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16/06/2003 - 05h33

Michoacán expressa alma do México

ISRAEL DO VALE
Enviado especial da Folha de S.Paulo ao México

Sete e pouco da manhã, congestionamento. A sensação inicial de quem segue de São Paulo para a Cidade do México é a de que o avião passou nove horas dando voltas no ar e pousou no mesmo lugar. Mas a baldeação é inevitável para quem pretende chegar de carro à "alma mexicana", como vem sendo chamado o Estado de Michoacán, no sudoeste do país.

Israel do Vale/Folha Imagem
As portas e as janelas do casario colonial escancaram o passado do Estado de Michoacán, marcado por lutas pela independência


Não é preciso mais do que dez minutos pelas avenidas, a partir do aeroporto internacional, para o clima de intimidade com os "hermanos" se estreitar ainda mais: lavadores de pára-brisas num farol, garotos com malabares noutro, vendedores ambulantes nos principais cruzamentos. Ok, há sempre a possibilidade de refúgio no rádio: "Beso en la boca/ es cosa del passado/ la ola ahora/ es namorar pelado". Por "diós"!

Primeira impressão

Vencido o batismo de fogo, o conforto real é que essa primeira impressão, além de parcial e limitada, não é a que fica. Segunda cidade mais populosa do planeta, a capital mexicana guarda todos os vícios e vicissitudes do Terceiro Mundo. (Não à toa um paulistano se sente em casa.)

Mas, se o caos do trânsito da metrópole é desalentador, as rotas de fuga para o interior são seu avesso: bem-cuidadas, sinalizadas, livres do tráfego intenso --enfim, bastante convidativas, com belos vales e planícies. (Ah! Cheias de pedágios também, é preciso que se diga.)

Localizada na porção sul do longilíneo território mexicano, a capital do país (ou DF, como eles preferem chamar) se oferece como contraponto ao perfil rural que domina a maior parte das 31 unidades da federação.

México real

Assim como certo país continental mais ao sul, o México são vários. É Cancún (e seus sombreros de butique), sim, como muito turista imagina, mas é também a insurgente Chiapas ou a reivindicadora Michoacán, palco dos movimentos de independência do país. E a face indígena mexicana tem muita história para contar.

É a isso que os departamentos oficiais de turismo local tratam por México real --o que não é outra coisa senão um esforço para ampliar a circulação da "plata" gringa para além de Cancún.

País latino com a maior população de origem indígena, o México intensifica a valorização do perfil étnico de seus habitantes (e a cultura gerada aí) como um atrativo turístico a mais -para além da herança arqueológica, por si só de extremo valor.

A bola da vez é justamente Michoacán. Responsável por três de cada quatro abacates produzidos no país do guacamole, o Estado agora quer colher os frutos do investimento na conservação do patrimônio arqueológico e arquitetônico, do potencial ecológico, do artesanato e da gastronomia.

O fio da meada, que costura tudo, é a trajetória marcante do país, alicerçada no ranger de dentes do histórico de lutas --seja contra a invasão estrangeira (desde o século 16), pela nacionalização do petróleo (em 1938) ou pelos direitos políticos e sociais (cujo ponto recente mais marcante é o controle de Chiapas pelo Exército Zapatista de Libertação Nacional, de origem indígena, que faz dez anos em 2004).

A capital michoacana, Morelia, escancara portas e janelas do passado para o estrangeiro. A três horas da Cidade do México e a outras três do litoral, é um oásis no preservacionismo da arquitetura de valor histórico.

Patrimônio conservado

Classificada em 1991 como Patrimônio Cultural da Humanidade, pela Unesco, serve de modo gritante como exemplo do que a mineira Ouro Preto, sob ameaça de cassação de título equivalente, não soube fazer.

Morelia concentra o que realmente merece ser chamado de um conjunto arquitetônico harmônico. Seu centro histórico é algo inimaginável de tão ajeitado e uniforme. (E sem parecer um parque temático.) Resultado do esforço contínuo das diferentes esferas do governo para recuperar os prédios, cuidar para que novas construções não destoassem das antigas, manter ruas e fachadas limpas e bem iluminadas.

Os edifícios do centro histórico são limitados a uma altura de três andares --seis andares, na cidade, é arranha-céu. Tudo para deixar à mostra, do maior número possível de ângulos, as duas torres de 67 metros da monumental catedral barroca construída ao longo de 84 anos, a partir de 1660.

Mas esta é só a parte visível. Por trás de tudo, há um empenho pela conscientização dos moradores e da rede de serviços, que se manifesta, por exemplo, por meio de campanhas de limpeza (bem-sucedidas) ou de um guia como o "Tesoros", com hotéis e restaurantes submetidos a rígidos critérios de julgamento -o questionário de avaliação para a admissão no clube dos seletos é aplicado por agentes/clientes incógnitos.

Partida

Morelia é ponto estratégico para circular pela região. Dista cerca de 45 minutos de um sítio arqueológico como Tzintzuntzan, uma hora de charmosos povoados com construções dos séculos 16 e 17 ou menos de duas horas de áreas de rafting, num cenário de bosques e montanhas, e de um parque nacional como o Eduardo Ruiz, no perímetro urbano de Uruapan.

Num passeio matinal, pode-se esticar até uma cidade como Santa Clara del Cobre, forjada em torno da manufatura de objetos variados feitos no metal que lhe empresta o sobrenome; com pouco mais de tempo, enveredar pelo intrigante cenário "de fim de mundo" da região tomada no século passado pela lava de um vulcão --que, caprichosamente, manteve intacto o altar de uma grande igreja, cuja torre se avista no horizonte, no meio do nada.

Michoacán é, afinal, uma privilegiada conexão com um passado de batalhas --com a natureza, com a especulação imobiliária ou com o conquistador espanhol.

Israel do Vale viajou a convite da AeroMexico e da Secretaria de Turismo de Michoacán


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