Foco
'Rainhas' refletem contrastes do Rio nos últimos 50 anos
Modelo da favela da Rocinha ocupa o cargo simbólico que, em 1965, esteve nas mãos de jovem da elite carioca
Do alto de uma cobertura que já pertenceu ao ex-jogador Romário, com vista para a praia da Barra da Tijuca (zona oeste do Rio), Rafaella Lemos, 22, contempla o horizonte e lembra de casa.
"Ela mora aqui no topo, com essa vista linda do mar, e eu também, lá no topo da Rocinha", diz a modelo, igualando-se à anfitriã, a designer Solange Medina, 66.
Rafaella é sucessora de Solange no papel de "rainha" do Rio, cargo simbólico criado em 1965, para as celebrações do quarto centenário, e renovado agora para os festejos dos 450 anos.
À rainha cabe participar dos eventos oficiais. Ela é o rosto do Rio nas celebrações, e a comparação entre os perfis de Rafaella e de Solange reflete uma mudança na forma como o Rio se vê.
Nascida e criada na favela da Rocinha, em São Conrado, zona sul do Rio, Rafaella se emociona ao falar de sua vitória. "Com a diferença de classes, há oportunidades maiores e menores. Minha oportunidade sempre foi menor, mas corri atrás e hoje eu sou a rainha do Rio", disse, chorando, durante conversa com a Folha na cobertura de Solange, na quinta (26).
Orgulhosa, a rainha do quarto centenário foi uma das juradas do concurso que elegeu a jovem."Na minha época não tinha ninguém de comunidade. Parece que faltava coragem. Nesse ano tivemos várias modelos."
Rafaella assinou um termo de compromisso anual com o governo --o cargo não é remunerado, mas ela ganhou um carro popular (de cerca de R$ 25 mil) como prêmio.