi, a líder presa do movimento democrático e nobel da Paz, possa ter cargos públicos. Os militares se recusaram a aceitar o resultado da eleição geral de 1990, vencido pela Liga Nacional pela Democracia, da opositora encarcerada.

Cerca de 27 milhões dos 57 milhões de birmaneses podem votar, apesar de o referendo ter sido adiado por duas semanas nas áreas mais atingidas pelo ciclone.

O ciclone Nargis causou enchentes que deixaram vilas inteiras submersas. Organizações humanitárias internacionais afirmam que o número de mortos pode chegar aos 100 mil. A previsão de fortes chuvas próxima semana deve agravar o quadro.

Com Associated Press

 

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