Para delegada, 'atropelo' da PM afetou prova de chacina
Presidente de associação diz que Corregedoria comprometeu investigação
Declaração expõe racha com força-tarefa criada pelo governo Alckmin para apurar mortes em série de 15 dias atrás
Principal porta-voz dos delegados da Polícia Civil paulista, Marilda Pansonato Pinheiro, 60, expõe o racha na investigação da chacina que deixou 19 mortos na Grande São Paulo e afirma que as provas do crime foram comprometidas após um "atropelo" da Polícia Militar.
Reportagem da Folha nesta semana mostrou o mal-estar gerado pelas ações da Corregedoria da PM ao agir à revelia da força-tarefa criada pelo governo Geraldo Alckmin (PSDB) para investigar os assassinatos em série.
As mortes, nas cidades de Osasco e Barueri, ocorreram no último dia 13 num intervalo de menos de três horas.
O estopim para o racha ocorreu no último final de semana, quando o Tribunal Militar atendeu os pedidos da PM para a realização de mandados de busca e apreensão contra 18 policiais e um segurança suspeitos dos crimes.
Essa iniciativa da PM irritou membros da força-tarefa, formada também por Polícia Civil e Ministério Público.
"Houve uma quebra daquilo que foi acordado. Investigação é técnica, demanda ações minuciosas. Ela não é feita no atropelo. Essa afoiteza da PM certamente comprometeu o trabalho que havia sido feito e interrompeu uma linha de investigação", afirmou a delegada à Folha.
Ela preside a ADPESP (Associação dos Delegados de Polícia de SP), a maior da América Latina, que representa no Estado mais de 4.000 filiados.
Nos últimos dias, o racha na apuração da chacina também chegou ao Poder Judiciário, que se dividiu em relação à competência da investigação –se ela ficaria a cargo da Justiça comum ou da militar.
Ao analisar o pedido de prisão preventiva do único PM detido até o momento por suposta participação na chacina, o Ministério Público se manifestou pelo envio dos autos à Justiça comum "por se tratar de crimes dolosos contra a vida de civis". Mas um juiz do Tribunal Militar foi contra o envio, mantendo a análise do caso na jurisdição militar.
A animosidade revelou ainda a fragilidade das provas até aqui. A maioria dos PMs alvos dos mandados foi colocada sob suspeita por fatos anteriores à chacina.
Um exemplo da confusa investigação ocorreu na quarta (26): a juíza Elia Kinosita, da 1ª Vara do Júri de Osasco, negou pedido de prisão formulado pela Polícia Civil para o soldado da Rota Fabrício Eleutério. Entretanto o mesmo pleito, feito pela PM e referente ao mesmo policial, acabou acatado pela Justiça Militar.
Os objetos apreendidos nas casas de 18 PMs e de um segurança particular ainda estão em análise –como armas, tocas, pendrives e até documentos de foragidos da Justiça.
"A investigação pré-processual é de competência de nosso tribunal", afirmou à Folha Paulo Adib Casseb, presidente do Tribunal de Justiça Militar. "São focos diferentes, nós prezamos pelo respeito à ordem e à disciplina. A Justiça comum, pela liberdade."
Em nota, o governo paulista informou que "não há qualquer disputa, mas uma cooperação mútua para prender criminosos".