Filme revê papel da Democracia Corintiana
Documentário situa movimento de jogadores ao lado de campanha das Diretas e de boom musical dos anos 1980
Longa resgata ascensão da luta pela redemocratização em diferentes frentes nos anos finais da ditadura
O documentário "Democracia em Preto e Branco", em exibição nos cinemas de São Paulo, Brasília e Curitiba nestes sábado (18) e domingo (19), propõe uma relação curiosa.
No início da década de 1980, a sociedade brasileira estava em ebulição. O processo de abertura política permitiu o crescimento da pressão popular pelo fim do governo militar e, com a censura amortecida, a contestação passou a ser expressada em diferentes esferas --que o diretor Pedro Asbeg procura relacionar no filme.
Na música, por exemplo, as letras sarcásticas e politizadas de novas bandas de rock como Titãs, Ira!, Ultraje a Rigor e Plebe Rude deram voz à juventude.
Para Edgard Scandurra, guitarrista do Ira!, a crueza do rock nacional da época se inspirou muito no punk vindo da periferia. "Existia esse fator político de contestação e de muita crítica que veio no período da abertura. Toda essa música jovem que surgiu veio com esse poder crítico."
No futebol, tido por alguns como uma das expressões máximas da alienação brasileira, um grupo de jogadores criou um modelo diferente de gestão de um time, no qual os atletas participavam das decisões: a Democracia Corintiana.
Para o diretor, todas as manifestações têm como marca a liberdade de expressão e são um reflexo de seu tempo.
O documentarista assume que os assuntos já são difundidos, mas defende a iniciativa de colocá-los lado a lado. "Tentei mostrar não só que eles são contemporâneos, como se encontram", diz Asbeg.
Segundo Juca Kfouri, colunista da Folha, o filme é "uma obrigação documental em um país que não tem memória". Ele é um dos muitos entrevistados --estão lá também FHC, Lula, Sócrates (1954-2011) e diversos nomes ligados aos tópicos tratados.
O apresentador Marcelo Tas afirma que as tantas bandas que despontavam; a turma de Sócrates e Casagrande; e o repórter Ernesto Varela (personagem de Tas) utilizavam "armas como irreverência e ironia" para "cutucar o regime autoritário anterior".
Tanta excitação juvenil dá certo caráter romântico ao documentário, que encontra no ex-goleiro Emerson Leão a única voz dissonante. Leão foi um dos poucos na época que não se seduziram pelo movimento no Corinthians.
"Sabia que se não o entrevistasse seria questionado", diz Asbeg. Mas a presença do hoje treinador de futebol "serve para mostrar que os jogadores aceitavam inclusive um cara que discordava daqueles métodos".
"A Democracia Corintiana não foi perfeita", reconhece o apresentador Serginho Groisman. "Mas ver seu time vencendo e ainda entrar com faixas pedindo mudanças no regime político, eu nunca vou esquecer."